Cândido Oliveira, o lado político do mestre do futebol português


Cândido Oliveira, o lado político do mestre do futebol português

Umas breves notas sobre um dos homens do futebol português que lutou contra o regime fascista e desenvolveu a cultura futebolística nacional. Sabias quem era Cândido de Oliveira?

Na sociedade atual, fortemente marcada por um política de “Desmemória coletiva” – ou não tivesse em 1991, Francis Fukuyama proclamado, erradamente, o Fim da História – assistimos a um grande vazio na forma como as nossas sociedades pensam e sobretudo recordam o seu passado.

O nome Cândido de Oliveira, certamente diz muito a todos os amantes do futebol português, pelo facto de dar o nome à supertaça portuguesa – o troféu inaugural da nossa época desportiva.

Desde 1981 que esta competição entre o vencedor do Campeonato Nacional (ou seja, Primeira Liga) e o detentor da Taça de Portugal da época, encontravam-se para disputar este troféu com um nome diferente e que tentava homenagear um dos “mestres” do futebol português.

Cândido de Oliveira é conhecido no mundo desportivo por ter sido jogador de futebol no Sport Lisboa e Benfica e no Casa Pia Atlético Clube. Como treinador, foi selecionador nacional e esteve à frente do Sporting Clube de Portugal.

Preocupou-se seriamente com a “arte do futebol”, escrevendo vários livros sobre tática, treino e, inclusivamente, o desenvolvimento psicológico dos jogadores de futebol. Foi um dos fundadores do Jornal Desportivo “A Bola” em 1945 – ainda existente e de periodicidade diária.

Mas, um dos seus lados menos conhecido é o de ativo militante antifascista, cidadão e democrata. Cândido de Oliveira fazia parte de uma rede organizada pelo Serviço de Operações de Inteligência inglês, conhecida como rede Shell, por incluir vários funcionários desta empresa em Portugal, que visava o desenvolvimento de missões de sabotagem e destruições de infraestruturas no caso de uma invasão alemã a Portugal durante a Segunda Guerra Mundial.

Por suas atividades contra o regime fascista de António Salazar, Cândido Oliveira seria preso no campo de concentração do Tarrafal entre 1942 e 1944.

Sofrendo, juntamente a outros antifascistas portugueses, as mais graves condições de prisão, tortura, trabalho forçado e repressão. Passou pela tão temida “Frigideira”, foi torturado pela P.I.D.E. (a polícia política do regime fascista) e perdeu o seu emprego nos Correios portugueses (C.T.T.). Para que a memória não se apagasse e que nunca a sociedade se esquecesse daquilo que foi o campo de concentração do Tarrafal, Cândido escreveu um livro de memórias intitulado “Tarrafal – O Pantano da Morte”.

Apesar de ter sofrido, como muitos outros, o lado mais duro e sinistro do regime fascista, não o demoveu de continuar a lutar ativamente contra o regime.

Em 1995 recebeu uma das maiores honras do Estado Português, com atribuição da Grã-Cruz da Ordem de Mérito, a título póstumo. Para além de ter começado um jornal, escrito livros, jogado futebol, conquistado campeonatos como treinador (levou os leões à final da Taça Latina no final dos anos 40 e deu dois títulos de campeões nacionais), inspirou o futebol português a atingir outra dimensão.

Para nunca nos esquecermos que o Homem que dá o nome à Supertaça portuguesa tem um lado maior do que apenas selecionador nacional, e para que a sociedade nunca se esqueça daquilo que por vezes mais faz por não recordar, concluo com as palavras de José Magalhães Godinho:

“Cândido de Oliveira, homem integro, lutador intemerato, um dos sacrificados e uma das grandes vítimas, pelo muito que sofreu, pelas brutalidades inumanas de que foi objeto, nesse negredado período do salazarismo que só por ironia, maldade e má-fé, ainda há quem teime em considerar como um regime meramente paternalista! Honra e glória à memória do grande cidadão, do grande democrata que foi Cândido de Oliveira.”.

Como nota final, vai para a sua paixão imensa pelo esférico, ao ponto que preferiu acompanhar o Mundial de 1958 em Estocolmo para a Abola, quando já padecia de uma doença pulmonar grave, invés de ficar em Portugal em tratamento. Faleceu em Estocolmo, cidade onde o jovem Pelé seria coroado campeão do Mundo com 18 anos.


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