Selecção Nacional de futebol de praia: Análise ao que se passou em 2021 – parte II

André CoroadoDezembro 9, 20218min0

Selecção Nacional de futebol de praia: Análise ao que se passou em 2021 – parte II

André CoroadoDezembro 9, 20218min0
A 2ª parte da análise de André Coroado à prestação geral de Portugal no ano de 2021, com foco nos jogadores, seleccionador e muito mais

Uruguai: a estocada final no jogo do tudo ou nada

No confronto seguinte, diante do Uruguai, Portugal estava obrigado a vencer para seguir em frente na competição. Ainda que desfalcada de Jordan, Coimbra e Belchior, a selecção das quinas era amplamente favorita, atendendo à qualidade técnica do seu plantel e ao rigor táctico a que nos tem vindo a habituar. No entanto, do outro lado, a Celeste procurava contrapor os seus argumentos, baseados na capacidade física, organização defensiva e aproveitamento eficaz das oportunidades, ao mesmo tempo que procurava ganhar faltas e jogar com o factor psicológico, provocando e enervando os jogadores portugueses. De facto, os lusos acabaram por não saber responder da melhor forma a este tipo de jogo por parte da formação sul-americana, que reagiu às sucessivas desvantagens no marcador e capitalizou da melhor forma as oportunidades de que dispôs para vencer por 7-6 no final da partida. A excelente prestação individual de Léo Martins, autor de 5 golos, acabaria por se revelar insuficiente e a selecção nacional foi mesmo eliminada de forma precoce da competição.

No momento de analisar a derrota portuguesa diante do Uruguai, vários factores devem ser mencionados. As limitações já observadas diante do Senegal voltaram a manifestar-se sem sinais de melhoria. A selecção alinhou durante mais de 70% do tempo com o quarteto principal, composto por André Lourenço, Rúben Brilhante, Bê e Léo Martins, o que se revelou uma aposta dúbia, atendendo à falta de ligação entre os irmãos Martins e os seus dois colegas de quarteto, dissimulada pela prestação individual de gala do camisola 11.

Por outro lado, o outro quarteto não dispunha de tempo de jogo suficiente nem de um modelo de jogo suficientemente trabalhado para poder ser verdadeiramente perigoso em jogadas colectivas. De facto, além dos 5 golos de Léo, a selecção nacional marcou apenas uma vez por intermédio Von, num pontapé de bicicleta após lançamento lateral, e não por qualquer tipo de jogada de envolvimento colectivo. Igualmente determinantes foi a permeabilidade defensiva da selecção nacional, decorrente de quartetos de campo excessivamente ofensivos que careciam da entreajuda de outrora (André Lourenço e Torres pouco apoiados). Estes factores, aliados à eficácia dos Charrúas e a diversas decisões controversas da equipa de arbitragem, ajudam a explicar os 7 golos sofridos, algo atípico para a selecção nacional, se considerarmos que o Uruguai marcou apenas 1 golo contra o Senegal e a Suíça, equipas tradicionalmente menos organizadas no sector defensivo.

A decisão na baliza

Um outro ponto crucial a destacar corresponde à decisão de fazer alinhar Pedro Mano na baliza, perante a suspensão de Elinton Andrade. Compreendo que a escolha de Pedro Mano em detrimento de Petrony se baseia nas valências técnicas do guardião oriundo da Figueira de Foz, tendo em vista a utilização do guarda-redes na organização do ataque a partir do sistema 1:2:2.

No entanto, discordo desta opção por duas razões. Por um lado, creio que num jogo decisivo no apuramento da selecção para os quartos de final teria sido mais adequado conferir a guarda da baliza a Petrony, guarda-redes experiente que veste a camisola da selecção desde 2014, comparativamente com Pedro Mano, que apesar de já ter provado ser um guardião de qualidade indiscutível contava apenas uma internacionalização ao serviço da selecção antes da partida contra o Uruguai. A pouca experiência do guarda-redes do SC Braga em grandes palcos internacionais reflectiu-se em alguns lances durante a partida, o que atribuo ao nervosismo do atleta, cuja competência e mérito não estão em causa.

