Super Rugby Pacific: o reinício de algo que não devia ter acabado

Francisco IsaacAgosto 31, 20217min0

Super Rugby Pacific: o reinício de algo que não devia ter acabado

Francisco IsaacAgosto 31, 20217min0
Está confirmado o Super12 para 2022, naquilo que será o regresso à fórmula "base" do rugby do Hemisfério Sul. Que novidades esperar?

Confirmado, ultimado e lançado… em 2022 vamos ter o Super Rugby Pacific, com 12 franquias juntas a lutar pelo título de campeão do Hemisfério Sul (sem a África do Sul ou Argentina envolvidas) encaixando 5 equipas da Nova Zelândia (Crusaders, Chiefs, Hurricanes, Blues e Highlanders), 5 da Austrália (Force, Reds, Brumbies, Waratahs e Rebels) e duas estreantes do “pacífico”, sendo elas os Moana Pasifika (licença conseguida através da NZR, não tendo uma associação directa quer com a federação da Samoa ou Tonga) e Fijian Drua (licença chegou via a Federação de Rugby das Ilhas Fiji), perfazendo o número mágico de “12”, ou seja, o antigo modelo do Super Rugby (formato que durou entre 1995 e 2005).

Vamos ao que interessa: como funciona este Super Rugby Pacific? Todos jogam contra todos a uma volta, com um extra de três encontros por cada equipa (mais ou menos sorteados), ficando apurados os oito primeiros lugares para os quartos-de-final, com a fase a eliminar a ter só uma mão (as equipas melhor classificadas jogam em casa), e em que o 1º enfrenta o 8º, o 2º o 7º e por aí fora. Não há conferências locais o que significa também que Aotearoa e AU estão em modo suspenso neste momento, sendo, portanto, um retorno à fórmula clássica de campeonato. Cada equipa terá um mínimo de 14 jogos, as duas finalistas chegarão aos 17, e Austrália, Nova Zelândia, Fiji e “Tonga e Samoa” estão unidas neste novo processo unitário.

A questão mais delicada deste modelo escolhido é o facto de 60% das equipas apurarem-se para a fase-final, oferecendo a hipótese de um 7º e 8º classificado de poderem sonhar com o título quando, na maior parte dos casos em comparação com outras competições, estariam eliminados, isto para além de que os dois primeiros classificados retiram quase nenhuma vantagem de terem terminado nessas posições.

O lógico passaria por atribuir aos seis primeiros classificados a hipótese de lutarem pelo título, com o 1º e 2º lugar a ficarem de fora da primeira ronda a eliminar (descanso de uma semana, um verdadeiro bónus para os melhores entre os melhores), enquanto o 4º ao 6º decidiam quem iria chegar às meias-finais. Então porque é que as federações de rugby da Nova Zelândia e Austrália optaram por este sistema?

Numa palavra, dinheiro. Mais jogos, mais imprevisibilidade, pode significar, supostamente, maior lucro e encaixe através dos contratos televisivos e bilheteira, sem que na realidade fique claro se o facto de termos alguns jogos extra se transmita um real retorno económico. Outro pormenor discutível são os 3 jogos extra a decidir para cada equipa, pois terão todos um carácter decisivo que pode até ganhar outra dimensão dependendo dos casos. Exemplo: imaginemos que Fijian Drua e Brumbies estão a lutar por terminar em 8º lugar, separados por 4 pontos a favorecer os Drua.

A franquia fijiana terá três últimos jogos frente a Crusaders (1ºs classificados), Blues (2ºs classificados) e Reds (5ºs classificados), enquanto os Brumbies vão jogar frente aos Blues, Moana Pasifika (10ºs classificados), Waratahs (12ºs classificados) e Highlanders (6ºs classificados). Não há um desequilíbrio claro de calendário? Não se sabendo bem como vai ainda funcionar esta atribuição de três jogos extra, a grande possibilidade poderá passar pela decisão da direcção desta nova competição (não está claro como será o envolvimento da SANZAAR, se total ou parcial) em escalar a classificação com um ranking ou seeds através das posições finais do Aotearoa e Au de 2020 e 2021 mais o Trans-Tasman, oferecendo alguma lógica a uma situação profundamente baseada na “sorte”, sendo que na comunicação oficial do Super Rugby Pacific ficou a nota de que será dada importância aos local derbies, que acaba por sofrer algum “dano” quando juntamos os Drua e Pasifika, franquias ainda sem dérbis históricos.

