O impacto do(s) primeiro(s) treinador(es) nos jovens jogadores de rugby

Francisco IsaacJulho 7, 201927min0

O impacto do(s) primeiro(s) treinador(es) nos jovens jogadores de rugby

Francisco IsaacJulho 7, 201927min0
O quão é importante é um treinador na formação de um jovem atleta? O trabalho, dedicação e visão de quem quer ajudar os novos jogadores a serem futuros cidadãos, no rugby e na vida!

Portugal é em 2019 um país em ascensão desportiva, com não só vários títulos conquistados e sucessos obtidos em grandes provas de clubes ou selecções (seja o Campeonato da Europa de futebol sénior ou aos diversos medalhados na canoagem e remo) mas também com uma expansão no número de atletas amadores e de alta competição nas diferentes modalidades.

No caso do rugby português, e apesar da situação orçamental da Federação Portuguesa de Rugby ou dos clubes portugueses não ser a melhor, atingiram-se francos grandes resultados em diferentes patamares seja o bronze no Campeonato da Europa de sub-18 (o 2º conquistado pela equipa técnica de Rui Carvoeira nos últimos 4 anos), o tricampeonato europeu nos sub-20 (Luís Pissarra tem liderado com segurança e criatividade neste escalão) ou a promoção ao Rugby Europe Championship numa vitória emocionante frente à Alemanha.

O NOVO STATUS QUO DO RUGBY PORTUGUÊS: DEPENDÊNCIA DOS “MIÚDOS”

A queda que o rugby português foi vítima a partir de 2014 foi entretanto suplantada com o sucesso e o imergir de vários novos nomes de atletas, que apesar da tenra idade conseguiram dar provas no que toca a atingir resultados, para além de terem aceitado “aceitado” a responsabilidade de liderar e de dar o exemplo aos seus colegas no rugby português. Martim Aguiar, com ajuda de Nuno Damasceno e João Mirra (e David Penalva ou João P. Varela), foi lançando nos últimos três anos vários jogadores no patamar máximo de selecções nacionais e colheu os frutos do sucesso em 2019… a mal ou a bem, com mais ou menos tropeções, a verdade é que a equipa técnica nacional devolveu aquilo que foi prometido em 2016.

Há quem aponta e alude que o lançamento destes novos jogadores (com uma média de idades entre os 19 e 20 anos) deveu-se ao facto da Selecção Nacional A competir num nível mais fraco (o Rugby Europe Trophy) e que esse factor “escudou” estes jovens atletas de sofrerem com o impacto mental das derrotas e de ter de sobreviver perante nações com mais rugby como a Geórgia, Roménia ou Espanha. Por outro lado, o quase desaparecimento da maioria dos atletas de uma certa faixa etária (entre os 26 e 31 anos) poderá também ter provocado a necessidade de recorrer com mais urgência a estes novos valores, queimando etapas se assim se pode dizer.

Olhando para estas duas afirmações/argumentos, é possível aceitar que ambas tenham algum fundo de verdade… contudo, há outro factor que poderá criar problemas a essas opiniões anteriores que passa por lembrar se tem assistido o aparecimento de melhores jogadores nos últimos cinco anos, mais preparados tecnicamente e tacticamente, com outro conhecimento e noção do jogo, sendo estes todos “filhos” do Mundial de 2007, ou seja, miúdos vindos do boom gerado pela primeira participação portuguesa na maior prova de selecções de XV sénior do Planeta da Oval.

Jogadores com melhores skills, com outra apetência física (o tamanho ou altura não define se o atleta tem capacidade de força de qualidade algo que costuma confundir alguns técnicos e observadores) e de outra “fome” em perceber um jogo de rugby (não se ficam por ver, tentam perceber os “porquês” e “comos”) têm surgido em força e de forma destacada. Mas onde é que tudo começou? Terá sido só por esforço dos atletas ou houve outro factor a influenciar este resultado?

À pergunta colocada existe uma fácil e curta resposta: treinadores. Nos últimos 10/15 anos houve um desenvolvimento interessante da arte do treinar rugby em Portugal, com claras melhorias denotadas nos treinadores que se destacaram nos vários escalões de formação, sejam os sub-8/10/12/14/16/18.

