Arquivo de Entrevistas - Página 9 de 14 - Fair Play

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Xavier OliveiraAbril 1, 201819min0

Nuno Miguel Santos, multi-campeão nacional e referência do snooker em Portugal. Miguel Sancho, também figura de referência do bilhar em Portugal. Têm em comum o facto de serem as vozes do snooker no Eurosport. Não perca por isso a primeira parte da entrevista do Fair Play, feita durante o Players Championship, onde ambos os comentadores falam sobre o passado, o presente e o futuro do snooker nacional e internacional.

Desde quando surgiu este gosto pelo snooker? E como correu o primeiro contacto com uma mesa de snooker?

Nuno Miguel Santos: Em termos de conhecimento ou de contacto com a modalidade, jogo desde os 10 anos de idade, neste caso primeiramente na vertente de Pool Português e só depois no Pool. E até 2001, altura em que entrei para o Eurosport, sabia que existia snooker, mas não tinha grande contacto com a modalidade, mesmo porque praticamente não havia mesas em Portugal em número suficiente para que criasse esse bichinho e empatia. A partir do momento em que começo a comentar, a paixão cresceu exponencialmente, muito por culpa dos intervenientes, os jogadores, que nos fazem sonhar e nos fazem desejar estar ali naquele lugar. Ou seja, para quem vê, aprecia, para quem joga, gostaria de estar ali. O snooker é um caso especial dentro do bilhar, porque enquanto que por exemplo no Pool, conseguimos crescer ao nosso próprio ritmo, a aprender com a modalidade, no snooker acaba por não ser bem assim, já que chegamos a uma certa altura em que para dar o salto, é necessário que alguém nos ensine. Quem vê e não sabe muito bem do que se trata a modalidade, acha tudo aquilo muito normal, para quem vê e sabe do que se trata, acha tudo aquilo fenomenal. Aquilo que mais acaba por me impressionar nos jogadores profissionais, é que a tacada neles é sempre igual, só mudam mesmo a intensidade, o gesto técnico do punho acaba por ser sempre rigorosamente igual. Ainda neste Players Championship, que está decorrer, fiquei impressionado com uma tacada do Ding Junhui, do Mark Selby e do Ronnie O’Sullivan. A qualidade e a capacidade de se reinventarem torneio após torneio, é o que mais me apaixona pelo snooker. Relativamente ao primeiro contacto com uma mesa de snooker, foi em dezembro de 2004, num encontro de exibição frente ao Paul Hunter, em São João da Madeira. Já em competição, esse primeiro contacto foi no ano de 2010, na segunda edição do campeonato nacional, onde fiz o circuito de open’s e jogo a fase final.

Miguel Sancho: O primeiro contacto da modalidade aconteceu muito cedo, foi na localidade da Lousa, concelho de Loures, mais conhecida pelo ciclismo, mas onde existe uma grande coletividade chamada Grupo Desportivo da Lousa, onde mais tarde tive a oportunidade de jogar e, onde havia uma mesa de Pool Português e uma mesa de Carambola. Para além daí, também em Monte do Trigo, no Alentejo, onde também havia uma mesa de Carambola e onde comecei a dar as primeiras tacadas. Relativamente ao snooker propriamente dito, o primeiro contacto não foi com a modalidade em si, mas sim com o jogo de computador do Steve Davis e para quem tem sensivelmente a minha idade, lembra-se perfeitamente do ZX Spectrum, para o qual existiam vários jogos e, um deles era exactamente esse de snooker do Steve Davis. Em Lousa, houve uma história muito engraçada, já que nós na altura praticamente não tinhamos contacto com o snooker, o sinal não chegava cá e mesmo parabólicas praticamente ninguém tinha. Então na altura, houve uma pessoa da terra que tinha ido a Inglaterra e tinha trazido um poster do Steve Davis, salvo erro, campeão do mundo em 1984. Sendo que nós em Lousa tinhamos uma brincadeira de miúdos todos os sábados, em que quem vencesse tinha direito a ficar com o referido poster do Steve Davis durante uma semana e, então quando o consegui ter pela primeira vez, foi uma grande alegria para mim. E para mim até hoje, o momento mais alto do snooker foi quando tive precisamente a honra de conhecer Sir Steve Davis pessoalmente. O primeiro contacto mais a sério com o snooker, deu-se em 2010, quando na altura fazia parte da Federação Portuguesa de Bilhar, como vice-presidente, sendo que entretanto já tinha começado a fazer comentários no Eurosport. Aliás o meu grande salto de envolvimento com o snooker deu-se com a minha entrada no Eurosport como comentador, onde coincidiu tudo, com a entrada do Eurosport 2 em Portugal, e com isso haver muito mais snooker a ser transmitido e, também por nessa altura ter-se começado a jogar snooker em competição cá em Portugal. No fundo, eu gosto de todas as variantes do bilhar, gosto muito de Pool, que é a minha modalidade, adoro Carambola, modalidade a qual já tive oportunidade de comentar no Porto Canal. No caso do snooker, é um caso especial, já que acaba por ser a “Fórmula 1” do bilhar, como eu costumo dizer, é quando nós temos tudo ao mais alto nível, desde a organização das provas, o profissionalismo dos árbitros e dos jogadores, tudo o que envolve a modalidade.

Tanto o Miguel como o Nuno, já são comentadores de snooker no Eurosport há alguns anos. Quais são as grandes diferenças técnicas e tácticas que notam na modalidade desde o início dos comentários até agora?

