O impingir de uma opinião sem sentido sobre o futebol feminino

Francisco IsaacJulho 26, 20227min0

O impingir de uma opinião sem sentido sobre o futebol feminino

Francisco IsaacJulho 26, 20227min0
Uma coluna de opinião suscitou uma manifestação pública sobre o futebol feminino, e Francisco Isaac responde com factos reais

O que é uma opinião? De acordo com o dicionário de português, o conceito de “opinião” é:

“1. Modo de ver pessoal. = IDEIA

2. Juízo que se forma de alguém ou de alguma coisa.

3. Adesão pessoal ao que se crê bom ou verdadeiro. = CONVICÇÃO, CRENÇA”

Com o desenvolvimento das tecnologias e o aumento de expansão da expressão da liberdade individual de cada um, a “opinião” ganhou outra potência e universalidade, especialmente aquelas que não deveriam ter lugar no Mundo actual, como as que assentam no racismo, xenofobia, misoginia, transfobia, ou as de invocação de violência ou de apagar os crimes de um passado de uma dada civilização/país, com a comunicação social e os leitores a terem largas culpas na difusão constante destas mensagens negativas. Uma vez cá fora, é dever de quem acredita num Mundo novo e de aceitar e encarar os males do passado para alterar ou mudar o rumo no presente ou futuro, de responderem a este tipo de opiniões com algo de superior: uma crítica sustentada por factos.

Exacto, factos, uma palavra que a larga parte das opiniões proferidas por indivíduos apaixonados por aquele tipo de fobia (os que normalmente classificam tudo como “wokeismo”) não faz uso, preferindo distorcer a realidade de modo a encaixar a sua narrativa numa linha de sucessão inexistente e sem qualquer acompanhamento inteligível, mas que, infelizmente, vende devido à ira inerente  de um séquito da população de um dado país ou sociedade.

Porquê esta introdução morosa e que parece fugir ao contexto desportivo do Fair Play? Para explicar exactamente que aquilo que José António Saraiva redigiu sobre o futebol feminino é uma opinião sem capacidade intelectual mínima, desprovida de factos ou argumentos, de completa vergonha e farsa, com o único objectivo de abanar e acordar o seu público preferido, o de conservadorismo de ideias profundamente repelente às mudanças e alterações dos conceitos antigos, que continuam amarrados como se tratasse de uma boia de salvação, quando é, na realidade, uma âncora de aço a afundar rumo ao abismo.

Para quem teve estômago e cabeça de ler as 60 e poucas frases da coluna de opinião do individuo em questão para a versão online do Semanário Sol, é notório como o crescimento total do futebol feminino nacional e internacional está afectar o processo cognitivo de alguém que ainda escreve cartas de amor ao período pré-25 de Abril, criando uma comichão constante dentro de uma massa cinzenta que não tem capacidade, vontade ou força para perceber como as suas palavras estão totalmente erradas.

O leitor que queira estar na cerca, ou a fazer o trabalho do “advogado do Diabo”, poderá perguntar “Mas o futebol feminino merece assim tanto tempo de antena? Não há outros programas que merecem atenção neste período?”, a resposta fácil seria um ressonante “não”, mas isso simplificaria a argumentação ao nível do “exercício” efectuado por António Saraiva, e mais vale complexificar uma argumentação sólida, mesmo que isso afaste uma parte considerável dos leitores devido a essa mesma partícula da “complexificação”.

UM EURO QUE SÓ VEIO CONFIRMAR O SUCESSO

Comecemos pelo um dado forte: 17 milhões de utilizadores viram, em directo, o jogo dos quartos-de-final do Campeonato da Europa feminino entre a Inglaterra e Espanha, adicionando um extra de 3,4 milhões de espectadores após o término do encontro, sendo um dos programas de televisão por cabo mais vistos nos últimos três meses no continente europeu. Em comparação, o jogo entre Portugal e os Países Baixos teve cerca de 800 mil espectadores que acompanharam o encontro desde o 1º minuto, podendo ter fechado já nos 1 milhão de visualizadores, naquilo que foi um recorde para o desporto português, em particular o feminino, que não saboreando da mesma atenção, investimento e desenvolvimento de décadas do masculino, conseguiu ser o 2º programa mais visto do dia 14 de Julho de 2022.