A atenção com os detalhes começa na formação (Foto: Luís Cabelo Fotografia)

TREINADORES DE NOVA OU VELHA ESCOLA… OU DE AMBOS?

Uma boa vaga de técnicos que não colocaram em 1º lugar o objectivo de serem “os campeões da sua divisão” ou de “ganharem tudo”, mas que atribuíram importância a factores como manter o atleta na modalidade (existem cada vez mais distracções desportivas para os jovens), de garantir o seu desenvolvimento motor e mental, no garantir que não goste só do clube em que pratica rugby mas que principalmente se sintam em “casa” no rugby.

Colocar os resultados não de fora da equação na formação, mas num segundo patamar, dando total importância ao jogador não só como atleta mas também como indivíduo. O aumentar da responsabilidade em manter estes atletas ligados à modalidade durante anos a fio, em conjunto com a motivação de quererem melhor ou, pelo menos, se divertir e manter uma conexão saudável ao rugby tem sido um factor determinante dos escalões de formação dos vários clubes portugueses que compõem a modalidade.

Seja em Arcos de Valdevez ou em Loulé, seja no número largo de clubes em Lisboa ou nos três do Porto, a verdade é que tem se verificado um salto na qualidade de atletas que saem da formação, fornecendo à modalidade outras tonalidades e contrastes importantes para o seu futuro.

Portanto, o impacto do primeiro ou dos primeiros treinadores pode ter uma influência gritante no futuro do atleta e a forma como os técnicos oferecem as primeiras experiências e contactos com a modalidade vai ser decisivo no como estes jogadores vão olhar para o rugby durante os vários estágios da sua vida.

São estes treinadores dos escalões entre ou abaixo dos 14 anos de idade que têm ajudar a definir em boa medida o sucesso obtido pelas gerações de rugby, sejam os “físicos” da altura de Vasco Ribeiro ou Manuel Picão, dos “mágicos” Manuel Marta ou Manuel Cardoso Pinto, nos “trabalhadores” como José Roque ou Manuel Nunes, ou nos “irrequietos” como Tomás Cabral ou Jerónimo Portela.

Têm quase sido infindáveis os vários nomes que têm surgido no espaço dos últimos 5 anos no rugby português e este sucesso recente (em termos de resultados) é baseado num trabalho partilhado entre a formação dos clubes e o trabalho realizado nas selecções nacionais, começando em Henrique Garcia e desembocando em Martim Aguiar, passando naturalmente por Rui Carvoeira, Luís Pissarra, João Mirra, Francisco Branco, Nuno Damasceno e outros técnicos que se envolveram dentro do CAR Jamor.

O futuro do rugby português passará sempre por aqueles treinadores que saídos do trabalho das 9 às 5/6, “perdem” algum tempo a pensar em como vão montar os treinos da próxima semana ou mês, reflectindo o porquê do atleta X ou Y estar menos expedito/insatisfeito/rezingão/desmotivado ou como dar uma continuação boa ao jogador que está em alta/satisfeito/feliz/motivado, sendo estes o verdadeiro veículo pelo qual a modalidade pode ou não continuar a somar sucessos, mesmo que alguns digam que estas glórias aconteceram porque as selecções ou clubes estavam em baixa ou pela falta de atletas mais experientes que são “vítimas” das escolhas profissionais.

Para o leitor que poderá tentar usar argumentos encontrados no artigo para vociferar algum desdém perante a vinda de atletas estrangeiros ou a convocações de jogadores portugueses nascidos fora do território nacional, aludimos que o futuro a nível sénior da modalidade passa por ter todos os activos, os que estão a jogar em Portugal e no estrangeiro, a conviver e jogar debaixo do mesmo telhado que é a Alcateia.

O impacto que directores de formação como Nuno Campelo ou Luís Pissarra tiveram na formação de Agronomia, ou de Lourenço Correia Monteiro no CDUL, ou de João Baptista no RC Montemor, João Mirra e Pedro Netto no Belenenses, Francisco Fragateiro e João Sousa Guedes no CDUP, tiveram, têm e terão leva a que seja é impossível de negar a importância do seu papel no rugby nacional. Fomos em busca de conhecer alguns treinadores de formação (do passado e presente) ficando a saber das suas preocupações e motivações.