NMS: Na minha opinião, há três grandes contributos para a modalidade e até em três décadas diferentes. Primeiro, Steve Davis, que contribuiu muito para que quem viesse a seguir fosse melhor. Stephen Hendry, talvez aquele que tenha contribuído mais, nomeadamente com o seu jogo para os buracos do meio, com a abertura de bolas vermelhas e, tudo isso contribuiu bastante para que na década seguinte, no novo milénio, aparecesse Ronnie O’Sullivan. É um jogador com um talento nato, isso é inegável, mas hoje em dia, acima de tudo a construção do ‘break’, e consequentemente o controlo da bola branca, acaba por ser aquilo que faz com que existam mais centenárias que nunca e, chegados aqui, certamente que daqui a 10-15 anos estaremos ainda melhores. Vimos por exemplo, nestes últimos 10 anos a World Snooker ser praticamente obrigada a retirar o ‘prize-money’ de 147.000 libras para a tacada máxima, já que isso de fazer um 147 é quase corriqueiro, sendo esse o ponto mais alto no snooker. Se compararmos para o início dos meus comentários cá no Eurosport, em 2001, um 147 acontecia uma ou duas vezes anualmente. Para se ter uma ideia, em 2013 ou 2014, Mark Selby fez a centésima tacada máxima de toda a história do snooker. No que toca à organização dos torneios por parte da World Snooker, penso que deveria haver uma diferenciação, tal como se faz com o ténis por exemplo. Uma das grandes revoluções feitas pelas mãos do Barry Hearn foi a criação dos ‘rankings’ dinâmicos, já que antigamente quem terminava a temporada no top-16 ia beneficiar desse facto para toda a época seguinte, já que a presença nesses torneios estava automaticamente garantida, algo que agora não se sucede, já que atualmente é necessário esses jogadores estarem bem pelo menos grande parte da época. O facto de agora, mais do que nunca, os jogadores estarem constantemente em competição é um fator crucial. Um exemplo disso, é que antigamente, depois do mundial, os jogadores tornavam a jogar apenas em Setembro, havia ali um ‘delay’ de três meses sem competição. Falando também um pouco sobre quem brilhou no passado, acho que a World Snooker esteve muito bem ao alargar o circuito profissional de 128 para 131 jogadores, ao oferecer um wild-card ao Jimmy White, ao Ken Doherty e ao James Wattana, já que mesmo parecendo que não, foram grandes embaixadores da modalidade.

MS: Para mim aquilo que eu noto mais diferença, e isso pensando desde que comecei a comentar, em 2009, é a qualidade dos jogadores médios. Ou seja, os jogadores de top continuam a ser aquilo que eram, não mudou muita coisa, claro que sempre com algumas oscilações. O jogador médio, que está na 50ª, 60ª posição, há dez anos atrás, num encontro frente a alguém do top-16, num encontro jogado no mínimo à melhor de 9 ‘frames’, esse jogador de topo quase de certeza ganharia o encontro. E aí a existência de um maior número de torneios no circuito, como os PTC’s por exemplo, foi crucial. Primeiramente porque permitiu levar o snooker para outras paragens, nomeadamente para Europa continental, algo que não acontecia antes, já que os torneios só se jogavam nas ilhas britânicas. E com isso, já tivemos provas em Portugal, em Gibraltar, na Holanda, na Bélgica, na Letónia, na Roménia, na Alemanha consolidou-se aquilo que já existia, na Polónia e com isso a presença de jogadores europeus no circuito profissional. Há um jogador belga no top-16, um suíço de ascendência portuguesa que chegou às meias-finais de um torneio esta época, já há um jogador alemão como profissional, sendo que o segundo se vai estrear na próxima temporada. Os campeonatos europeus são um bom exemplo disso mesmo, enquanto que antes se viam praticamente só jogadores britânicos por lá, agora vêem-se jogadores de inúmeros nacionalidades, como polacos, que estão com uma bela escola de snooker. E aí claro que a World Snooker foi inteligente, já que percebeu que havia esse mercado da Europa continental para explorar. Fez por exemplo uma parceria com o Eurosport, onde foi assinado um contrato de exclusividade com a duração de dez anos e, isso claro que tem a ver com o enorme impacto que o Eurosport tem não só na Europa continental, mas sim por todo mundo.

Miguel Sancho (à esquerda) e Nuno Miguel Santos (à direita) (Fonte: Vasco Simões/Eurosport)
Quais são para cada um de vocês as três grandes referências de sempre do snooker, e porquê?

NMS: Sendo um pouco pragmático, quando eu me refiro aos melhores, falo na contribuição que eles deram para que a modalidade seja aquilo que é hoje e isso é o mais importante. A forma como se irá jogar no futuro tem claramente a pegada de Ronnie O’Sullivan, a forma de atacar a bola, fazer com que a bola “ganhe vida”, isso é o legado que ele vai deixar até aparecer alguém que vai conseguir mudar o snooker para ainda melhor. Por isso é que digo que os três grandes marcos do snooker são Steve Davis, Stephen Hendry e Ronnie O’Sullivan. Se olharmos por exemplo para Alex Higgins, ao nível da técnica ele era péssimo, enquanto que qualquer um dos três que destaquei tem uma técnica a roçar a perfeição.

