Selecção Nacional de futebol de praia: Análise ao que se passou em 2021 – parte III

André CoroadoDezembro 9, 20217min0

Selecção Nacional de futebol de praia: Análise ao que se passou em 2021 – parte III

André CoroadoDezembro 9, 20217min0
A 3ª parte da análise de André Coroado à prestação geral da selecção nacional de futebol de praia no ano de 2021 com foco no Mundial

Nota: Por lapso, este artigo indicada castigo disiplinar como causa da ausência dos irmãos Martins da partida de atribuição do 3º e 4ª lugares na Copa Intercontinental. A informação errada já foi corrigida e o autor pede desculpa pelo erro.

Rússia e Senegal superiores

Os confrontos da fase a eliminar, frente à Rússia (meia-final) e novamente contra o Senegal (disputa do 3º lugar) vieram sublinhar os problemas ainda latentes no modelo da “nossa” selecção nacional, que efectivamente se apresentou na Copa Intercontinental órfã de Jordan Santos e sem apresentar uma nova ideia de jogo que pudesse responder a este contratempo de peso. Note-se que as derrotas seriam sempre compreensíveis, diante de formações poderosas como a Rússia e o Senegal. Contra o Senegal, tudo se tornou mais difícil devido às ausências dos irmãos Martins, ambos afastados por lesão, na sequência do esforço excessivo a que tinham vindo a ser sujeitos desde a realização do mundialito de Clubes em Moscovo, na semana anterior. Mais ainda, reitero que nada pode ser apontado relativamente ao esforço e empenho dos jogadores, que lutaram do primeiro ao último minuto, bem como da equipa técnica, que procurou sempre encontrar soluções para as adversidades alcançadas com a competência que lhe reconhecemos. Mas as derrotas expressivas, por 7-3 e 7-4, respectivamente, têm de ser lidas com a frieza necessária para retirar as conclusões adequadas, no sentido de um crescimento continuado num futuro próximo.

A goleada sofrida diante da Rússia na meia final acabou por realçar as fragilidades, tanto ofensivas como (sobretudo) defensivas, que ainda se fazem sentir no quarteto André Lourenço-Rúben Brilhante-Bê-Léo, que já aqui abordei. Ficou claro que a abordagem na Liga Europeia, quando Jordan estava em campo, não pode ser mantida na ausência do número 5 de selecção nacional substituindo-o por Rúben Brilhante e esperando que o nível exibicional se mantenha sem qualquer tipo de adaptação adicional. Um aspecto muito importante associado a esta insistência do “quarteto principal” corresponde à fadiga denotada por estes jogadores na etapa final das partidas, particularmente após uma semana repleta de desafios exigentes em dias consecutivos.

A solução passa por uma utilização mais eficiente do plantel, confiando nos jogadores à disposição da equipa técnica, por forma a garantir que os índices de frescura física se conservam elevados durante os 36 minutos. A aposta num “quarteto principal” durante 70% da duração das partidas era habitual na elite do futebol de praia mundial há mais de 15 anos, mas a modalidade evoluiu muito e só muito dificilmente uma selecção pode vencer um grande troféu internacional seguindo esta estratégia (a presença em campo de Jordan, a meu ver o jogador mais completo da actualidade, permitiu o êxito desta abordagem no mundial 2019 e na Liga Europeia 2021).

Um outro aspecto consiste no facto de Portugal ter empregado exactamente a mesma estratégia na abordagem a todas as partidas, sem se adaptar às características específicas de cada adversário. O registo de resultados diante do Senegal e sobretudo as exibições durante essas partidas realçam este mesmo facto: a selecção nunca procurou formas de de estancar o fluxo ofensivo do campeão africano, nem centrou o desenvolvimento do seu jogo ofensivo numa estratégia verdadeiramente colectiva que pudesse levar de vencida a selecção fisicamente mais forte do mundo.

