Selecção Nacional de futebol de praia: análise ao que se passou em 2021 – parte I
Este artigo corresponde à primeira de três partes da análise da época da selecção nacional, composta também pela parte II e pela parte III.
A selecção Nacional de Portugal protagonizou este ano uma época atípica, de altos e baixos, em face da disparidade de resultados alcançados nas diferentes competições. Se no Mundial e, mais recentemente, na Copa Intercontinental, a prestação da selecção das quinas ficou aquém das expectativas, na Liga Europeia Portugal exibiu todo o seu esplendor, numa série de actuações categóricas que culminaram com a conquista do ceptro europeu pelo terceiro ano consecutivo. Como explicar uma diferença tão expressiva?
Vaga de lesões
Em primeiro lugar, nunca é demais frisar a vaga de má sorte que assolou a selecção nacional em 2021 no que a lesões diz respeito. Com efeito, as lesões de Coimbra ainda durante a qualificação para o mundial, de Belchior em pleno campeonato do mundo e de Jordan, ausente desde a temporada passada devido a um problema de longa data no joelho, constituíram contratempos de peso com um impacto inegável, dada a influência dos três jogadores nas dinâmicas da selecção portuguesa. Tal constitui um factor determinante para explicar que Portugal não se tenha exibido ao nível de outras temporadas em determinados momentos da época. Também nos guia de forma contundente rumo à resposta à questão anterior: a diferença central entre o desempenho de Portugal na Liga Europeia e nas restantes competições do ano prende-se com a presença de Jordan, já recuperado, e todo o dinamismo que a presença do Best World Player 2019 confere ao jogo de Portugal.
Portugal em grande na Europa
Na verdade, na Liga Europeia, Portugal voltou a contar com a magia do triunvirato composto por Jordan, Bê e Léo Martins, acompanhados por um bravo André Lourenço que tem vindo a crescer e a constituir-se como uma referência no papel que tem vindo a desempenhar (fixo, posição 2). A movimentação constante visando a criação de espaços que desequilibrem as defensivas contrárias voltou a ser uma constante, traduzindo-se numa avassaladora produtividade ofensiva que culminou em vitórias repletas de golos frente a Ucrânia, Itália e Bielorrússia.
No outro quarteto de campo, sob a liderança do capitão Bruno Torres, o entendimento entre Rúben Brilhante e Von começava a dar frutos, apesar de lhes ser concedido um tempo de jogo muito limitado – decisão da equipa técnica nacional por forma a dar primazia ao quarteto mais experiente, numa opção plenamente justificada pelos resultados alcançados.
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Ainda assim, considero que uma maior aposta no outro quarteto poderia ter sido benéfica em vários momentos, possibilitando uma gestão mais eficiente da frescura física do plantel e tirando partido da qualidade técnica de jogadores como Brilhante e Von – recorde-se que, contra a Suíça, no único triunfo verdadeiramente difícil de Portugal, a partida foi decidida por um golo de belo efeito fabricado por estes dois jogadores. Também Rodrigo Pinhal, Miguel Pintado e Bernardo Lopes precisam de mais experiência, a fim de que possam também eles começar a aparecer em momentos decisivos. Não obstante, a estratégia lusa na Liga Europeia conduziu a selecção nacional ao ceptro europeu, num trajecto invicto que confirmou a supremacia portuguesa na Europa de forma inquestionável.
Jordan ausente, Portugal carente
Todavia, a ausência de Jordan no Mundial e na Copa Intercontinental exigiu uma remodelação dos quartetos de campo. A opção acabou por recair na substituição do jogador nazareno pelo seu conterrâneo Rúben Brilhante, que jogou junto de André Lourenço e dos irmãos Martins. Já o segundo quarteto, sempre com tempos de jogo reduzidos, foi geralmente composto por Torres e um misto de opções baseadas em Rodrigo Pinhal, Fábio Costa (no mundial), Pedro Marques (no mundial), Bernardo Lopes (na intercontinental), Von e Miguel Pintado.
A maior aposta nos irmãos Martins parece-me perfeitamente justificada. Porém, acabou por não produzir os resultados desejados. Se, por um lado, a produtividade ofensica foi muito baixa quando a selecção Nacional de Portugal defrontou equipas fisicamente mais fortes (Senegal, Rússia), por outro lado, a selecção nacional manifestou dificuldades em apresentar os índices de solidez defensiva que lhe reconhecemos com base em temporadas anteriores.
