Hamilton na Ferrari: E agora?
Há poucos meses atrás, no mesmo espaço, assinava um texto de reflexão sobre a Fórmula 1 (F1) enquanto produto. Defendi que a modalidade sempre foi vista como uma mercadoria. Exemplifiquei com as parcerias publicitárias do século passado, bem como com os shows que antecedem as corridas na atualidade. Desde então, muito pouco mudou, pese embora tenhamos tido outro grande exemplo de produto, isto é, a futura transferência de Lewis Hamilton para a Ferrari. A vertente financeira é estratosférica. Como o dinheiro se multiplica, a Ferrari, já recuperou os euros que irá desembolsar a troca dos serviços de Hamilton. A valorização em bolsa no dia da oficialização da transferência do britânico, não só permitiu à marca recuperar o investimento, como também valorizar-se (no sentido material). Já a Mercedes, podendo não ter perdido dinheiro no imediato, perderá no futuro. Hamilton é muito mais do que um simples piloto. É um ativo financeiro.
Não pretendo materializar Lewis Hamilton, pelo contrário, constitui uma simbologia tão elevada no seio da F1 que apenas rumores representam movimentações financeiras de milhões. Posto isto, a ida de Lewis Hamilton para a Scuderia italiana merece ser analisada sob dois pontos de vista, sendo estes, o desportivo e o financeiro.
Financeiramente é ouro sobre azul para a Ferrari. Não querendo pecar por excesso, não só o aumento do valor das ações se mostra positivo para os italianos. Os programas de diversidade- importantes, impactantes e de valorizar para a sociedade- passam a ser executados em parceria. Assim, Hamilton atribuiu à Ferrari um cariz ainda mais rico em causas sociais, importante para uma marca que ocupa um lugar pioneiro no desporto motorizado. O merchandising do #44 atribuirá à Ferrari mais um mecanismo de marketing difícil de contrariar por parte da concorrência. Se o nome da marca criado por Enzo Ferrari já vende camisolas e bonés pelos quatro cantos do mundo -deu inclusive lugar a um filme estreado no passado mês- imagine-se o vermelho decorado com a capicua quatro.
Naturalmente, no plano desportivo, a rotura contratual entre Mercedes e Hamilton abre espaço para novas movimentações. Sem Hamilton a Mercedes deverá apostar as fichas em George Russell. O piloto de 26 anos, desde a sua chegada à F1 em 2019, têm sido visto como natural sucessor ao torno, todavia, sem a mesma segurança quando comparado com o compatriota. O papel de George poderá ser ingrato na temporada que, dentro em breve, se inicia, bem como para a Mercedes. A equipa terá que gerir as ambições de Hamilton, isto é, terminar a sua ligação ao germânicos em grande, com os desenvolvimentos do monolugar durante a temporada. Se é normal as equipas ocultarem dos pilotos que estão de saída as novas evoluções nos carros, principalmente nos últimos meses da temporada, não deixa de ser verdade que Hamilton não se transferirá para uma qualquer equipa do pelotão. No final de contas, a Ferrari e a Mercedes lutam por um objetivo em comum: ganhar o título de construtores e pilotos. Se ambas necessitam de recuperar a desvantagem em relação à Red Bull não se podem dar ao luxo de trocar informações confidências despropositadamente. Já Russell, deverá procurar protagonizar um final de vida na Mercedes digno para Lewis Hamilton, enquanto procura destacar-se do antigo campeão do mundo. A F1 tem muito de político e George deverá sê-lo, ou seja, isolar Hamilton sem que se coloque em desvantagem, porque se Russel não se superiorizar ao colega de equipa terá pouca notoriedade para o substituir no futuro.
No lado da Ferrari, Carlos Sainz vai abandonar a equipa. Em relação aos detalhes quanto ao desenvolvimento será mais fácil descartar Sainz, principalmente pela diferença de estatuto relativamente a Hamilton. No entanto, o futuro do espanhol está em aberto para 2025 e, por isso, Sainz foi o principal, mas não único, perdedor nesta história, uma vez que Leclerc também vê a sua fortuna alterada. O monegasco deixará de ocupar o papel principal dentro da Ferrari e terá de partilhar protagonismo com Hamilton. Se como anteriormente abordado, financeiramente, o contrato de Hamilton acarreta benesses para os italianos, desportivamente pode significar algumas dores de cabeça. Não deixa de ser um contra senso assinar até 2028 com um ainda jovem piloto no qual foram depositadas todas as esperanças futuras e depois contratar um sete vezes campeão do mundo que não será um braço direito para Leclerc.
We’ve still got one more season to give it everything together @Carlossainz55 💪 pic.twitter.com/NSnIxotBpH
— Scuderia Ferrari (@ScuderiaFerrari) February 1, 2024
Para Hamilton estar numa equipa em que teoricamente faz parelha com um piloto com as mesma ambições internas, melhor dizendo, a correr para ser o número um, não é uma novidade. Recorde-se de 2016, quando corria ao lado de Rosberg e protagonizou um dos mais icónicos acidentes da história da F1. Ambos colidiram na primeira volta do Grande Prémio da Catalunha e abriram caminho para Max Verstappen se estrear a vencer. Nove anos depois, Lewis Hamilton vai tornar a encontrar um colega de equipa com a mesma ambição de se superiorizar internamente. Se Russell chegou à Mercedes para aguardar a despedida de Hamilton, Leclerc receberá o futuro colega de equipa com o lugar ameaçado. Antever o que se sucederá em 2025 é pura especulação, todavia, a temporada de 2024 será importante para perceber com que força Lewis e Charles vão iniciar a primeira época enquanto companheiros de equipa.