JOÃO MOURA (GDS CASCAIS)

Qual deve ser o papel do treinador na formação?

No meu entender o papel de um treinador na Formação passa essencialmente por ajudar a desenvolver a criança/jovem! Quando falo/penso em Treinador da Formação, considero todos os escalões que existem no percurso até aos Seniores, desde os Sub-8 até aos Sub-18 e considero 3 áreas importantíssimas!

1) – o seu desenvolvimento pessoal enquanto indivíduos, procurando potenciar o sucesso escolar e escolhas acertadas para o seu futuro e também ajudá-los a crescer e evoluir no sentido de os ajudar a perceberem o seu caminho e lugar naquilo que é viver em sociedade…

2) – o seu desenvolvimento pessoal enquanto desportistas, na tentativa de os ajudar a criar rotinas no sentido de poderem gerir bem o tempo entre escola, desporto e tempo livre, bem como entenderem a importância de bons hábitos saudáveis naquilo que é a alimentação e o descanso fora do treino!

3) – o seu desenvolvimento pessoal enquanto jogador de rugby, com o grande objetivo de preparar em condições o atleta para ser o mais completo possível (no plano técnico, tático, físico e psicológico), quando chegar aos Seniores!!!

Para um Treinador de Formação, a competição é uma ótima ferramenta, servindo como um barómetro do seu trabalho, promovendo um ótimo momento de avaliação para perceber se o caminho e estratégias traçadas estão a dar resultado! Naturalmente que a importância deste momento competitivo vai aumentando à medida que os jogadores crescem e transitam de escalão!

Primeira preocupação que tiveste e tens quando te chega um miúdo de 8/10 anos aos treinos?

Penso que a minha preocupação com miúdos de 8/10 anos foi a mesma que ainda hoje todos os treinadores destas idades continuam a ter… Receber o miúdo e criar uma relação de confiança que resultará com o passar do tempo numa relação de amizade especial!!!

Um miúdo desta idade chega muitas vezes ao rugby “pela mão” dos pais e/ou dos amigos e às vezes a iniciação à modalidade pode não ser fácil, pois nem todas as crianças estão à vontade com o contacto, razão pela qual a FPR – e bem no meu entender – está a procurar minimizar estas questões ao introduzir o Tag Rugby nestes escalões (mas isso é tema para outro dia)…

Depois desta relação de confiança/amizade estabelecida e de aplicadas estratégias adequadas garantindo que os jovens que chegam ao rugby têm um 1º contacto positivo é altura de assegurar que acima de tudo os treinos devem ser dinâmicos, com literacia motora e com muita alegria, onde é importante em simultâneo ir passando os conhecimentos básicos do rugby mas garantir que os miúdos terminem o treino cheios de vontade de regressar!!!

O que vocês procuram incentivar nos miúdos?

Penso que todos os Treinadores de Formação, à sua maneira, procuram incentivar nos seus atletas as questões mencionadas acima, como o desenvolvimento pessoal enquanto indivíduo, enquanto desportista e enquanto jogador de rugby tentando sempre que os miúdos gostem dos treinos e notem a sua evolução enquanto jogadores…

Além disso, é inegável que todos os treinadores – qualquer que seja o escalão – tentam acima de tudo transmitir aos jovens a paixão que sentem pelo Rugby e pelos seus Clubes, apelando sempre ao sentido coletivo! É imperativo que os miúdos (e pais), entendam que quando decidem entrar numa modalidade coletiva, passam a pertencer a um “clã” e que as suas decisões individuais afetam e influenciam sempre a “prestação” coletiva!

E é fácil este envolvimento todo?

De forma alguma….. cada vez mais a sociedade está a mudar… as solicitações para diversas actividades são maiores… a educação dos miúdos está a mudar… o sentido de compromisso está a mudar… Tudo isto são dificuldades para quem está envolvido numa modalidade desportiva coletiva e depende de um número especifico de jovens/jogadores para “conseguir ir a jogo”…! Como dar a volta a isto? Não faço ideia…

LUÍS CAVACO (AEIS AGRONOMIA)

Qual é o foco ou os focos de um treinador que gere as vidas desportivas de altetas de 8/10/12 anos? E Sentes que são estes primeiros treinadores a definir o futuro destes miúdos da formação? É fácil viver com um projecto que só dá futuros a longo prazo?