MS: É quase impossível fugir às três referências feitas pelo Nuno, anteriormente. Ainda assim, há um que pouca gente fala, porque praticamente ninguém o viu jogar, só mesmo em imagens, que é o grande campeão Joe Davis, tendo este senhor sido campeão do mundo 15 vezes consecutivas e, se hoje há snooker é muito graças a ele. Há depois duas linhas, a linha dos campeões e dos campeões do povo e, eu gosto das duas. Os primeiros onde se incluem Joe Davis, Steve Davis, Stephen Hendry, John Higgins e Mark Selby. E depois a outra linha que é começada por Alex Higgins, que foi uma “barbaridade” de jogador e, é continuada por Jimmy White, Ronnie O’Sullivan e agora nesta altura, talvez Judd Trump. Estamos a falar das duas faces da moeda, que é os que ganham e os que dão a ganhar ao jogo pelo espetáculo. E nesse aspeto tenho que destacar Ronnie O’Sullivan, que é o único que consegue juntar essas duas faces. Como pessoa eu identifico-me mais com Steve Davis, mas tenho que admitir que faltava alguma espetacularidade ao jogo do inglês. Toda gente gosta muito do Jimmy White, mas a verdade é que o inglês em seis finais de mundiais não venceu nenhuma e acaba a carreira com 10 ‘majors’. Toda a gente dizia que era impossível vencer jogos e dar espetáculo e Ronnie O’Sullivan veio provar a todos precisamente o contrário. Pegando um pouco naquilo que era o snooker no tempo de Joe Davis e fazendo uma comparação com Portugal, nós estamos naquela fase, ou pelo menos estávamos quando se começou a jogar por cá, em que se marca uma bola vermelha, seguido de bola de cor e caso haja uma má colocação da bola branca, defende-se. O Joe Davis quando começou a jogar era precisamente assim, ele foi o primeiro a tentar e a conseguir um ‘break’ vencedor. Depois vem o Steve Davis que faz isso com uma entrada centenária, seguido do Hendry que faz um 147, terminando com o O’Sullivan que faz uma entrada máxima em cinco minutos e vinte segundos.

Cada vez mais, é normal vermos jogadores veteranos a vencer ‘majors’, isso deve-se ao facto de terem uma maior experiência? Tal como outras modalidades individuais, o snooker é algo como 80% psicológico e 20% técnico?

MS: Isso é verdade, mas eu lembro-me na altura que entrei tive uma conversa sobre isso com o Nuno, em que se discutia muito qual era o período áureo de um jogador e, na altura defendia-se que esse período se situava entre os 35 e os 40 anos, e agora vemos esta geração a implodir isso mesmo. O Ronnie está a fazer a melhor época de sempre, o Mark Williams há muito tempo que não o víamos jogar tão bem, vemos inúmeros jogadores estrearem-se a ganhar provas depois dos 40 anos. Obviamente que o snooker não é uma modalidade que tem as exigências físicas de outras. Apesar disso vemos jogadores com algumas queixas físicas, como por exemplo o caso de Shaun Murphy, que tem tido problemas de coluna, o Mark Selby com problemas de pescoço, sendo tudo isso o suficiente para não ganhar, mas caso os jogadores tenham alguns cuidados físicos têm tudo para singrar com mais facilidade. O tempo de jogadores como o Stephen Lee acabou, tenho muitas dificuldades em acreditar que o Mark Allen algum dia possa ganhar um mundial. Vemos o caso do O’Sullivan que faz jogging todos os dias de manhã, o Neil Robertson é outro jogador que tem muito cuidado com a sua alimentação, sendo que todo este cuidado com o físico tem um peso enorme no Campeonato do Mundo, onde são 17 dias intensos e onde a componente física é um factor muito importante, estando sempre o cansaço físico ligado ao cansaço mental. Acredito que esta geração atual vai bater todos os records existentes e que o Ronnie O’Sullivan e o John Higgins vão jogar pelo menos até aos 50 anos, ou talvez mais, a conseguir ganhar provas.

NMS: Não é um desporto físico, como sabemos, mas é fundamental estar em boa forma. Apesar de a componente física não ser o mais importante, acaba muitas vezes por ser crucial, nomeadamente quando estamos a falar de extensões longas, e o mundial é a prova viva disso mesmo. E não é por acaso que se tem sentido que quem chega lá mais fresco tem sido Mark Selby, sendo de realçar o físico dele, a elegância dele, até o próprio “esticar” na mesa. Se tivermos com um peso acima do ideal é um sacrifício, estando assim a perder o foco naquilo que é o mais importante, perdendo concentração e mais energia que o normal. Não diria tanto como foi dito na pergunta, a percentagem 80/20, mas com certeza 70/30 será um valor aproximado da realidade e que demonstra que os jogadores têm necessariamente de estar bem psicologicamente.

Da esquerda para direita: Xavier Oliveira (Fair Play), Nuno Miguel Santos, Miguel Sancho (Fonte: Vasco Simões/Eurosport)
A nível nacional, o snooker está em expansão, também muito se devendo ao bom trabalho feito no Eurosport. Pegando um pouco nas palavras do Ronaldo (Gala Quinas de Ouro 2018), e “pensando em grande” como o próprio dizia, para quando um jogador luso no circuito profissional?