Subaproveitamento do plantel

Por outro lado, os jogadores do “segundo quarteto” acabaram por não dispor de tempo suficiente para poderem dar o seu contributo à selecção ao mesmo tempo que cresciam como internacionais. Realço também, mais uma vez, a perniciosa insistência na saída em 1:2:2 do modo como se encontra implementada na selecção nacional, que acaba por estar profundamente dependente dos remates de Elinton Andrade e não de uma exploração inteligente dos espaços vazios no terreno de jogo. Esta abordagem impede um maior desenvolvimento de jogo, assente nas valências técnicas de jogadores com a qualidade de Von, Rodrigo Pinhal, Bernardo Lopes e Miguel Pintado. No universo destes jogadores, Rodrigo Pinhal, Bernardo Lopes e Miguel Pintado ainda não tiveram realmente a oportunidade para se afirmar na selecção nacional, e os 6 golos que apontaram colectivamente na Copa Intercontinental são mais o resultado de jogadas individuais do que de um modelo de jogo concebido para os fazer crescer e brilhar.

Por último, não se compreende a despromoção de Von ao estatuto de um jogador secundário na nossa selecção, tratando-se de um jogador com mais de 50 golos apontados com a camisola da selecção. Apesar do escasso tempo de jogo que lhe é atribuído (geralmente abaixo dos 10 minutos por partida) e de um modelo de jogo que lhe permita intervir e capitalizar todas as suas qualidades, o número 9 de Portugal continua a aparecer em momentos chave. Recorde-se que foi dele a autoria do golo da vitória frente à Suíça na Liga Europeia, no único triunfo difícil da nossa selecção na Figueira da Foz. Foi também o único jogador a marcar por mais de uma vez no Mundial da Rússia, a par do colega de posição Léo Martins. A reduzida aposta em Von causa, portanto, uma perplexidade justificada no público português, à qual não posso deixar de juntar a minha voz.

Naturalmente, é também importante dar oportunidades a um jogador como Miguel Pintado, que tem vindo a crescer e pode ser uma boa aposta no futuro para a posição de pivô. Porém, o conflito aparente é de fácil resolução: quer pela adaptação de Léo Martins a ala, colocando Von ou Pintado na posição de pivô, quer pela utilização de um sistema 1:2:2 funcional (veja-se os exemplos da Suíça e do Taiti), com Von e Pintado na linha mais avançada, existiria sempre espaço para que os três pivôs da selecção nacional pudessem dar o seu contributo de uma forma equilibrada e racional.

Como nota final, acredito também que uma maior rotatividade na baliza poderia ser benéfica para Portugal, à semelhança do que geralmente acontece nas selecções mais fortes do mundo. Elinton Andrade continua a ser um guarda-redes de classe mundial e protagonizou uma boa época no geral, mas Petrony tem também mantido uma carreira de grande nível no Sporting, apresentando um estilo diferente no que concerne à organização da saída para o ataque. Por esta razão, seria interessante, no meu ponto de vista, implementar uma política de partilha da baliza da selecção nacional, concedendo, por exemplo, um período por jogo a Petrony. A rotatividade é benéfica também para garantir uma competição saudável entre os dois guarda-redes, assegurando a manutenção dos melhores níveis exibicionais por parte do guarda-redes escolhido em cada momento. Além disso, outros guarda-redes do campeonato, entre os quais Pedro Mano, devem também ser integrados gradualmente nos trabalhos da selecção nacional e nas competições. A integração de novos guarda-redes é também facilitada pela política de rotatividade.

A nova época

Acredito que a análise da época foi realizada de forma conscienciosa por parte de todos os envolvidos e que os problemas referidos neste meu ensaio estarão já a ser considerados, tendo em vista a detecção de soluções adequadas que permitam o crescimento da selecção. A época de 2022 será uma nova oportunidade para que Portugal se possa reafirmar nos planos europeu e mundial. Além disso, aguardamos com expectativa os regressos de Coimbra, Belchior e Jordan, em definitivo. Não obstante, espero também que novas ideias possam emergir no âmbito do modelo de jogo da selecção e que este possa potenciar da melhor forma as qualidades de um plantel promissor.


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