Ao todo serão 91 jogos, 18 semanas de competição com início marcado para 18 de Fevereiro de 2018 e com a final agendada para o dia 18 de Junho. O que dá a entender isto? É um claro retorno ao Super Rugby que foi “desmontado” pela NZR no ano passado, provando que um dos principais objectivos dessa decisão passou por retirar os seus parceiros da África do Sul, Japão e Argentina da equação, optando concentrar todo o poder na Nova Zelândia e Austrália, numa divisão de fundos mais acentuada nestas duas federações.

Este comportamento de querer retirar altos dividendos à custa do marketing e história do Super Rugby e as suas franquias já começou em 2020, quando, e aproveitando a situação pandémica mundial, a federação da Nova Zelândia lançou o Super Rugby Aotearoa, seguindo-se a Austrália com o AU. Quando ambas as instituições viram que o rendimento era demasiado baixo face às despesas produzidas pelas 5 franquias, lançaram o Super Rugby Tasman, que voltou a criar barulho e atenção do público, extorquindo fundos através da memória e conexão emocional dos adeptos do rugby mundial para com esta competição especial do Hemisfério Sul, onde até o Rugby Pass e a Stan Sport se juntaram como fornecedores do streaming.

Contudo, e passando para outro potencial problema, é o facto de como vai funcionar os Moana Pasifika, que ao contrário dos Fijian Drua, não é uma criação quer da federação da Samoa ou Tonga. Como assim? Bem, esta franquia que em 2020 foi lançada (jogo contra os Maori All Blacks em Hamilton) é uma criação da federação neozelandesa e de alguns parceiros samoanos e do Tonga, que viram uma excelente oportunidade ao dar luz a uma 6ª franquia neozelandesa, capoteada com as cores das outras duas nações das Ilhas do Pacífico.

Na altura, e perante as dúvidas de que isto funcionasse simplesmente para garantir mais um palco de franquia a jogadores neozelandeses ou com passaporte para se naturalizarem, a direcção dos Moana Pasifika (Michael Jones é um dos dirigentes máximos desta equipa) lançou o aviso que 80% da equipa teria de ser composta por atletas declarados pela Samoa e Tonga, não podendo estes se tornarem All Blacks caso a oportunidade surgisse, fechando desde logo a porta a uma mão-cheia de activos.

Mesmo assim, as dúvidas persistem se esta nova franquia vai servir para os outros 20% terem mais tempo de rodagem num nível alto do rugby internacional, podendo os outros 80% não serem dos melhores atletas da Samoa e Tonga, mas sim jogadores vindos de um fundo “amador” ou semiprofissional, que podem encontrar neste Super Rugby Pacifica um trampolim para afirmação em todos os contextos. A World Rugby avançou com 1,2M$ por época, soma dividida pelas duas franquias, tendo que fazer a gestão dos plantéis, arranjar centros de alto rendimento (as Fiji têm um à altura), estadia, viagens e contratos profissionais para uma estrutura que terá no mínimo 100 pessoas envolvidas… suficiente, demasiado ou pouco claro?

De qualquer forma, o Super Rugby está de regresso, Aotearoa e Au são extintos (para já) depois de não terem causado o impacto desejado (as federações da Austrália e Nova Zelândia continuam a não entender que precisam do público europeu, asiático, americano e africano interessados em adquirir o produto, produto esse mal trabalhado a nível do marketing, comunicação e comercial), a NZR e AR acabam vistas como hipócritas pela decisão que fizeram em 2020 e Fiji e os atletas samoanos/tonganeses residentes na Nova Zelândia podem ter uma oportunidade para atingir um nível mais alto na carreira.


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