MS: Obviamente não existe resposta imediata para essa pergunta, já que está dependente de muitos fatores. Eu acho que o snooker em Portugal tem algumas dificuldades, que não é fácil sair delas e, falando agora como responsável de um dos espaços onde se joga snooker em Portugal, o Snooker Club Lisboa, em que me deparo diariamente com situações como o valor das mesas, a rentabilidade dessas mesmas mesas, já que essas mesmas ocupam cerca de 35 metros quadrados e, o que o gerente de um espaço onde se joga bilhar pensa nesse caso é quantas mesas de consumo poderia ter nessa mesma área. Nós temos actualmente em Portugal, dispomos de cerca de 30 mesas em espaços públicos de norte a sul do país e na ilha da Madeira. Além disso, o snooker não é uma modalidade que se aprende sozinho, mesmo usando tutoriais e vídeos existentes na Internet, sendo que isso por si só não chega, é necessário acompanhamento por parte de um treinador. E pegando em palavras ditas pelo próprio Ronaldo, nessa mesma gala, não quero estar a menorizar Portugal, sendo os problemas comuns a diversos outros países, como por exemplo, França, Espanha ou Itália. Ou seja, não tem propriamente a ver com Portugal, mas sim com Europa continental vs Reino Unido e aí algumas questões relacionadas com a própria World Snooker. É verdade que é vontade da World Snooker crescer a modalidade para Europa continental, mas continuam a realizar-se todos os apuramentos (Q School) somente na Inglaterra e portanto isto tem de mudar. Aquilo que a World Snooker tem obrigatoriamente de fazer, se quer ter jogadores de outros países no circuito, é disponibilizar técnicos próprios a irem aos outros países formarem técnicos locais, sem isso ter custos, ou com custos muito reduzidos para as respectivas federações. Aquilo que temos hoje em dia é algo muito bom, e digo isto com orgulho, porque tanto eu como o Nuno, lutamos muito para que isso acontecesse, já que temos jovens com alguma qualidade, como o caso do Diogo Badalo, que já foi campeão nacional, o caso do Tiago Teixeira, que tem umas condições fenomenais para vir a ser um bom jogador, não sei qual o patamar porque há diversos fatores que fazem com que um jogador possa ou não vir a tornar-se um grande jogador. Há inúmeros casos desses e não só em Portugal. Cá, em termos de formação só existem alguns raros episódios, sendo que talvez o melhor exemplo seja mesmo a Escola de Bilhar do FC Porto mas não de snooker, porque formação em snooker existe apenas uma pessoa, chamada Nelson Batista. Para dar aulas é preciso aprender a saber ensinar e essa é a parte mais difícil. O Shaun Murphy, aquando da visita do mesmo ao Snooker Club Lisboa, dizia algo deste género: “Vocês não imaginam, só na cidade de Manchester devem existir mil ou mais jogadores a fazerem entradas centenárias umas atrás das outras, que nem sequer estão no ‘main tour’, estando apenas a competir nas provas internas. O grande problema deles está apenas na falta de estaleca mental”. E nós em Portugal ainda nem sequer chegamos a esse nível, de termos um jogador que possamos dizer que se tivesse “cabeça” era profissional. O caso da Free Ball foi um projecto muito importante para a zona norte, obviamente que é importante que os clubes como o FC Porto, o Leixões, o Boavista também entrem na modalidade. Sobre este assunto, há uma história engraçada que aconteceu connosco há dois anos no Casino Estoril, que foi o Estoril Snooker Challenge, como aliás é hábito todos anos no lançamento do mundial por parte do Eurosport. Nesse ano havia um senhor que trabalhava naquele espaço, como porteiro no caso, e ao que à certa altura se dirige a nós e diz: “Não consigo perceber tanta dificuldade da vossa parte em embolsar bolas”, ao que eu lhe coloquei a bola amarela no sítio dela e a bola branca em posição para ver quantas vezes ele marcava a amarela no meio. Obviamente que não marcou nenhuma, tendo inclusive desistido à sétima ou oitava tentativa, chegando facilmente à conclusão de que “afinal isto é mais difícil do que parece”.

NMS: Em termos de formação nem todos são “Mourinhos”, é que para além de estudar a táctica, é necessário ensinar a técnica, sendo muito difícil ensinar essa técnica, quando esse formador não tem essa mesma técnica. Enquanto não existir alguém que reúna todas estas condicionantes para ensinar os jogadores portugueses não vai ser fácil termos um jogador luso no circuito profissional. Hierarquicamente, em termos temporais, já tivemos João Esteves da Silva, o Luís Alves, o Diogo Badalo e o Tiago Teixeira, sendo talvez os quatro grandes nomes de jogadores mais jovens, em que qualquer um destes sente exactamente esta carência que eu referi. Eu diria que a correr bem, e sem contar com aqueles jogadores que estão agora a “saltar para a ribalta” dentro da modalidade, nunca abaixo dos próximos dez anos teremos um jogador português como profissional. Se bem que ao dizer uma década, já estou de certa forma a ser algo simpático, sendo certo que os jogadores como o Diogo Badalo e o Tiago Teixeira podem abrir portas para as gerações futuras. Primeiro é necessário haver formadores com essa abrangência territorial e segundo é preciso que os clubes o queiram também.

O Fair Play agradece ao Nuno Miguel Santos, Miguel Sancho, bem como toda equipa do Eurosport, pela disponibilidade e simpatia demonstrada em todo o processo da entrevista. Desejando as maiores felicidades e o maior sucesso a ambos, quer como atletas, quer como comentadores e ao canal Eurosport.

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Ricardo LestreMarço 18, 201816min0

Luís Viegas é outro português, profissional no mundo do futebol, que brilha além fronteiras e num país bem peculiar. Em 2014 mudou-se de malas e bagagens para a Tailândia, depois de uma experiência no Beira Mar, para assumir as funções de analista e chefe de departamento de scouting do True Bangkok United, equipa até então treinada por Rui Bento. E de lá nunca mais saiu. Em entrevista exclusiva ao Fair Play, Luís Viegas falou sobre a capital tailandesa, o futebol do país, a realidade do seu clube e o papel do analista nos dias de hoje.

Luís, antes de mais, gostaria de te agradecer em meu nome e do Fair Play por teres aceitado o convite para a realização desta entrevista. Fala-nos um pouco do teu passado e de como ingressaste na vertente de analista e scout. O futebol sempre foi uma paixão?

