Seis Nações 2020: a continuação do desastre de Townsend?

Francisco IsaacJaneiro 27, 20206min0

Seis Nações 2020: a continuação do desastre de Townsend?

Francisco IsaacJaneiro 27, 20206min0
A Escócia vai atravessar uma má fase em 2020 ou Gregor Townsend tem matéria-prima para surpreender a competição? A análise ao poder ou não de fogo dos escoceses para estas Seis Nações

2020, ano pós-Mundial é sempre um período dedicado à reformulação da maioria das selecções da oval seja a Nova Zelândia (saída de Steve Hansen e seis All Blacks), África do Sul (Rassie Erasmus vai continuar na SARU mas de uma forma mais leviana), Austrália (Dave Rennie assumiu o lugar de Michael Cheika), França (Brunel disse adeus a um franco bom trabalho desenvolvido nos Les Bleus), Irlanda (Rory Best foi um dos atletas que colocou um ponto final na sua aventura), etc. No caso da Escócia, manteve-se o seleccionador e assistiram-se somente a umas poucas saídas como de Greig Laidlaw ou Tommy Seymour, ambos destacados veteranos do rugby escocês, o que possibilitaria umas Seis Nações 2020 auspiciosas, caso o rugby jogado fosse agradável ou minimamente lógico e útil.

É exactamente nesse ponto que assentam os problemas da Escócia e do seleccionador Gregor Townsend, na qualidade patenteada nas suas movimentações ofensivas ou na durabilidade do sistema defensivo, com ambas secções a mostrarem falhas preocupantes para um membro do Tier-1 da modalidade.

Não há forma de fugir ao problema, a Escócia foi irrefutavelmente uma das piores selecções no Rugby World Cup passado postulando um rugby demasiado lento, ostentando uma falta de capricho e desenvolvimento no ataque e pautando-se por uma defesa que ora consegue aguentar investidas consecutivas do adversário para depois facilmente ceder quando menos se espera.

Desde a saída de Vern Cotter que os problemas têm se agudizado em termos da solidez do colectivo, sentindo-se muitas vezes que os seus maiores protagonistas estavam francamente abaixo do nível e patamar que mostraram em outras ocasiões, como tem acontecido com Stuart Hogg (o melhor jogador das Seis Nações em 2016 e 2017, foi dos mais insípidos em 2018 e 2019), Finn Russell (um constante problema para o staff técnico do Thistle), Huw Jones (brilhante durante os anos de Cotter e moribundo com Townsend) ou os irmãos Gray.

Entre as várias críticas que se fazem ouvir nos dias de hoje à gestão débil por parte da federação escocesa de rugby (como o apoio errático e fraco ao grassroots rugby ou ao desenvolvimento de novas academias), uma das principais vai para os constantes problemas gerados em torno dos grandes jogadores e o excesso de liberdade que foi concedido a Gregor Townsend, quando Vern Cotter foi constantemente agrilhoado em alguns dossiers, abrindo-se aqui um caso de excepcionalidade que poderá ter deixado fracturas difíceis de sarar no longo prazo.

Apesar do actual seleccionador escocês ter conquistado duas Calcutta Cups (jogo que coloca Escócia e Inglaterra frente-a-frente nas Seis Nações) e ter um registo de vitórias/derrotas mais favorável que Vern Cotter, há que lembrar o estado débil e decrépito que a Selecção A da Scotland Rugby Union se encontrava em 2014, arredada ao últimos dois lugares das Seis Nações e vítima constante de derrotas humilhantes às mãos das suas congéneres quando o neozelandês assumiu o lugar.

Cotter reformulou, reajustou e devolveu orgulho a uma formação que estava à beira de um precipício e quando em 2016 viu o seu contrato a não ser renovado, percebeu-se que a direcção da federação escocesa queria dar agora protagonismo a um dos seus como era e é Gregor Townsend, treinador campeão da Pro14 pelos Glasgow Warriors em 2015.

Fast forward para 2020 e temos uma Escócia envolta num manto de dúvidas, recheada de incógnitas e com possibilidade de sofrer alguns reveses minimamente preocupantes. O contratempo gerado pela falta de profissionalismo (novamente) por parte de Finn Russell acaba por ser o primeiro grande obstáculo para Gregor Townsend, que terá de confiar a camisola nº10 a Adam Hastings ou Duncan Weir (convocado no lugar de Russell). Sem aquele fantasista que consegue inventar estratagemas para desembrulhar a defesa adversária, o recorrer a um jogador mais clássico mas com boas pinceladas do rugby-modernismo como é Hastings poderá criar um veículo mais estável e contínuo para as combinações e movimentações do processo ofensivo da Escócia desde que se encontrem os restantes protagonistas certos para o aparelho das linhas-atrasadas.

Chris Harris (ostenta uma boa forma nesta presente temporada ao serviço do Gloucester), Rory Hutchinson e Huw Jones (regressou ao seu melhor pelos Glasgow Warriors, depois de meses em que se falava de uma possível saída para o Hemisfério Sul) terão de lutar pelo lugar de 2º centro, enquanto que Sam Johnson e Matt Scott apresentam-se ao serviço para primeiro-centro. Contudo, só Jones e Hutchinson oferecem alguma frescura e outra panóplia de qualidades a este par essencial para dar estabilidade à estratégia de Townsend e a ausência de um nº12 de elevada qualidade vai propor dificuldades latentes na circulação de bola.

No bloco de avançados é altura de dar outra importância a Zander Fagerson, um dos pilares mais entusiasmantes das Ilhas Britânicas tanto pelo afinamento constante da sua técnica na formação-ordenada ou pelos apetrechos no jogo contínuo (muito similar a Kyle Sinckler) e estas Seis Nações 2020 são o momento ideal para se afirmar no contexto internacional. Porém, se a primeira-linha tem opções já bem rotinadas para este patamar, a 3ª linha sofre de falta de internacionalizações: entre Hamish Watson, Jamie Ritchie (tem de ser o caçador ideal no breakdown), Nick Haining, Thomas Gordon, Cornell du Preez, Luke Crosbie e Magnus Bradbury contam-se um total de 59 presenças pela Escócia.

Ou seja, em jogos a doer a ausência de ter uma linha de cães de fila prontos para não só desmantelar a estratégia ofensiva do adversária como garantir uma linha de ataque em apoio de qualidade é essencial e não há dúvidas que para Gregor Townsend ultrapassar os problemas evidenciados no Japão em 2019 tem de montar uma 3ª linha reforçada fisicamente e pronta para alimentar o jogo. Hamish Watson, James Ritchie e Cornell du Preez podem ser as escolhas ou será que vamos ter Thomas Gordon e Nick Haining a obter a sua estreia de forma surpreendente?

Finalmente, e mais preocupante, é o facto desta Escócia ser uma selecção com pouca juventude nas suas linhas contando só com 9 jogadores abaixo dos 23 anos e sem algum sub-21 na sua linha, expondo as recentes dificuldades do rugby escocês em formar activos minimamente prontos para dar o seu contributo a curto-prazo à selecção principal (lembrar que os sub-20 desceram para a divisão Trophy da World Rugby). Darcy Graham, um dos mais novos entre este contingente de convocados para as Seis Nações, terá de se assumir como referência nas pontas impondo aquele génio com dois pés sempre em sprint e que acarreta problemas para quem está na defesa contrária.

São estes os maiores desafios para a Escócia na entrada para estas Seis Nações e a sobrevivência de Gregor Townsend (e de quem dirige o rugby escocês) passa essencialmente por mostrar que há virtuosismo e equilibrio na estratégia de jogo.

O génio de Darcy Graham


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