Flamengo X Rede Globo de Televisão: Guerra Judicial à vista
A edição da Medida Provisória que dá ao clube mandante a prerrogativa de negociar seus direitos de transmissão apimentou ainda mais a relação entre o Flamengo e a Rede Globo de Televisão. No dia 22 de junho, o clube foi notificado pela emissora, visto que o rubro-negro quer transmitir a partida contra o Boavista (marcada para 01 de julho) em seu canal do Youtube, pela TV Flamengo.
No documento, a emissora carioca alega que contratos em vigência não podem ser modificados nem por força de lei. O Rubro-negro não tem acordo com a empresa para o Campeonato Carioca e entende que seus direitos estão garantidos. Por meio de nota, a Globo sustentou esta posição e afirmou que a nova medida provisória não afeta as competições cujos direitos já foram cedidos pelos clubes, seja para as temporadas atuais ou futuras. A Globo continuará a transmitir regularmente os jogos dos campeonatos que adquiriu, de acordo com os contratos celebrados, e está pronta para tomar medidas legais contra qualquer tentativa de violação de seus direitos adquiridos.
Pelo lado da Gávea, o Flamengo demonstra tranquilidade mesmo com a batalha jurídica que anuncia. O argumento do clube é que a medida torna válida esta nova realidade e os rubro-negros querem usar seu canal do Youtube para transmitir seu próximo jogo. A venda para uma outra emissora também não está descartada. Assim como a Globo, o clube também se arma para uma possível batalha nos tribunais. O clube optou por não se manifestar, mas o caso está nas mãos de Rodrigo Dunshee, vice geral e jurídico do Fla. A matéria está sendo analisada, porém a cúpula está confiante de que está amparada legalmente. No jogo contra o Bangu, em partida que marcou a retomada do Carioca, não houve exibição, ainda que o Alvirrubro fosse mandante. Como está em desacordo com as novas normas, a Globo optou por não exibir.
“A MP modifica o modelo de negociação dos direitos de transmissão e retransmissão dos espetáculos esportivos, bem como as características dos contratos entre clubes e transmissoras. Se antes estas precisavam da anuência das duas entidades de prática desportiva, agora precisarão apenas da anuência da equipe mandante, necessitando do consentimento de ambas apenas no caso de o mando ser do organizador do espetáculo. Os efeitos da MP não afetam diretamente os contratos em vigor, mas podem impulsionar o diálogo entre as partes visando um aditivo contratual consensual. Por fim, é importante salientar que, apesar da importância do tema em relação à questão econômica do esporte brasileiro, juridicamente não sentido em ser regulado por Medida Provisória”, opinou o advogado Luiz Marcondes, da Benício Advogados Associados, que concluiu: “Como o Flamengo não tem com a Globo a obrigação nesta competição Carioca, então nesta competição, interpreto que o Flamengo pode sim transmitir seus jogos, porque na condição de mandante, ele pode explorar isso da forma como achar melhor”.
Flamengo vai notificar Globo e pedir que emissora não impeça transmissão
Após o Flamengo ser notificado pela Globo, que pediu que o clube desconsidere os efeitos da Medida Provisória que garante aos clubes mandantes a prerrogativa de negociar os seus direitos, o Flamengo preparou o contra-ataque e vai notificar a emissora. O documento já está pronto e depende apenas da assinatura de Rodrigo Dunshee, vice jurídico do clube, para ser encaminhada para a antiga parceira. O Fla irá pedir que a empresa se abstenha de impedir a transmissão em alguma outra emissora ou plataforma própria do clube de seus jogos futuros.
O dirigente garantiu estar seguro quanto ao novo cenário oriundo da nova medida e acenou com uma possível ação por perdas e danos caso haja algum obstáculo. “A Globo será notificada para que se abstenha. Vamos responder a notificação e pedir que ela se abstenha. Há uma disputa comercial e o contrato deixa claro que eles não têm direito em relação ao Flamengo”.
O Rubro-negro está no mercado em busca de parcerias para a exibição da partida contra o Boavista, ainda sem data marcada. O Rubro-negro afirma estar amparados por diversos pareceres jurídicos.
“Podemos ceder nossos direitos por não termos contrato e estamos livres para exercermos o direito reconhecido por lei”, acrescentou ele.
Globo vai à Justiça contra o Fla e chama MP de Bolsonaro de irresponsável
A Globo entrou com um pedido de liminar na Justiça para impedir o Flamengo de transmitir ou autorizar a transmissão de jogos do Campeonato Carioca dos quais seja mandante. A ação faz parte da disputa entre o clube e a emissora sobre os direitos do Estadual. No processo, a Globo alega que a MP que altera os direitos de TV, editada pelo presidente Jair Bolsonaro, foi feita de forma “irresponsável” para beneficiar o clube carioca. Em articulação feita pelo Flamengo, o governo federal editou uma medida que dá ao mandante os direitos de transmissão sobre os jogos, em vez de aos dois clubes como era previsto pela Lei Pelé. Com isso, o clube pretende transmitir o jogo com o Boavista, no qual é mandante, mesmo sem ter acordo com a Globo. A ação pede que o Flamengo seja multado em R$ 2 milhões caso transmita a partida marcada para a próxima quarta-feira (1 de julho). A emissora, no entanto, alega ter contrato com os outros clubes do Estadual sob as regras originais da Lei Pelé. Portanto, diz que uma transmissão do Flamengo estaria ferindo seus direitos. O pedido de liminar foi feito na 10a Vara Cível, e foi noticiado anteriormente pelo Jornal O Dia.