LV. Para mim é um privilégio ter espaço neste vosso projecto que aprecio bastante pela abordagem diferenciada que faz sobre esta modalidade que é uma paixão que nos une. Desde pequeno que gostei de ler e de ter o máximo de informação sobre o jogo e os jogadores, algo que hoje é tão facilitado pela internet, mas que antes só se encontrava em jornais ou revistas como os Cadernos d’A Bola. A ligação desenvolveu-se como jogador, aos 12 anos, nas camadas jovens do Santacombadense, que foi o meu primeiro clube. Estive depois quatro temporadas ligado à Académica, duas como juvenil e duas como júnior. Esse período foi marcante, pelo que clube que é e pelas pessoas com quem me cruzei, tendo de destacar o José Viterbo, que foi o meu treinador nos juniores. Aliás, o actual presidente da Académica, Pedro Roxo, foi meu colega nesse período. Já como sénior fiz apenas alguns meses, em épocas diferentes, no Tabuense, no distrital de Coimbra. Tinha entrado no Ensino Superior, em Comunicação Social, e logo no início do curso comecei a trabalhar como jornalista, precisamente no jornal da Académica, que então era dirigido por Fernando Pompeu, outra das referências com quem tive a privilégio de me cruzar. Foi aí o início de um percurso de cerca de dez anos. Colaborei com os dois jornais da cidade, mas o meu trajecto foi sobretudo no jornal O Jogo, primeiro como correspondente em Coimbra e depois na redacção de Lisboa. Acompanhava a Selecção Nacional e, entre outros momentos e eventos marcantes, estive no Mundial da África do Sul, com o Manuel Casaca. Esse período foi fundamental para a minha carreira, primeiro porque me proporcionou o contacto com dirigentes, treinadores e jogadores de alto nível, dando-me também uma excelente network, e depois porque o que fiz durante esses anos foi observar, analisar e explicar o jogo, que é exactamente o que faço hoje.

Em 2011 fui então trabalhar para a recém-criada SAD do Beira-Mar, onde estive durante quase dois anos e meio, até Novembro de 2013, tendo desempenhado diferentes funções, começando até mais na área da comunicação e terminando como team manager, passando pela edição de vídeo e ligação da equipa técnica com a Administração. Foi uma experiência marcante, num clube especial, onde trabalhei com pessoas que muito me ensinaram. Destaco três: o Rui Bento e o Costinha, como treinadores, e o Hugo Vieira, que foi e é um exemplo de rigor e profissionalismo.

Até que em 2014 surgiu um destino… pouco provável: Tailândia. Como surgiu o convite e a oportunidade de rumares a um país tão… exótico?

LV. A oportunidade surgiu precisamente através do Rui Bento. Apesar de ele ter saído do Beira-Mar em 2012, mantivemos sempre uma relação próxima e ele convidou-me para o acompanhar quando assumiu o Bangkok United, em Janeiro de 2014. O Rui Bento acabou por ficar aqui pouco tempo, mas eu continuei, estando desde Junho desse mesmo ano a trabalhar com o Mano Pölking.

Dadas as tuas funções dentro da equipa técnica, como analista e chefe de scouting, qual foi a primeira impressão das condições de trabalho oferecidas pelo agora denominado True Bangkok United? Cumpriram com as expetativas?

LV. Vim para aqui numa altura em que o Bangkok United procurava crescer, profissionalizar-se e aproximar-se das condições e da forma de trabalhar dos clubes europeus. Ou seja, aquilo que me impressionou foi sobretudo a disponibilidade para investir e acompanhar o que de melhor se faz no futebol. As condições de trabalho têm vindo a melhorar de ano para ano. Só nos falta ter um estádio próprio, um projecto por enquanto em stand-by. Mas por exemplo a nível de software e tecnologia temos à disposição praticamente o mesmo que os clubes de topo na Europa.

Atualmente, quantos e quem são os membros que fazem parte da equipa técnica do Bangkok United?

LV. A equipa técnica tem neste momento 11 pessoas, entre responsáveis por departamento e assistentes locais. A comunidade lusófona é constituída pelo Mano Pölking, o preparador-físico, Paulo Alexandre Oliveira, também brasileiro, e dois portugueses: eu e o Pedro Ramos, que estava no Cova da Piedade e que veio este ano trabalhar comigo.

(Foto: Arquivo pessoal)
Com dois cargos de extrema importância, o teu dia-a-dia deve ser bem atarefado…

LV. É sobretudo um dia-a-dia desafiante e motivante. Na parte do scouting, procuramos ter actualizada uma base de dados com jogadores locais e estrangeiros para estarmos preparados para as necessidades de cada janela de mercado. A análise é, naturalmente, a actividade que nos toma mais tempo. O Mano dá muita importância à análise, seja da própria equipa ou do adversário. Claro que da forma como trabalhamos, procurando ter e passar o máximo de informação, a principal limitação até é em termos de recursos humanos, mas temos um calendário e um workflow bem definidos.

Na Tailândia, existe cultura desportiva? Tem o jogador tailandês alguns princípios enraizados ou a situação é semelhante, por exemplo, à do futebol chinês?

LV. O povo tailandês adora futebol e aqui a prática é muito mais comum do que na China. Tecnicamente, aliás, os jogadores tailandeses têm uma qualidade bastante interessante. Foi algo que me surpreendeu. O problema, ou aquilo que os impede de competir a um nível mais alto, é a parte física, mas sobretudo a táctica, devido à falta de formação de base. E depois existem outros aspectos sócio-culturais, como a alimentação, que acabam por ter influência. Mas a modalidade tem crescido muito e a liga também. A tendência é essa, até porque a liga só é profissional há menos de dez anos.

Os obstáculos devem ser imensos assim que é necessário transmitir uma ideia de jogo, explicar uma estratégia e retificar comportamentos a toda a equipa.