Por outro lado, discordo da insistência continuada num sistema 2:2 que não permite tirar partido da qualidade técnica dos jogadores, acabando por tornar o jogo português excessivamente previsível e fácil de anular. O 1:2:2 poderia funcionar se fosse mais trabalhado, por forma a explorar os desequilíbrios numéricos locais criados pelo 5×4, à semelhança do que faz a selecção suíça (recorde-se que os helvéticos derrotaram os uruguaios por 10-1 nos quartos de final). No entanto, creio que seria mais interessante apostar num sistema 1:3:1 pensado para explorar a capacidade desequilibradora de alas como Rodrigo Pinhal e Rúben Brilhante (ou Fábio Costa) e as valências de um pivô forte como Von (ou Miguel Pintado).

Copa Intercontinental: Novamente sem Jordan

A eliminação precoce de Portugal do mundial poderia ser vista como uma oportunidade para avaliar o que tinha corrido menos bem e procurar novas estratégias que permitissem colmatar as ausências de nomes fortes como Coimbra, Belchior e Jordan. Todavia, e felizmente para a selecção nacional, o melhor jogador do mundo em 2019 conseguiu restabelecer-se a tempo da Superfinal da Liga Europeia e revolucionou por completo os índices de qualidade apresentados por Portugal na Figueira da Foz, como já foi aqui discutido. Todavia, a nova ausência do número 5 da selecção nacional na Copa Intercontinental deixou a equipa técnica a braços com o mesmo problema que enfrentara no mundial: estruturar uma equipa para defrontar as melhores selecções do planeta sem contar com o seu mais influente jogador.

O desafio era hercúleo, reconheço-o, mas esperava-se um esforço no sentido de explorar novas alternativas e adaptar o modelo de jogo às novas condicionantes e às características dos adversários. Por outras palavras, creio que o favoritismo estaria sempre do lado da campeã mundial Rússia e do detentor da Copa Intercontinental, Irão (vencedor em 2019), mas pedir-se-ia a Portugal uma nova tentativa de responder às adversidades, que se distinguisse da abordagem infrutífera adoptada no mundial.

Senegal intransponível, reacção satisfatória

O primeiro jogo constituía-se como uma prova de fogo para Portugal, já que os campeões europeus defrontavam novamente o Senegal, desta vez sem poder contar com Bê Martins, suspenso na sequência da expulsão na final da liga europeia. Após algum equilíbrio na primeira metade da partida, o campeão africano acabaria por se distanciar claramente da selecção lusa, que mais uma vez não soube responder com astúcia táctica à supremacia física senegalesa. A adaptação de Léo Martins a uma posição mais recuada na ala trouxe benefícios ao jogo português, assim como a maior utilização de Von e Miguel Pintado. Porém, a gestão do plantel não foi acompanhada por um modelo de jogo mais pragmático e baseado em combinações rápidas que visassem desequilibrar a defensiva africana, pelo que Portugal acabaria por sentir muitas dificuldades no ataque. Ao mesmo tempo, o desequilíbrio defensivo acabaria por se traduzir na concessão de 7 golos ao adversário, que mais uma vez se superiorizava categoricamente à selecção das quinas (7-4).

Nos jogos seguintes, já com Bê Martins de volta, Portugal voltou a apresentar-se com um quarteto principal, constituído por André Lourenço, Rúben Brilhante, Bê Martins e Léo Martins, durante cerca de 70% do tempo de jogo, e colocando os outros jogadores durante intervalos de tempo residuais, num quarteto suplente em que o capitão Torres se constituía como a única presença assídua. Nos dois jogos restantes da fase de grupos, a selecção nacional deu uma boa resposta diante das formações dos Emirados Árabes Unidos e da Espanha, alcançando triunfos consistentes por 5-3 e 7-4, respectivamente.

Vale a pena destacar o crescimento dos alas, já que Bê Martins acabou por regressar aos índices de produtividade que lhe reconhecemos, juntando às assistências um punhado de golos da sua autoria, e também de Rúben Brilhante, que começava a denotar um maior entrosamento com os colegas de equipa do SC Braga. O quarteto principal começava a funcionar um pouco mais como um todo, jogando colectivamente, em vez de procurar a resolução individual. Ainda assim, acredito que a capacidade técnica dos jogadores permite um maior desenvolvimento do modelo de ataque, com maior mobilidade e circulação de bola, tendo em vista a replicação do estilo de jogo adoptado anteriormente pelo quarteto Coimbra-Jordan-Bê-Léo. O recurso ainda excessivo a um sistema 1:2:2 pouco trabalhado, na minha opinião, constitui um obstáculo à concretização deste proceso.


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