O treino de jovens jogadores tem tanto de desafiante como de apaixonante. Enquanto treinadores é fundamental nestas idades, sabermos canalizar a sua energia e entusiasmo para o essencial. E o que é o essencial? Qual deverá ser o foco de um treinador? Acima de tudo um treinador deve promover um clima de diversão e de alegria. Desta forma, o jovem atleta, será uma “esponja” e estará em melhores condições de captar o que lhe é exposto. Não nos podemos esquecer que o jogador é o centro de todo este processo de crescimento, e que queremos que cresça em todas as dimensões, sejam estas, técnicas, táticas, físicas ou mentais.

Todas estas dimensões são fundamentais, mas diria que a mais importante é também a mais intangível de todas – a componente mental do jovem atleta. Quais são os seus valores? A convivência em grupo – o “nós” será sempre mais importante que o “eu”; o respeito pelos colegas, adversários, treinadores e árbitros; a reação à adversidade, entre outros. A componente mensal é a mais difícil de trabalhar, mas a que tem mais “retorno” a longo prazo. Melhores pessoas serão sempre melhores jogadores. Esta dimensão não é potenciada única e exclusivamente pelo atual treinador, mas por todos os educadores do jovem atleta, em particular pelo contexto familiar. O desenvolvimento desta componente fará o jovem atleta compreender que ganhar será sempre uma consequência. Consequência de múltiplas ações de um todo sobre variáveis que são totalmente controláveis. O ganhar nunca é um objetivo, nem o foco.

Do ponto de vista mais técnico e tático, entre os 8 e 14 anos, os miúdos deverão, numa primeira fase, compreender as destrezas básicas e o ABC dos movimentos, para depois entrarem numa fase de compreensão e descoberta do jogo, e da aquisição de mais capacidades técnicas. Quanto mais eficaz for esta compreensão por parte dos jogadores, maior será o gosto pelo jogo/modalidade, melhor será seu o desempenho, aumentando assim a sua fidelização.

Como podemos perceber, o treino de jovens atletas é uma equação complexa, com muitas variáveis. O treinador é e será sempre uma peça fundamental nesta complexa equação. Desta forma é muito importante que os treinadores estejam capacitados para tal. A formação de treinadores é um aspeto fulcral para que tenhamos também melhores jogadores, melhores equipas e um jogo mais atrativo.

A formação de treinadores, deve ser pensada e canalizada para o desenvolvimento de atuais e novos treinadores, tendo em conta que a grande maioria são amadores, ou seja, têm uma outra atividade principal/profissão nas suas vidas. Para além disso, como na maioria das modalidades, os treinadores são ex-jogadores. Esta passagem de testemunho, de estar a aprender para fazer melhor, para ensinar outros para fazerem melhor é muito desafiante.

No meu caso em particular, a formação de treinadores cimentou tudo o que aprendi enquanto jogador, colando todas as peças, e serviu também para potenciar outros aspetos da organização de treino, pedagogia e comunicação. Se foi suficiente? Não foi! Está-se em constante evolução e, tal como os jovens atletas, também necessitamos de diferentes estímulos ao longo do nosso processo de crescimento como treinadores, para que possamos estar mais capacitados a treinar diferentes escalões etários.

Um clube que tenha um conjunto diverso de treinadores, com diferentes valências, consegue coloca-los nos escalões etários mais adequados de forma a potenciar os seus jovens atletas. Estará assim mais próximo de cumprir o seu grande objetivo final de todo este processo, que é o de formar o maior número de jovens atletas para fornecer a equipa sénior.

Sendo assim, será fácil estar num projeto que só dá frutos a longo prazo? É muito fácil desde que se tenha presente que está a preparar os jovens atletas para as etapas seguintes. Esse é o grande objetivo de quem está nestes escalões etários. Podemos observar vários aspetos do sucesso/insucesso do nosso trabalho. Aspetos mais tangíveis, como a assiduidade aos treinos e a retenção de jogadores de ano para ano, e aspetos mais intangíveis como o grau de satisfação e alegria dos jovens atletas ou as amizades para a vida. Por tudo isto e muito mais, levamos sempre um sorriso para todos os treinos e jogos com os nossos jovens jogadores.