LV. Não é assim tão complicado. Um dos adjuntos locais também se encarrega da tradução e depois, além de três brasileiros e um argentino, temos vários jogadores com dupla nacionalidade que se expressam bem em inglês. O que eu diria que por vezes é complicado é corrigir erros que normalmente são corrigidos quando os jogadores têm 11 ou 12 anos. É essa falta de base que, nalguns casos, dificulta a tarefa. Mas no geral, seja a ideia de jogo ou a estratégia, a comunicação é relativamente fácil, sempre com o apoio do vídeo, que é uma arma poderosa. Fundamental é saber lidar com a cultura, uma cultura em que o factor competitividade não está tão vincado. Por exemplo, fazes um 5 contra 5 em Portugal e eles até se “matam”. Aqui não é assim. É preciso saber levá-los, saber estimulá-los. Mas também nisso o Mano é exímio.

Conta-nos um pouco do estilo de jogo implementado pelo mister Mano Pölking.

LV. É um estilo de jogo baseado na posse de bola, no passe, na criatividade, na pressão alta… Toda a gente estará de acordo com a ideia de que ter a bola é a forma mais fácil de controlar o jogo. Obviamente que depois depende de se ter ou não jogadores com capacidade para colocar em prática essa ideia. Porque no fundo é a qualidade deles que faz a diferença. Aí entra em acção a parte estratégica, o olhar para o adversário, para as condicionantes. Mas aqui temos tido plantéis construídos precisamente de acordo com essa ideia. E os números falam por si: na época passada tivemos o melhor ataque do campeonato. Creio, ainda assim, que temos vindo a conseguir melhorar nalguns aspectos, como por exemplo nos ataques rápidos. Depois, procuramos trabalhar e desenvolver a parte defensiva, sobretudo a transição, que será sempre o handicap de quem privilegia a posse de bola, de modo a termos uma equipa equilibrada. E creio que temos. Aliás, são os próprios adversários, como o Bruno Moreira ou o Yannick Djaló, só para citar os conhecidos do público português, a elogiar o nosso futebol. Não me esqueço daquilo que o Bruno Moreira me disse no final de um jogo: “Parabéns! É difícil jogar assim em qualquer lado, mas ainda mais aqui na Tailândia.” E isto vindo de alguém que tinha acabado de trabalhar com o Paulo Fonseca…

(Foto: Arquivo pessoal)
Existe mais vida para além dos clubes grandes como o Buriram Utd e o Muangthong na Thai Premier League? De que forma se consegue contrariar o poderio desses dois conjuntos? O campeonato é competitivo no geral?

LV. É uma missão realmente difícil, porque esses dois clubes investem mais, têm mais adeptos e têm condições de trabalho que nós ainda não temos. Há dois anos ficámos em segundo, no ano passado em terceiro e este ano vamos tentar andar lá em cima. Este campeonato pode vir a ser mais competitivo do que os anteriores, uma vez que o Muangthong perdeu três jogadores tailandeses de grande qualidade (dois foram para o Japão e um para a Bélgica). A nossa vantagem, ou aquilo que nos permite contrariar o poderio desses clubes, é a organização que o nosso clube tem, com um presidente e uma manager exemplares, e sobretudo a aposta na continuidade, num trabalho sustentado. Numa liga em que são frequentes as trocas de treinador, o Mano já está há quatro anos no clube, o que é um recorde de permanência, e o resultados estão à vista.

Tem a Thai Premier League capacidade para ombrear com as restantes no contingente asiático? Achas que a disparidade se reflete acima de tudo nas competições continentais?

LV. Falando, por exemplo, da capacidade de investimento, aqui já há quem pague mais do que a maioria dos clubes da Coreia do Sul ou do Japão. Na Ásia, aliás, só a China está num patamar claramente inatingível. Já em relação ao nível do campeonato tem vindo a subir gradualmente e os representantes da Tailândia na fase de grupos da Liga dos Campeões têm tido participações que se podem considerar positivas, mas claro que países como a Coreia do Sul ou o Japão tem mais tradição e sobretudo mais jogadores locais de qualidade.

Dentro de alguns anos, o True Bangkok United pode lutar por um lugar na Liga dos Campeões Asiáticos? A estrutura atual tem condições para tal?

LV. No ano passado disputámos a eliminatória preliminar de acesso ao play-off, mas perdemos nos pénaltis contra o Johor, campeão da Malásia. O actual formato da competição é difícil para as equipas tailandesas: só o campeão tem lugar garantido na fase de grupos, enquanto o segundo e o terceiro têm de ganhar um play-off, a apenas uma mão, em casa do adversário, normalmente equipas do Japão, da Coreia do Sul ou da China. Mas sem dúvida que esse é um dos nossos objectivos, até pelos planos de internacionalização do clube, que pertence à maior empresa da Tailândia, e neste momento contamos com uma estrutura que nos dá as condições necessárias.

(Foto: Arquivo pessoal)
Nos dias de hoje, consideras que o futebol asiático, sendo um diamante ainda por lapidar, está a ser mal explorado por muitos profissionais sobretudo na Europa?

LV. O futebol asiático pode ser visto de vários ângulos. Do ponto de vista do marketing, acho que é evidente a importância que tem e a forma como é muito bem explorado por ligas como a inglesa ou o interesse que os japoneses da Bundesliga despertam no seu país. O povo asiático adora futebol e tem a cultura do ídolo. Já quanto à parte desportiva, do aproveitamento de jogadores, sem dúvida que há muito por explorar e por outro lado acredito que a qualidade individual vai crescer naturalmente com o facto de haver cada vez mais treinadores estrangeiros e mais trabalho na formação. Agora, depende sempre do que se procura e do projecto que se tem, em que contexto se pretende inserir o jogador e até onde há disponibilidade para o enquadrar numa cultura diferente. E, claro, a Ásia é um continente muito grande e um jogador tailandês é diferente de um japonês ou de um sul-coreano. A capacidade de adaptação e de assimilação são diferentes. Por exemplo, trabalhei com o Zhang Chengdong no Beira-Mar e dificilmente irei encontrar um jogador que conheça tão bem o jogo como ele.

