A Escola de Treinadores do FC Porto é um fracasso?
O FC Porto é um viveiro e uma escola de treinadores a nível nacional: Domingos Paciência, Jorge Costa, Costinha, Pedro Emanuel, Dmitri Alenichev, Carlos Secretário, Jorge Andrade, António Folha, Nuno Espírito Santo, Sérgio Conceição, Luís Castro, Nuno Capucho, entre outros tantos passaram no clube como jogadores ou foram responsáveis pelas camadas mais jovens do clube (caso de Castro).
Mas há algum cunho do FC Porto nas dinâmicas dos treinadores? E quais as razões de tantos jogadores ou antigos técnicos ligados aos Dragões assumirem um estatuto especial em Portugal?
Em Portugal o Sporting Clube de Portugal é considerado a maior “fábrica” de jogadores tendo contribuído decisivamente para a conquista do Campeonato da Europa de futebol em 2016 (dez dos vinte e três convocados foram formados em Alcochete, sendo que o FC Porto foi “representado” por quatro e SL Benfica só com Renato Sanches – prende-se a questão de André Gomes ter sido formado no FC Porto e Boavista, tendo jogado apenas um ano nos juniores das águias)… mas há alguma escola de treinadores no futebol Nacional?
Nas trinta e oito equipas que estão listadas na Liga NOS e LedmanPro cerca de vinte e seis treinadores provieram directamente dos campos de futebol (considerámos que o máximo aceitável iria até ao actual Campeonato de Portugal, ou seja, 3ª divisão nos anos 90), com doze a provirem de formação especifica como treinadores (seja a nova “coqueluche” Miguel Cardoso, passando pelo catedrático Manuel Machado).
Dos vinte e seis treinadores que foram desde internacionais portugueses, atletas da Primeira Liga ou da Divisão de Honra, seis estiveram ligados ao FC Porto: Costinha, Capucho, Folha, Pedro Emanuel, Domingos Paciência e, o próprio, Sérgio Conceição. Jorge Costa poderia entrar nas contas, mas o técnico foi demitido do FC Arouca após um início de época constrangedor, que precipitou a equipa para a 2ª metade da tabela da Segunda divisão.
De resto, nenhum dos outros grandes tem tamanha representação, com Abel Ferreira, para o Sporting CP, e Hélder Cristóvão e Pepa, para o SL Benfica, a serem as excepções à regra.
Mas para além da coincidência de seis treinadores de equipas profissionais terem passado pelo FC Porto, há mais algum dado que valha a pena a ser apontado?
Bem, vejamos que nos últimos cinco/seis anos foram múltiplos os antigos jogadores que pegaram no caderno de treinador e começaram a debitar ordens e conselhos para dentro dos relvados, o que demonstra que há um facilitismo, natural, para que jogadores retirados singrem numa área que conhecem bem, o que agiliza conhecimentos e possibilita que não haja um corte “duro” com a vida que levaram durante 15/20/25 anos de carreira.
A hegemonia do FC Porto nos últimos 25 anos, permitiu que a “escola” dos Dragões se tornasse uma autêntica academia não só para jogadores, mas também para novos treinadores. Para além dos já citados, juntam-se Nuno Espírito Santo, Jorge Andrade, Drulovic, ou mesmo Luís Castro, que atravessou todos os patamares do clube azul-e-branco nos últimos oito anos.
A marca FC Porto certificou, de certa forma, a entrada destes “homens” na carreira de treinador, uma vez que lhes dá uma “espécie” de legitimação e aprovação, catapultando-os para um nível superior. Sérgio Conceição, por exemplo, é a imagem “directa” do futebol do FC Porto dos anos 90: raça pura, ambição decisiva e uma vontade de surpreender e dominar total. É um treinador “fogoso”, altamente inspirador para os adeptos com um discurso e postura contagiante para os mais jovens.
O mesmo aplica-se a Jorge Costa, um dos capitães mais reconhecidos da história do FC Porto e da Selecção Nacional. O treinador apresenta as mesmas valências no banco que outrora apresentava no campo: garra interminável, comunicação sem limite e um sentido de trabalho único. Apesar disso, o treinador não tem tido grande sorte pelos clubes por onde passou, talvez pela forma “intempestiva” com que enfrenta certas situações, tendo ou não razão.