Em sua argumentação, a Globo afirma que a Medida Provisória foi editada de forma “irresponsável” pela presidência da República. Alega que a medida é inconstitucional por ser um desvio de função legislativa para beneficiar o Flamengo.
“Como se passa a demonstrar, a Medida Provisória editada é assustadoramente inconstitucional. Custa a crer que tenha sido editada de forma tão irresponsável. Note-se bem: a discussão sobre a melhor forma de alocar os direitos de transmissão de um evento esportivo é legítima e precisa ser feita. O que não se pode admitir em ordenamentos jurídicos sérios é que isso se dê numa canetada para beneficiar aliados, sem qualquer debate sobre o tema. E muito menos que a nova legislação possa afetar contratos e atos jurídicos perfeitos anteriormente celebrados”, diz um trecho da ação da Globo.
Mais adiante, os advogados tratam da relação próxima entre o Flamengo e o presidente Bolsonaro.
“Tão escancarado foi o desvio de finalidade legislativo, que o benefício obtido pelo Flamengo com a alteração da regra foi vinculado à edição da Medida Provisória em todos os meios de mídia que noticiaram a mudança”, diz outro trecho da ação, que cita notícias sobre a edição da MP. Em seguida, a ação da Globo diz que o STF entende que Medidas Provisórias editadas em excesso de poder ou manifesto abuso institucional, devem ser submetidas ao controle do Judiciário. “O Supremo Tribunal Federal possui sólido entendimento no sentido de permitir o controle judicial de Medidas Provisórias editadas pelo Chefe do Poder Executivo em situações de excesso de poder ou de manifesto abuso institucional que contrariam postulados constitucionais e acarretam prejuízo para as liberdades públicas”, diz a ação.
Globo ataca cinismo do Fla e cita arrogância do clube
Em outro trecho, a Globo ataca o Flamengo, alegando que o clube teve “um cinismo condenável” ao dizer que a medida era para atender seus milhões de torcedores. E acusa o clube de arrogância,
“Não bastasse se escorar em sua popularidade para justificar a imposição de uma agenda que só interessa, na verdade, aos seus próprios interesses comerciais, o FLAMENGO age com intolerável arrogância, tomando para si o papel de porta-voz de inúmeros agentes impactados, direta ou indiretamente, pela abrupta alteração legislativa, sem que estes tenham tido direito a voz ou, sequer, a se prepararem para a abrupta mudança de uma regra que vige no país desde o início da transmissão comercial dos jogos de futebol em televisão, na década de 1970”, diz a ação
No documento, a Globo ainda explica que tentou um acordo com o Flamengo pelos direitos do Carioca, mas que o clube pediu bem mais do que os outros. E ainda questiona a volta do Carioca em meio à epidemia, relacionado a pressão feita pelo clube.
Fla se pronuncia: “não muda um milímetro”
Em resposta, o vice-presidente Jurídico do Flamengo, Rodrigo Dunshee de Abranches, lamentou a ação da Globo contra o clube. E o dirigente manteve a posição de que o clube tem o direito de transmitir jogos dos quais é mandante. Flamengo lamenta que a Rede Globo tenha tomado essa posição de ir ao Judiciário contra um parceiro, que tem o direito adquirido e reconhecido por lei, que é o direito de passar os jogos em que é mandante. O Flamengo não tem contrato com a Rede Globo. O que a Rede Globo tem são os direitos legais de transmissão dos outros times do Campeonato Carioca. Então, ela tem o direito legal de passar os jogos em que eles são mandantes. Isso não colide com o direito do Flamengo. O Flamengo tem direito adquirido e está do lado da população.
“Na verdade, a população que é a maior destinatária desta lei, a população que vai ver o jogo. Então, é importante que esse serviço seja prestado à comunidade. A Globo é uma prestadora se serviço público, uma concessionária de serviço público e acho que não é correto que ela se oponha a um direito reconhecido à população brasileira de ter os jogos e não mais perder jogos, como tem acontecido no Campeonato Brasileiro, onde existe outra emissora, a Turner, que tem oito clubes, a Globo tem 12 e quando joga um contra o outro, às vezes, os jogos não passam e a população é privada de te esses espetáculos. Como agora está sendo privada de ter espetáculo do Campeonato Carioca, onde até um jogo do Bangu, que foi dito que poderia passar, se recusou a passar, sempre privando a população em troca de um monopólio, que entendemos que não é correto.”
A MP veio para acabar com esse monopólio e ser a Lei Áurea do futebol. Essa colocação que essa lei é uma lei do Flamengo é uma tremenda mentira, essa lei dos clubes. Flamengo está discutindo esse assunto na CNC, Flamengo e outros clubes do Brasil tenho certeza de que vão trabalhar para a conversão dessa medida provisória em lei. “O vice-presidente de relações externas e homem-forte da gestão, Luiz Eduardo Baptista, também comentou o caso. “A liminar não é novidade, a gente sabia desde sexta que isso ia acontecer. Já constituímos escritório de advocacia. A Globo entende que tem um contrato perfeito, a gente não entende assim. Entendemos que está tudo no preço que ela pagou pela competição. Não muda um milímetro [na intenção de passar o jogo]”.
Agora vale lembrar, as Medidas Provisórias têem validade de 2 meses e podem ser prorrogadas por mais 2 meses, tendo de ser votadas e aprovadas pelo Senado e Câmara dos Deputados durante esse período. Caso isso não aconteça, a MP deixa de valer… Isso inclusive tem sido um dos problemas para o Flamengo assinar com alguma concorrente da poderosa Globo.