Por outro lado, achas que agora mais do que nunca o papel do analista e do próprio scout no mundo do futebol tem evoluído de forma gradual?

LV. Absolutamente. O nosso objectivo diário passa, antes de mais, por ajudar o treinador a tomar decisões. E depois completa-se com a participação no processo de desenvolvimento individual e colectivo da equipa. Creio que hoje em dia já ninguém duvida da importância do analista e isso tem sido deixado claro pelos principais treinadores mundiais. O mesmo se passa em relação à figura do scout. Um clube com um departamento de scouting bem estruturado é um clube melhor preparado para o presente e para o futuro. Numa actividade que gere e envolve tanto investimento, é fundamental ter o máximo de conhecimento, de informação e de critério possíveis no processo de scouting.

Estando já há quatro anos a viver na capital da Tailândia, cuja realidade é bem diferente da do nosso país, certamente que as situações caricatas que viveste são imensas. Fala-nos sobre algumas delas.

LV. No dia-a-dia as situações mais caricatas ou inusitadas resultam sobretudo da forma como o povo tailandês vive a vida: relaxados, tranquilos, considerando que se as regras existem são para quebrar, mas acolhedores e atenciosos. Bangkok é uma cidade multicultural que não pára, não dorme, uma cidade de contrastes. E a Tailândia é sem dúvida um país que vale a pena visitar. Não só pelas praias, que são paradisíacas, mas também pela história e também até pelo contacto com a religião budista, que tem vários ideais que nos fazem pensar.

Estando do outro lado do mundo, como tens acompanhado e qual a tua opinião sobre o futebol português e os seus imbróglios bem característicos?

LV. O futebol português tem pessoas muito conhecedoras, sobretudo na Federação, e creio que de uma forma geral os clubes portugueses estão melhores, têm apostado em infra-estruturas e têm investido em estruturas mais competentes e capazes. Temos jogadores de alto nível e treinadores competentes, tanto em Portugal como espalhados pelo mundo. Trabalha-se bem na formação e a prova é que se continua a produzir jogadores de enorme talento, numa relação proporcional à população que nenhum outro país terá. Ainda noutro dia mostrámos à nossa equipa o golo do Rafael Leão no Dragão. Não é normal um jogador de 18 anos fazer uma diagonal de ruptura como aquela. O bom do futebol português tem a ver com o facto de o país estar profundamente ligado à modalidade. É cultural. Uma vez houve aqui uma pessoa que me perguntou se Portugal era em África. Mas essa mesma pessoa sabia que Portugal é o país do Mourinho e do Ronaldo. O futebol faz parte da vida do povo português e será sempre uma das suas principais bandeiras, se não mesmo a principal. Agora, claro que há demasiado ruído e pouca preocupação em divulgar o jogo e melhorar o conhecimento dos adeptos, algo que também é cultural. Se eu for agora à internet e abrir sites de países do Sul da Europa, vai falar-se mais de assuntos paralelos ao jogo do que do jogo em si. Mas se abrir um site inglês ou alemão isso provavelmente já não acontece.

(Foto: Arquivo pessoal)
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Xavier OliveiraMarço 3, 20188min2

Tiago Teixeira, jovem de apenas 16 anos, que defende actualmente as cores da Academia Free Ball. O Fair Play esteve à conversa com aquele que é, mais do que uma promessa, uma certeza da boa qualidade no futuro do snooker em Portugal. Não perca por isso mais uma entrevista do Fair Play, onde Tiago fala sobre o snooker nacional e internacional, as suas experiências internacionais e o seu próprio futuro. 

Ao contrário de muitos jovens da tua idade, optaste pelo snooker em detrimento do futebol. Desde quando existe esse “bichinho” pela modalidade e o porquê dessa opção?

TT. Eu gostava de ver jogos de futebol, mas não tinha muita qualidade e então não tinha aquele chamamento para jogar. Foi por isso que comecei a ver canais alternativos, tais como o Eurosport e, foi por aí ver snooker que nasceu a minha paixão pela modalidade. Experimentei, adorei e desde aí que ligo pouco ao futebol, estando sempre ligado ao snooker.

Esta época alinhas pela Academia Free Ball. Conta um pouco como se deu essa mudança e o convite da tua nova equipa.

TT. Estive duas épocas no FC Porto, onde a minha saída se deu por não ter gostado do tratamento que por lá recebi, neste caso por parte dos meus colegas de equipa e, foi aí que recebi uma excelente proposta da Free Ball, onde aí poderia estar com pessoas que conheço, com quem gosto de estar e, que acima de tudo, respeitam quem lá joga e a modalidade em si, tendo por isso aceitado a proposta deles.

Atendendo a que cada vez há mais pessoas atentas a jovens talentos como tu, sentes mais pressão quando vais jogar os open’s e as fases finais?

TT. Não querendo estar a colocar-me num patamar acima dos outros, mas talvez por ser jovem, o facto de eu jogar a um bom nível chama mais a atenção das pessoas. Mas independentemente de tudo, tento sempre fazer o meu melhor e jogo focado no meu jogo, sem estar a olhar para quem está do lado de fora. O facto de ter mais ou menos público, é algo que normalmente não me afecta muito.

Em entrevista ao Fair Play, no ano passado, os responsáveis da Academia Free Ball apontaram-te a ti e ao Luís Alves como atletas da elite nacional. Quão é importante é sentir este carinho por parte deles e que novas aprendizagens já retiraste de toda a experiência a jogar lá?