Costinha é outro caso interessante de analisar rapidamente. O trinco com o cognome do “Ministro”, assumiu em 2017 o Nacional da Madeira, estando na luta pela subida com a formação alvi-negra. Um treinador capaz, mas que na hora de maiores dificuldades sucumbe com alguma facilidade e não apresentar uma resposta, dentro de campo, forte o suficiente para mudar o “cenário” adverso. A passagem pelo Paços de Ferreira foi um fracasso total, e em Coimbra não foram dadas as condições mínimas para garantir algo mais que a manutenção.
António Folha começa a dar os seus primeiros passos a nível das ligas profissionais, com alguns detalhes a ficarem bem na retina: organização irrepreensível, trabalho competente na forma de lidar com jovens talentos “selvagens” (fazendo uso das palavras de Laszlo Boloni, na altura que passou pelo Sporting CP, quando se referia a Quaresma como um “Mustang Selvagem”) e excelente leitura da estratégia dos adversários.
Porém, só Folha e Capucho passaram no Dragão como técnicos de formação, enquanto que Costinha, Jorge Costa, Drulovic e até o próprio Sérgio Conceição obtiveram a sua formação fora do clube das suas vidas. Contudo, a marca e a identidade que classificaram sempre os azuis-e-brancos ficaram bem patenteados em cada um destes treinadores, que não viraram as costas ao seu legado.
Talvez, um dos segredos para as vitórias de José Mourinho, Jesualdo Ferreira, Vilas Boas ou Vítor Pereira passou pela intensa estrutura dos Dragões, que começava pelas excelentes equipas técnicas que estavam montadas em redor do treinador até ao corpo dirigente disposto a dar todas as ferramentas para garantir o sucesso. Seja Rui Barros, Paulinho Santos, André, João Pinto, o FC Porto rodeou o banco de homens da casa, que conhecem bem o balneário e que podem dar uma ajuda suplementar ao treinador principal.
E a “fórmula” é replicada nos escalões de formação onde antigos atletas assumem o lugar de técnicos principais seja nos sub-17 (Mário Silva, lateral esquerdo) ou sub-15 (Tulipa, jogador que jogou no Boavista por exemplo).
Mas serão estes homens suficientemente bons para lidarem com o futebol profissional enquanto treinadores ou as oportunidades dadas devem-se, em grande medida, ao estatuto que conquistaram enquanto futebolistas? De todos os nomes citados, zero foram os campeonatos conquistados a nível Nacional, com Luís Castro a obter o único título, em 2015/2016 pelo FC Porto B. Nuno Espírito Santo, um nome agora pouco famoso para os lados do Dragão, ainda chegou a finais de Taça de Portugal e Liga com o Rio Ave, mas nada conquistou.
No geral, todos os treinadores citados apresentam um futebol bom, com alguns rasgos de criatividade, onde a posse de bola é um princípio comum (ou exagerado dependendo dos nomes) e o ataque um bem inestimável. Só que ainda há necessidade de validação ao mais alto nível, onde Espírito Santo, por exemplo, fracassou em larga medida, apesar do apuramento para os oitavos-de-final da Liga dos Campeões na temporada passada.
Acima de tudo, estes treinadores resultaram não só da escola, mas principalmente de um “professor” que de certa forma os terá influenciado para dar este salto: José Mourinho. O técnico que guiou o FC Porto a um dos pontos mais altos em 2001-2003, deixou uma marca “pesada” na memória dos azuis-e-brancos, tendo deixado um legado não só em títulos e jogadores, mas na forma de trabalhar. Trouxe, acima de tudo, novas noções, novas técnicas e novas bases de trabalho, algo que foi “repescado” quer por André Vilas Boas, Vítor Pereira num primeiro “momento”.
Como em outros tempos, grandes referências do SL Benfica saltaram do campo de futebol para o banco de suplentes (Humberto Coelho, Artur Jorge, Ricardo Gomes, João Alves, Diamantino Miranda, Toni, Eurico Gomes, entre outros), agora assistimos ao mesmo “efeito”, com as referências dos anos 90 e 2000 a fazerem parte da nova vaga de treinadores que vão “enchendo” as ligas profissionais em Portugal e não só.
Em suma, o FC Porto é a “escola” que garantiu certas ferramentas, desenvolveu capacidades e permitiu surgirem ideias aos seus “mestrandos”. Seja pela influência de antigos treinadores, das condições dadas pela estrutura ou pela simples motivação em arriscarem numa carreira próxima ao que fizeram a vida inteira, o FC Porto tem desenvolvido a sua quota de treinadores, algo que vai, sem dúvida alguma, influenciar o futebol português no futuro.
Contudo, a grande questão apresenta-se em 2017: é a escola de treinadores do FC Porto, uma escola vencedora? Ou é na realidade uma produção de marketing?