FBSWC 2019: Que esperar do regresso do Uruguai?
Histórico da modalidade desde tempos imemoriais, um dos rostos incontornáveis das cinco primeiras edições do Mundial de Futebol de Praia FIFA, o Uruguai desapareceu subitamente do panorama mundial ao falhar a qualificação para todos os campeonatos do mundo entre 2011 e 2017. No entanto, a selecção Celeste regressa ao maior palco global em 2019, viajando ao Paraguai 10 anos depois da sua última aparição (Dubai 2009). Entre 2005 e 2009, os sul-americanos haviam alcançado sempre um lugar no Top 8 mundial, num currículo recheado que incluiu um 4º lugar (2009), um brone (2007) e até o estatuto de vice-campeão mundial em 2006. Que razões levaram ao afastamento dos Charrúas do mundial e o que se pode esperar da equipa neste regresso?
Uruguai: do vice-reinado à queda abissal
Muitos adeptos de futebol de praia poderão estar recordados do panorama da modalidade na América do Sul nos anos 90 e na primeira década do século XXI: um Brasil cujo domínio se estendia muito para lá das fronteiras do Novo Mundo, praticamente nunca perdendo qualquer jogo para os seus rivais continentais; um Uruguai e uma Argentina que surgiam em segundo plano, praticando um futebol de praia pouco entusiasmante mas revelando um conhecimento do jogo suficiente para superar a concorrência dentro da CONMEBOL; e todas as outras equipas, cujo crescimento era travado pela inexistência de uma verdadeira aposta no futebol de praia.
Na viragem da década, essa situação começou gradualmente a alterar-se. Mantendo-se, de um modo geral, a hegemonia do Brasil, a vice-supremacia celeste e albiceleste começou a ser questionada por selecções como o Chile (vencedor da Copa Latina em 2010) e o Equador (afastado do mundial 2009 pela Argentina após grandes penalidades), enquanto Uruguai e Argentina estagnavam em consequência da deficiente estruturação da modalidade a nível interno (inexistência de quadros competitivos). Tratava-se, por isso de uma questão de tempo até que começassem a surgir outras equipas em representação da América do Sul no mundial.
De facto, enquanto a Argentina conseguia compensar a falta de investimento na modalidade com o surgimento de novos jogadores talentosos nas suas fileiras, o mesmo não se passou com o Uruguai, cujo plantel envelhecido se revelou insuficiente para responder às novas exigências.
Seguir-se-ia um longo período de jejum para os uruguaios, que caíram a pique na classificação sul-americana entre 2011 e 2013. Quando finalmente tentaram reerguer-se, iniciando uma necessária renovação, o Paraguai apresentava já um nível muito interessante, superior mesmo ao dos argentinos, enquanto a Celeste vagueava pelo meio da tabela classificativa da CONMEBOL. Os resultados teimavam em não aparecer, embora o nível exibicional começasse a mostrar sinais positivos, mercê do crescimento de valores como Matías Cabrera, Nicolás Bella e Júnior.
O ressurgimento Celeste
Finalmente, em 2018 começam a surgir os primeiros resultados, com a conquista por parte do Uruguai do Goalfun CFA China-Latin America Championship, prova disputada em solo chinês contra outras equipas das Américas. Apesar da ausência de selecções de topo mundial, os uruguaios começavam a indicar uma consistência notável nas suas prestações, à qual dariam continuidade em 2019. Já no presente ano, os Charrúas começaram por deixar boas indicações nos Jogos Sul-Americanos de Praia, onde apesar de não terem chegado às medalhas derrotaram o Chile (7-5) e perderam pela margem mínima frente ao todo-poderoso Brasil (5-4).
O estilo de jogo simples, baseado na versão mais clássica do 3:1 misturado com alguma aposta no 5×4 muito em voga hoje em dia, era acompanhado pelo rigor defensivo e pelas ganas (vontade) de outrora, auspiciando um bom desempenho na qualificação para o mundial.
Com efeito, a turma de Miguel Aguirre Zabala fez uma campanha de qualificação digna de registo, vencendo todos os adversários excepto o Brasil: Colômbia (8-5), Equador (4-3) e Bolívia (5-1) revelaram-se obstáculo fácil para o Uruguai, que apesar da goleada frente ao Escrete (9-1) alcançou as meias-finais; nesse ponto, o favorito Paraguai caiu aos pés dos Charrúas (2-1) numa prestação defensiva de grande nível da Celeste, que assim asseguraram o vice-campeonato e um lugar no mundial de futebol de praia, 10 anos depois da última presença. A nova goleada diante do Brasil (10-1) em nada belisca o mérito de uma equipa que cumpriu o seu objectivo, que muitos julgariam inatingível.
Se é verdade que as derrotas humilhantes diante do Brasil traduzem a enorme distância que separa os uruguaios do topo mundial, o certo é que a série de resultados positivos contra selecções do mesmo nível justifica por inteiro o apuramento para o campeonato do mundo e abre boas perspectivas ao futuro da modalidade no país.
A melhoria das prestações deve-se, em grande medida, ao trabalho de base desenvolvido a nível de clubes: a criação e desenvolvimento de uma liga competitiva, bem com de diversos torneios internacionais onde figuram frequentemente conjuntos dos vizinhos Brasil e Argentina, tem possibilitado o surgimento e a exploração do potencial de jovens jogadores, sendo esta faceta do futebol de praia uruguaio mais visível nas prestações internacionais do Melvín, clube vice-campeão da prova em 2017.
Mundial no horizonte: e agora, Uruguai?
A preparação do Uruguai para o Mundial FIFA prossegue, tendo os Charrúas repetido a presença e a vitória no evento Goalfun CFA China-Latin America Championship, desfeiteando seleõcçes emergentes como EL Salvador e a própria China (treinada pelo antigo astro espanhol das areias Amarelle). Nicolás Bella e demais companheiros de equipa terão também a oportunidade de disputar a Liga Sul-Americana de Futebol de Praia e os Jogos Mundiais de Praia no Qatar, durante o mês de Outubro, preparando assim o ataque ao mundial do Paraguai.
Em Assunção, a Celeste enfrentará Taiti, Itália e México no grupo B, uma composição equilibrada onde não serão concedidas facilidades de parte a parte. Ao contrário do que aconteceria há 10 anos, o Uruguai não parte como favorito num grupo que inclui o finalista vencido das duas últimas edições (Taiti), o campeão da CONCACAF (México) e uma Squadra Azzurra em excelente forma (2º lugar no apuramento europeu, medalha de ouro nos Jogos Mediterrâneos de Praia). Não obstante, o Uruguai já mostrou argumentos para questionar o favoritismo dos seus aversários este ano e será certamente um osso duro de roer para qualquer selecção que deseje alcançar os quartos de final.
Conseguirá o Uruguai surpreender no regresso à elite?