Era uma vez o desporto em Portugal

João CamachoMarço 1, 20216min0

Era uma vez o desporto em Portugal

João CamachoMarço 1, 20216min0
A falta de indicações para o retorno ao desporto de formação e sénior poderá condenar o futuro desportivo nacional? A reflexão de João Camacho

Continuamos confinados! O desporto de formação está parado e sem um plano de retoma. A taxa de abandono é assustadora, já ultrapassa os 80%! A regressão em quantidade e qualidade será a fatura a pagar. O que poderia ter sido feito? O que está a ser feito?

Retoma….ou abandono?

Já muito se escreveu sobre a catástrofe que atinge o desporto de formação, mas a falta de uma estratégia, de um plano, de uma política para tentar minimizar o impacto da pandemia e dos sucessivos confinamentos e condicionalismos para a retoma da prática desportiva, a que se junta um silêncio ensurdecedor do governo e, em especial, de quem tem responsabilidade nesta área, antevê um cenário catastrófico para os próximos anos.

Tem sido um tema recorrente, nos meus últimos artigos, e sinceramente esperava ter novidades sobre este tópico, mas o cenário é cada vez mais alarmante. O Comité Olímpico de Portugal, pela voz do seu presidente, José Manuel Constantino, tem vindo a público manifestar a sua profunda preocupação com o panorama atual.

O governo colocou em discussão o Plano de Recuperação e Resiliência com vista ao aproveitamento do maior pacote de medidas de estímulo da história do orçamento da União Europeia. O objetivo é “ajudar a reconstruir a Europa no pós-COVID-19”. O documento simplesmente não valoriza a componente, a meu ver critica, da promoção da saúde das populações, o do aumento dos indicadores de atividade física e desportiva, particularmente junto das populações.

O Governo, reiteradamente, despreza a importância da atividade física e do desporto, bem como desvaloriza as entidades que o promovem e, no que respeita à formação, atravessam a maior crise de que há memória, consequência da paralisação das suas atividades, por força das consequências pandémicas, com muitos clubes, coletividades e pessoas, em total desespero, sem rendimentos, sem quaisquer apoios, em completa agonia. Por outro lado, temos centenas de milhares de crianças e jovens, sem qualquer tipo de atividade física, quando são cada vez mais as recomendações internacionais que reforçam a importância do apoio ao movimento associativo, em especial aos clubes de formação, de modo a promover a atividade física.

O papel e o contributo que todas estas entidades prestam ao País, não é valorizado por quem nos governa e toma decisões! O que está a ser feito para atrair os jovens para regressarem à prática desportiva? Que apoios serão dados aos clubes e agentes desportivos? Resumindo, que estratégias vão ser utilizadas para a retoma do desporto de formação no seu pleno?

Saeid Mollaei

Agora que terminei o desabafo, está na hora de escrever sobre a novela do fantástico judoca Iraniano, Saeid Mollaei. No Mundial de 2019 foi proibido, pelo governo do seu país, de lutar contra o Judoca Israelita Sagi Muki e forçar a derrota na meia-final, como mais tarde viria a confessar.

Para evitar defrontar o Israelita na final, Mollaei ficou impossibilitado de revalidar o titulo de campeão do Mundo gerando uma onda de solidariedade com inicio na condenação, por parte de diversos organismos (Comité Olímpico Internacional, Federação Internacional de Judo, diversas federações e governos), a que se juntaram diversas individualidades, e que viria a culminar com o pedido de asilo e a sua naturalização pela Mongólia.

Mollei, que desde 2020 representa a Mongólia, foi recebido em Israel pelo presidente da federação Israelita e por algumas figuras do Judo Israelita, e após o final da competição, onde conquistou a prata depois de ter perdido na final para o atleta do Uzbequistão Boltaboev Sahrofiddin, deu uma entrevista em que agradeceu a hospitalidade e apoio durante a sua estadia em hebraico, destacando a amizade que tem com o seu adversário e amigo Israeltia Sagi Muki, que espera encontrar na final dos Jogos Olímpicos, e rematou a dizer que não é um político nem quer nada com a política, é um homem do desporto.

Sagi Muki com Saeid Mollaei (Foto: Arquivo do atleta)

Grand Salm Telavive

A segunda etapa do circuito mundial de 2021 visitou a cidade Israelita de Telavive. Portugal deixou algumas das principais figuras de topo em Portugal. A equipa que se apresentou tinha um misto de experiência (Catarina Costa, Rochele Nunes, João Crisóstomo, Joana Diogo e Rodrigo Lopes) e juventude (Wilsa Gomes, Maria Siderot, João Fernando), com alguns atletas a terem aqui uma oportunidade de lutarem aos mais alto nível, contra adversários de peso, numa competição de elevado nível de exigência, como seria de esperar de um Grand Slam.

Se uns tentavam dar os primeiros passos a este nível, outros lutaram por uma qualificação Olímpica, que foi prolongada até ao final de Junho, após os Mundiais de Budapeste. Rodrigo Lopes e João Crisóstomo são os atletas mais perto de conseguir, no entanto, esta etapa não correu de feição, pois acabaram eliminados na fase preliminar da competição.

O destaque vai para Rochele Nunes, a Luso-brasileira voltou ao pódio de uma etapa do circuito, acabando em segundo lugar, e com a medalha de prata, na categoria dos +78Kg. Na final, foi derrotada por uma jovem atleta Francesa de 21 anos de idade, Romane Dicko, que se assume com uma séria candidata ao pódio Olímpico e, assim, perpetuar o legado de Émilie Andéol, a sua compatriota que surpreendeu com a conquista do ouro nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016.

Destaque também para o 5.º Lugar de Catarina Costa na categoria dos 48Kg, que demonstra uma solidez e consistência nos resultados que permitem sonhar com voos bem altos num futuro próximo. Catarina foi derrotada na meia-final pela jovem bicampeã do Mundo, a Ucraniana Daria Bilodid, que, por sua vez, foi novamente surpreendida, desta feita na final por uma jovem Francesa, Shirine Boukli, que está a complicar os planos da equipa técnica Francesa, no que respeita à convocatória Olímpica nesta categoria de peso.

Wilsa Gomes é o último destaque da participação Portuguesa em Tel Aviv. Wilsa terminou na 7.ª posição da categoria dos 57Kg, caindo na repescagem. Wilsa demonstrou uma grande evolução, comparativamente à última competição em que participou, e assume ser uma substituta de enorme qualidade, numa categoria muito competitiva, onde Telma Monteiro tem feito história.

Temos uma “fornada” de talento a emergir e atletas experientes a confirmar o bom momento do Judo Português de alta competição. Há que garantir que este ciclo tem continuidade no futuro, mas face ao panorama atual e aos desafios que o Judo e o desporto em geral enfrentam, tenho sérias duvidas….

P.S.- Falta um mês e meio para os Campeonatos da Europa de Lisboa!


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