Ou seja, há público, há interesse, e não foi por falta de opções que os 1 milhão de visualizadores decidiram premir o botão “1” do seu comando ou ir à RTP Play online para seguir o 2º encontro das bravas atletas lusas neste Europeu, que está a ser jogado em terras de Sua Majestade. Num país onde o número de atletas femininas do futebol rondará as 15 mil praticantes, é extremamente curioso ver que os números de acompanhamento dos jogos de maior nível – Liga dos Campeões onde o SL Benfica participou na época passada, jogos da selecção, finais de Taça e Supertaça – têm um share gordo e largo para aquilo do que se esperaria, mostrando a vontade da larga maioria dos espectadores em querer consumir mais desporto, seja ele feminino ou masculino.

E para quem possa achar isto um pormenor, o último Campeonato do Mundo feminino já tinha batido recordes extraordinários que acabaram por ajudar às atletas vencedoras a forçarem à Federação de Futebol dos Estados Unidos da América a igualarem os prémios e salários entre os internacionais masculinos e femininos, desbloqueando uma barreira que alguns tinham classificado como impossível de derrubar. A qualidade do futebol é boa/excelente, os estádios têm enchido nas maiores provas de clubes ou selecções, há uma aposta cada vez maior em países como Espanha, Inglaterra, França, EUA, Brasil, etc, o que demonstra que não é só “wokeismo” ou um forçar de uma pequena minoria… é a vontade da larga maioria.

Margarida Bartolomeu, uma das novas autores sobre futebol feminino que trabalha com o Fair Play, já falou das constantes dificuldades, erros de abordagem de diversos “actores” de importância, e daquilo que precisa de ser feito no futuro próximo, de modo a não só termos mais espectáulo como algo mais coerente e consistente das atletas, não sendo preciso repetir ideias que já foram (excelentemente bem) apresentadas neste site. De qualquer modo, ressalvar

Um dado curioso sobre o futebol feminino para que o leitor perceba dos diversos obstáculos pelo qual centenas ou milhares de raparigas e mulheres tiveram de ultrapassar para conseguirmos ter hoje em dia as ligas e campeonatos que temos: durante larga parte do século XX, o futebol feminino foi banido de Inglaterra (até meados da década de 70), impondo uma mordaça na vontade e liberdade de um género já por si massacrado, na altura, pelos elementos de uma sociedade conservadora e de “bons” costumes, tendo de lutar contra todo o tipo de poderes para voltar a ganhar a sua emancipação.

A LUTA PELA EQUIDADE

Ao José António de Saraiva, que apoia todas as ideias que comecem por alguém a chamá-lo de “dr.” ou “excelentíssimo arquitecto” como se necessitasse de validação de títulos para obter o respeito de outrém, a única ditadura que existe é na cabeça de uma pessoa perturbada pela revolução diária de minorias e géneros que foram, na sua maioria, amordaçados, perseguidos, impedidos de exercer a sua liberdade e direitos, sendo ele um ser sem relevância para aquilo que a sociedade contemporânea procura constantemente: equidade. Sim, equidade, e não só igualdade como o referido opinador do Seminário Sol diz ser “uma ideia perigosíssima”, porque é esse conceito da equidade que poderá oferecer um Mundo realmente de todos e para todos.

Ao futebol feminino a única lamentação que poderá existir de quem tem real peso na construção do intelecto da sociedade contemporânea, é do investimento ainda ser insuficiente, de não ter os mecanismos totalmente bem estruturados para começar a ser ainda mais preponderante, empurrando assim para que instituições e potenciais investidores queiram uma cada vez maior aposta no seu crescimento e valorização, fugindo ao conservadorismo de ideias e costumes, duas componentes que significaram retrocessos e atrasos nas civilizações actuais.


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