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No campeonato do mundo, Portugal até entrou bem com um triunfo por 5-3 diante da sempre incómoda selecção de Omã. Conforme já se esperava, a partida não foi fácil e a equipas das quinas sentiu algumas dificuldades em determinados momentos do jogo. Contudo, uma exibição de gala de Léo Martins, autor de 3 golos com a colaboração do irmão Bê, acabariam por se revelar decisivos. O colectivo português soube responder às adversidades encontradas no 2º período, quando inverteu uma situação de desvantagem no marcador, e acabaria por controlar uma vantagem de dois golos já no 3º período, graças a uma boa entreajuda no seio da equipa e uma gestão inteligente dos momentos do jogo. Ainda assim, nem tudo correu bem nesse primeiro jogo.
A conexão de André Lourenço e Belchior com os irmãos Martins ainda não era convincente e esperava-se que pudesse resultar melhor nos jogos seguintes. Além disso, ainda não era claro o modelo de jogo implementado pelo segundo quarteto, que parecia insistir ainda no sistema 1:2:2 montado por Andrade, e pouco num 3:1 que tirasse partido da experiência de Torres, da acção desequilibradora de Brilhante, da velocidade de Pinhal ou Fábio Costa e das preciosas valências de Von enquanto pivô. Não obstante, a estreia de Fábio Costa foi um ponto muito positivo, tendo o jovem jogador poveiro personificado a resliência lusa ao apontar um golo na resposta imediata a um autogolo infeliz. Esperava-se, pois, que a selecção Nacional de Portugal limasse algumas arestas e se apresentasse na sua máxima força perante o Senegal, unanimemente considerada a equipa fisicamente mais forte do mundo.
Contrariedades diante do Senegal
A partida diante dos Leões de Teranga, no entanto, acabaria por ficar marcada pela lesão precoce de Belchior e pelas mudanças forçadas na equipa das quinas, já descritas anteriormente. Uma baixa de peso como Belchior numa equipa já desfalcada pelas ausências de Jordan e Coimbra teria sempre um impacto significativo, no entanto acreditamos que poderia ter feito mais nessa partida diante dos campeões africanos.
De facto, o quarteto de campo composto por André Lourenço, Rúben Brilhante, Bê e Léo Martins esteve abaixo das expectativas, de tal modo escasso foi o entrosamento entre os jogadores. Muito dependentes da capacidade desequilibradora de Bê e Léo, as investidas portuguesas esbarravam invariavelmente na superioridade física do Senegal. Ficou claro que, para chegar à baliza adversária, Portugal não podia depender das iniciativas individuais de Bê ou das tentativas de colocação de bola em Léo, que se tornavam demasiado previsíveis e fáceis de anular por parte dos jogadores africanos.
A velocidade e rapidez de execução de dois jogadores não chegava. faltava um verdadeiro envolvimento entre todos os jogadores, com movimentações e combinações constantes que pudessem criar espaços e gerar oportunidades de golo. Curiosamente, os golos acabaram por sair dos pés de jogadores mais jovens, graças a uma bicicleta de Von e aos golos de bola parada de Rodrigo PInhal e André Lourenço. No entanto, seria insuficiente, dado o escasso tempo de jogo atribuído à maior parte dos atletas e a excessiva insistência num sistema 2:2 que se vai revelando estéril. Defensivamente, Portugal voltou a denotar fragilidades, eximiamente aproveitadas por jogadores como Raoul Mendy. Os golos do Senegal acabaram por tirar partido de uma tarde pouco inspirada de Andrade, que acabou por ser expulso no 3º período.
Para derrotar o Senegal, além de uma organização defensiva mais sólida que pudesse contrariar o poderio ofensivo dos Leões de Teranga, seria necessário um verdadeiro envolvimento entre todos os jogadores presente em campo, com movimentações e combinações constantes que pudessem criar espaços e gerar oportunidades de golo. Assim se passou em 2019, quando Portugal eliminou o Senegal nos quartos de final, na altura com Jordan e Coimbra alinhando junto de Bê e Léo. Este tipo de abordagem foi também o segredo da vitória do Japão sobre o Senegal na meia final do mundial deste ano, que permitiu um triunfo retumbante de uma equipa fisicamente mais frágil do que o Senegal, e tecnicamente menos dotada do que a portuguesa, mas tacticamente muito mais organizada. A Portugal, contra o Senegal, em 2021, faltou pragmatismo e adaptação do seu próprio modelo de jogo ao adversário.
A continuação deste artigo pode ser encontrada na parte II da análise da temporada da selecção nacional.