TT. É com enorme prazer que oiço essas palavras por parte da Free Ball, sendo que isso resume muito o espírito da academia. Nós somos praticamente como uma família, existe um excelente ambiente, gostamos muito uns dos outros. Eu e o Luís, juntamente com o Samuel, somos a principal equipa da Free Ball, tendo por isso a obrigação de ter um desempenho melhor que as outras equipas. Sinto que agora estou mais evoluído tecnicamente, não só pela mudança em si, mas também porque com o tempo a técnica vai crescendo por si só. As condições da academia são as melhores, com três excelentes mesas, aliado a um bom ambiente, o que ajuda nesse crescimento. Ao nível da pressão, o facto de estar a representar o FC Porto ou a Free Ball, acaba por ser um pouco indiferente, porque independentemente do clube que represente dou sempre o meu melhor.

Equipa Academia Free Ball – Samuel Pereira, Tiago Teixeira e Luís Alves (Fonte: Federação Portuguesa de Bilhar)
Caso te qualifiques, quais são os principais objectivos para a fase final, tanto a nível individual como por equipas?

TT. Em ambas as competições vou dar o meu melhor e, claro que gostaria de ser campeão nacional, mas se tal não acontecer não há qualquer problema. Mesmo sem ver o quadro final e, mesmo sendo um “tiro no escuro”, diria que um bom resultado seria chegar às meias-finais. Acima de tudo vou dar o meu máximo e tentar obter um resultado melhor que o ano passado, onde cheguei aos quartos-de-final.

Estiveste presente pela primeira num Europeu de Snooker em 2016, na Polónia e pela segunda vez este ano, na Bulgária. Quais foram as grandes diferenças que notaste no teu jogo a nível técnico da primeira para a segunda experiência?

TT. Na Polónia, em 2016, tinha apenas 14 anos, acabava por atacar todas as bolas que via, ao passo que agora na Bulgária foi tudo mais pensado, mais estudado e feito com mais calma. Por ter mais maturidade, tudo acabou por correr melhor na Bulgária, onde acabei até por ganhar um encontro em cada escalão (sub-18 e sub-21). No escalão sub-21 a qualificação escapou-me por pouco, onde no último encontro frente ao belga acabei por jogar melhor que o esperado, mas a falta maturidade e de experiência da minha parte acabou por ser fulcral. Mesmo tendo sido num curto espaço de tempo, sinto que a minha experiência cresceu do Europeu sub-18 para o Europeu sub-21, aprendendo acima com os meus erros e as minhas derrotas.

Tiveste como adversário na fase de grupos o alemão, Simon Lichtenberg, que veio a sagrar-se campeão europeu sub-21, ganhando por isso direito a jogar o circuito profissional nos próximos dois anos. Pensas que este alemão tem boas possibilidades de se manter por lá durante muito tempo?

TT. É certo que quem vence um Europeu sub-21 tem boas possibilidades de se manter no circuito durante muito tempo, o Simon joga a um grande nível, tem muita experiência e acima de tudo é muito humilde. Por isso penso que tem tudo para se bater de igual para igual com grande parte dos jogadores do circuito. Ao ver de perto o Europeu, fico com a ideia de que a maioria dos jogadores que chega aos oitavos-de-final e aos quartos-de-final têm todos um grande nível técnico, sendo que o acaba por decidir o campeão é muitas vezes o momento de forma naquele dia e a sua capacidade de lidar com a pressão.

Em termos de organização do Europeu, que elações achas que a Federação Portuguesa de Bilhar poderia retirar desse tipo de eventos, para aplicar nas fases finais?

TT. Especialmente a organização dos torneios em si. Do que por lá vi, a EBSA tenta solucionar os problemas da forma mais célere e eficaz para todos. Penso que a federação estando ligada a quatro variantes do bilhar (Pool, Pool Português, Carambola e Snooker), deveria interessar-se um pouco mais por esta última, criando por exemplo uma associação à parte só focada no snooker. A federação acaba por não ver o snooker como a “Fórmula 1” do bilhar como a maioria dos amantes da modalidade e, claro que o facto de ainda ser uma modalidade recente por cá, quando comparada com o Pool e o Pool Português por exemplo, acaba por não trazer um retorno financeiro tão grande e isso reflecte-se depois na forma como cada variante do bilhar é tratada.

Tiago Teixeira em acção na Bulgária (Fonte: Tiago Teixeira)
É público que és um fã incondicional do Judd Trump. Se pudesses ter uma conversa a sós com ele, que conselhos lhe darias? Concordas com a maioria dos amantes do snooker que diz que lhe falta muita maturidade?

TT. É evidente que o Judd Trump tem uma excelente técnica e por isso não estou em grande posição para lhe dar conselhos, mas dir-lhe-ia para ter mais maturidade e trabalhar mais psicologicamente, sendo para mim esses os principais aspectos que o inglês tem a melhorar.

Já não falta muito para o mundial arrancar, qual é a tua aposta para erguer o troféu de vencedor em Sheffield e porquê?

TT. Por uma questão emocional claro que gostaria que fosse o Judd Trump, mas de um ponto de vista mais racional e, pelo que já fez esta época, aposto em Ronnie O’Sullivan. Esta temporada em seis finais, venceu quatro, o que demonstra como ele tem estado “matador”. E também pela razão de que o “Rocket” nas competições maiores eleva sempre o seu nível, sendo que por isso a minha aposta recai sobre ele.

O Fair Play agradece ao Tiago Teixeira, pela disponibilidade e simpatia demonstrada em todo o processo da entrevista. Desejando as maiores felicidades e o maior sucesso a este jovem atleta e à sua respectiva equipa.


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