A minha formação académica e profissão estão longe de ser nas áreas do desporto e do ensino do desporto, mas com este artigo, espero poder contribuir para uma maior reflexão sobre a forma como podemos potenciar os nossos jovens atletas, para serem melhores pessoas e melhores jogadores.

 

A força da juventude (Foto: Luís Cabelo Fotografia)

LOURENÇO MONTEIRO (CR SÃO MIGUEL)

O que deve ser a primeira preocupação de um treinador de formação quando chega um novo jogador ao rugby? O que é que os atletas mais novos procuram ?

Obrigado Francisco, ponto fulcral: O que o atleta (implica diferentes estados de maturação ) procura e aquilo que o treinador procura dar (com ou sem preocupação) são a génese do desenvolvimento!

No escalão Sénior, escalões de competição, ou numa equipa Profissional, o treinador poderá dispor de ferramentas de trabalho (skills) dos seus atletas que deverão estar “disponíveis e às ordens”. Na formação, invertemos a ordem de pensamentos – e as ferramentas terão de ser desenvolvidas por completo, e normalmente nem a criança procura desenvolvê-las.

A preocupação do Treinador em qualquer modalidade será sempre integrar e dar exactamente o que o jovem atleta procura – ambiente positivo, animação e um estímulo claro como consequência da tarefa solicitada.

Embora a criança não procure nada.. e é aí que distinguimos entre Crianças e Atletas. O atleta quer aprender e apenas neste momento teremos condições para progredir. (jogadores – é terminologia que deixamos para os Seniores. RISOS..).

A procura deve ser no caminho de os divertir e estarem animados com a modalidade ou prepara los para o escalão cimeiro? Achas que há alguma desconsideração com o trabalho destes “primeiros treinadores”?

O caminho do atleta não será fácil, e todos os dias é obrigado conter emoções  na Vitória, a envolver os colegas, a frustrar e conter no momento de derrota e a preparar Física-Psicológica-técnica e tacticamente o seu percurso naquilo que o Treinador liderar.. Mas adaptado a cada escalão, se não levarmos no binómio work hard/play hard no treino com diversão e leveza, ninguém aguenta uma modalidade tão complexa e na qual tão tarde (não importam agora os motivos) se aprende a discernir brincadeira de trabalho… Por estes motivos, no Rugby continuamos a perder atletas, somos das realidades mais expressivas do fenómeno dos “de desenvolvimento tardio” chegarem aos Seniores ao invés dos que cedo se revelam portadores de talento inapto.

No Clube Rugby São Miguel e por ser o que defendemos, os primeiros treinadores são a grande aposta! Como nós, temos observado a contínua valorização e aposta nas Formações dos diferentes Clubes, é fulcral que assim seja, e não é novidade que se não trabalharmos bem no 8, 10, 12 e 14 não teremos bons 16, 18 e Seniores.. Já todos os Clubes se aperceberam disto, pois quanto mais não seja, porque hoje o atleta que não esteja bem no “seu” Clube irá procurar uma solução noutro imediatamente ao lado. E ainda bem que o faz!!! Fruto dos tempos, e da disponibilidade de um maior número de Clubes, e com abertura de espírito para continuarmos todos na modalidade, mesmo quando algo não nos motiva.

Costumo dizer que só não gosto de me despedir de um atleta que vá para outra modalidade chateado com o Rugby. A natureza do próprio jogo, é apaixonante e para terminar esta paixão terá de haver algo realmente grave. Enquanto estivermos todos ligados à Modalidade, ainda que em Clubes diferentes, estamos a aumentar o número de atletas, adeptos, curiosos, entre outros que procuram ver o Crescimento do Rugby em Portugal!

JOÃO QUINTELA (BAIRRADA RUGBY)

Qual é a mensagem mais importante a passar a um novo atleta que chega ao rugby pela 1a vez? E que cuidados tiveste ou tens com os teus jogadores mais jovens?

Não faz mal falhar…estamos aqui todos para aprender e nos divertir. o velho “chavão”, que por ser velho não deixa de ser verdadeiro, que ganhar e perder é desporto. Na medida do possível, e clubes diferentes tem capacidades diferentes, deveremos ter uma atenção redobrada aos novos elementos; se estão a perceber o que se passa; se estão a interagir bem com o grupo; se o Grupo está a recebe-los bem. Há que perceber que por vezes as crianças e jovens conseguem ser cruéis no trato com “estranhos”. Deixar os miúdos seguir o seu ritmo; não temos pressa….(não podemos ter pressa).

Quão importante é marcar pela positiva um jogador? O que se pretende oferecer a estes jogadores que ainda não sabem bem o que querem do rugby?

Um jogador que fique marcado positivamente, mesmo que não singre como jogador, será sempre um adepto, será sempre um futuro Pai de jogador, treinador, arbitro, dirigente, etc, com uma boa impressão do Rugby. Pelo contrário um jogador pressionado a fazer coisas que não consegue, fica frustrado, acaba por abandonar o Rugby para nunca mais voltar. Nem como espectador no futuro e ficará com essa memoria dolorosa por toda a vida. Na primeira fase da sua educação como jogadores não procuramos a “performance” ou os resultados, mas a ligação ao desporto. Quereremos criar futuros adultos “de bem” com o Desporto e o Rugby em especial.

LUIS SUPICO (AEIS AGRONOMIA)

Quais são as maiores dificuldades apresentadas a um treinador de formação? Qual tem de ser o mindset e o objectivo de trabalho?

Começo pelo fim: o objectivo de trabalho e o mindset têm de estar focados no objectivo de melhorar, individualmente, os jogadores que treinam – e isso implica aumento dos conhecimentos técnicos, tácticos, mentais e físicos dos miúdos, tanto individualmente como colectivamente. 

Para um treinador (pelo menos para mim) o problema é sempre o mesmo: conciliar os conhecimentos e preferências pessoais (do treinador) com os objectivos do clube, bem como a continuação do crescimento dos miúdos (o que foi trabalhado para trás com o que vai ser mais trabalhado nos escalões seguintes). Este é o maior desafio de todos, já que o nosso conhecimento (dos treinadores) é limitado, tanto por a maioria ser amador (não têm tempo para desenvolver muito mais do que sabem, mesmo querendo) e a ligação entre escalões ser complicada por falta de tempo (cada um está, obviamente, concentrado no seu escalão e fica limitado a isso).

Apesar do profissionalismo dos treinadores não resolver nada a 100%, muitos dos problemas podiam ser resolvidos dessa maneira: ao dedicar mais tempo aos treinos (preparação, execução, follow up, etc.) e ter tempo para haver um aumento do conhecimento adquirido, a grande maioria dos problemas que vemos iriam desaparecer.

Quando é que um treinador de miúdos pode se dar por realizado na sua missão de formar? E já agora, achas que o papel dos primeiros treinadores é valorizado?

Mais do que jogadores chegarem lá acima aos Séniores (sempre um orgulho, ainda mais quando vão bem preparados), o trabalho de um treinador de Formação é, acima de tudo, de gestor – ensinar os miúdos como treinar, como se divertirem, como lidar com frustrações, como conciliar a sua vida pessoal com a desportiva, como aprender a ganhar e a perder; basicamente, como serem melhores pessoas. Como diz o Graham Henry sobre o rugby neo-zelandês, “better people make better all blacks”. A partir do momento que se vê carácter nos miúdos, o trabalho mais difícil está feito – a partir daí vem a parte divertida para os treinadores, que é ensiná-los a jogar.

Tudo o que tenha a ver com Formação vs Competição é sempre uma pescadinha de rabo na boca – sem Formação não há Séniores e o contrário também já que, não havendo o objectivo de jogar nos Sèniores, muitos miúdos vão desistindo ou mudando de clube a meio do caminho.

Há, também, um problema inerente a um treinador de Formação: o bom trabalho só se sente passado alguns anos, já que só passando para os escalões seguintes é que se vê se a base está lá.

Acima de tudo, acho que o treinador de Formação é mais visto como um mal-menor ou um mal-necessário (como há miúdos desta idade, temos de arranjar alguém para lá) do que como um activo do clube, ajudado nas suas pechas e no aprofundamento dos seus conhecimentos, principalmente por necessidades orçamentais. Não tenho dúvidas que os clubes, havendo dinheiro, o distribuiriam de forma mais equilibrada, mas a carolice e a boa vontade de muitos vai disfarçando um problema inerente ao nosso rugby: somos limitados no que conhecemos e fazemos, pelo amadorismo existente.

JOÃO BAPTISTA (RC MONTEMOR)

É um desafio grande ser treinador de escalões de formação, em especial os mais jovens de todos? O que é importante ter em conta desde o primeiro dia?

Eu diria que é um desfio grande ser-se treinador! O papel do treinador exige um vasto conhecimento em áreas distintas e claro que mal está, aquele treinador que julgue ser conhecedor de tudo e não queira aprender mais. Muitas vezes coloca-se a seguinte questão: colocar os melhores treinadores nos escalões de formação ou nos de competição? Ou qual o desfio maior, treinar crianças ou jovens/adultos? E essa pergunta torna-se o grande problema dos clubes portugueses, penso.

De facto, não há uma resposta/decisão certa, aquilo que sei, é que temos de ter os melhores treinadores possíveis a treinar. Julgo que há treinadores que se enquadram mais a trabalhar com determinadas faixas etárias, diria até que têm mais jeito que outros, mas é preciso termos em atenção a motivação das crianças.

Nestes escalões, o maior desafio passa por gerir bem a equipa (desporto coletivo, mas que a individualização é cada vez mais cuidada) e toda a logística, principalmente com os pais.

Para a criança ir experimentar e repetir, julgo que tem de se divertir, sendo este meio-termo de diversão/aprendizagem (aprendizagem do jogo e valores do mesmo – nestas idades o mais importante) que tem de ser muito bem doseado. Cada vez mais, se verifica aquilo que se passa noutras modalidades, onde a exigência feita às crianças, são resultados desportivos! Não pode ser esse o caminho, pois perdem-se muitos atletas e esgotam-se outros!

Achas que o papel do 1º treinador é fundamental para o atleta ficar ligado à modalidade?

Concordo. Todos nós, quando vamos a qualquer lugar e ficamos satisfeitos, queremos sempre voltar, daí ser extremamente importante aquilo que o primeiro treinador faz. Mas o primeiro treinador pode corresponder a qualquer idade, uma vez que, felizmente as crianças/jovens que experimentam pela primeira vez, fazem-no em diferentes idades.

Mas a experiência que tenho, é que muitos jovens não abandonam a modalidade quando encontram um treinador que não lhes agrada; e só encontro uma razão para isso: a riqueza que esta modalidade tem (cooperar, socializar, respeitar, treinar, etc.).

O ótimo é encontrarmos e termos sempre um treinador que seja fundamental na vida do atleta, mas não sendo possível, pelo menos que cada treinador tenha qualquer coisa de muito positivo para agradar e manter os jogadores.

MANUEL CARDOSO (AEIS AGRONOMIA

O porquê de ser treinador de formação? Qual é o foco principal de trabalhar e ajudar os mais novos?

Ser treinador apareceu por acaso. Ao levar os meus filhos aos treinos e por ter sido ex jogador, fui convidado a ajudar no escalão sub8 e fiquei mais 13 anos.

E muito importante que ex jogadores ajudem no escalão de formação. É importantíssimo que os ex atletas e atletas estejam envolvidos na formação para que possam transmitir aos miúdos os grandes princípios do rugby.

Um treinador de formação está na base do sucesso do atleta sénior… É uma pressão real ou não? E se acha que é uma posição desmerecida pelas pessoas que gerem a modalidade no topo?

Na experiência que tenho até ao escalão sub12, temos como objectivo que os miúdos se divirtam e assimilem o que é o rugby, e que principalmente fiquem com o gosto de praticar este desporto. Penso que até aos 11 anos, e difícil de afirmar que somos a base do sucesso, mas também colaboramos.

No clube onde colaboro, poderei afirmar que existe uma preocupação constante da direção em ajudar os escalões de formação, e que existe um investimento forte nestes escalões. O resultado deste investimento tem se visto, pois cada vez temos mais temos jovens a chegar aos seniores vindos das escolas.

O presente e futuro (Foto. Inês Cabral Fotografia)

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