15 anos de Mundial de Futebol de Praia FIFA
Remonta a Maio de 2005 o primeiro mundial de futebol de praia organizado pela FIFA. Na Praia de Copacabana, já no final do outono no hemisfério sul, 12 selecções marcaram presença num momento histórico do crescimento da modalidade, que acabaria com a surpreendente vitória da França de Eric Cantona. 15 anos mais tarde, o mundial contabiliza 10 edições e 4 campeões distintos, mas vale a pena relembrar como tudo começou.
História no berço do desporto
Em 1995, a mítica Praia de Copacabana acolhera o primeiro mundial de futebol de praia de sempre, coroando o Brasil como o primeiro campeão do mundo, num evento que teve como principais destaques Zico (isso mesmo, o craque brasileiro dos gramados na década de 80s) e o italiano Altobelli. 10 anos depois, as mesmas areias iluminavam-se para acolher a mesma competição, mas desta vez com a chancela do organsmo máximo que tutelava o futebol de praia mundial, num claro sinal do rápido crescimento de uma modalidade com pouco mais de 10 anos de vida!
Nessa primeira edição, a selecção dos 12 concorrentes obedeceu ainda a um regime improvisado. Além do anfitrião Brasil, a FIFA seleccionou, de forma consensual, Uruguai e Argentina, 2º e 3º lugares na Copa América, os integrantes do pódio da Liga Europeia do ano anterior (por esta ordem, França, Portugal e Ucrânia) e uma quarta selecção europeia que venceu uma prova preliminar de qualificação disputada já no Rio (que acabaria por ser a Espanha).
As outras 4 equipas foram escolhidas na base do convite endereçado a países com relativa tradição no futebol de praia a nível continental: a África do Sul, no caso africano, a Áustrália em representação da Oceânia (antes da integração dos cangurus na AFC), a Tailândia e o Japão como porta-estandartes do futebol de praia asiático. Curiosamente, à excepção dos nipónicos, nenhuma das outras equipas convidadas voltaria a marcar presença em campeonatos do mundo FIFA, a partir do momento em que as qualificações continentais seriam instituídas.
Foi um evento memorável, marcado pelas cores cariocas de um espectáculo desportivo e social que se prestava ao reconhecimento oficial ainda numa fase muito jovem. As diferenças entre as selecções de topo e as equipas menos experientes era abismal, o estilo de jogo muito diferente do que hoje se pratica, os protagonistas outros.
A competição
Analisando os golos da campeã mundial França, por exemplo, encontramos a repetição das jogadas clássicas do futebol de praia, montadas a partir de um sistema 3:1 e executadas de forma exímia pelos seus jogadores: tantas vezes Samoun, pivô dos Bleus, veio buscar a bola na ala e assistir Cardoso ou Mendy, que entravam para finalizar no corredor central – tudo tão simples, e tão eficaz, porque realizado próximo da perfeição.
Efectivamente, desde o início que 3 selecções se destacaram como estando muito acima das demais: Brasil, Portugal e França. Nem a Espanha de Amarelle mostrou argumentos para enfrentar o Brasil clássico de Neném, Benjamim, Júnior Negão e Romário (é verdade!) ou a França de Cantona (que excepcionalmente entrou em campo para compensar a suspensão de Sciortino e ainda anotou um belo golo nessa partida dos quartos de final).
O Brasil dava espectáculo e ia progredindo na competição goleada após goleada… Até esbarrar num obstáculo chamado Portugal. Na inauguração de uma longa História de confrontos entre ambas as selecções em mundiais FIFA, o rigor e a arte dos lusitanos, impulsionados pelos 4 golos de Madjer (Bola de Ouro e Bota de Ouro nesse ano), pela visão táctica de Alan, pela segurança de Hernâni ou a garra de Marinho, acabaria por prevalecer, com um memorável triunfo por 6-5 no prolongamento.
Porém, a França acabaria mesmo por se sagrar campeã mundial, numam final imprópria para cardíacos: vencendo por 3-1 a um minuto do fim, os gauleses viram Belchior bisar para restabelecer a igualdade e seria nas grandes penalidades que um azarado Alan veria a bola embater no ferro da baliza de Aubry para negar o sonho de uma geração que tinha tudo para fazer História.
Os dias seguintes
Hoje em dia, contudo, os tempos são outros. De facto, rapidamente se compreendeu que a dinamização da modalidade noutros continentes traria equipas muito mais bem estruturadas do que as participantes de 2005, e já nas edições seguintes da década de 2000 se verificou uma rápida subida do nível competitivo. A multiplicação do número de selecções, o foco na preparação física dos jogadores e a crescente preocupação táctica levou a uma completa revolução das dinâmicas do mundial e do próprio jogo. As equipas mais fortes foram sendo copiadas pelas restantes e foram sendo trabalhadas formas de parar as armas ofensivas mais perigosas, pelo que a vertente defensiva se foi tornando objecto de trabalho e factor de diferenciação.
A ascensão dos russos, representantes de uma preponderância física e disciplina táctica, ao estatuto de campeões do mundo em 2011 – apenas 6 anos volvidos sobre o primeiro mundial FIFA de Copacabana – constituiu a face mais visível de um desporto em mudança. Dois anos mais tarde, o surgimento dos sistemas 2:2 trabalhados a partir da acção do guarda-redes que sai a jogar com os pés fora da área acabaria por revolucionar a modalidade, sendo hoje o principal sistema de jogo utilizado por mais de metade das equipas a nível mundial.
Entretanto, depois de algumas aparições nos primeiros anos, acabaria por não conseguir acompanhar a evolução da modalidade na Europa, ficando arredada dos mundiais desde a edição de 2009. Também outros vultos da modalidade no velho continente acabaria por falhar a maior competição do planeta, tais como Portugal (2013), Itália (2013) e Espanha (2011, 2017, 2019), mas também a própria Rússia (2017).
Outras selecções apareceram e desempenharam papéis importantes na História de mundiais como o México (finalista de 2007), El Salvador (4º lugar em 2011), Taiti (finalista das edições de 2015 e 2017) ou Irão (3º lugar em 2017, embora ausente do último mundial). Provas do crescimento de um evento que se converteu em si mesmo num prémio apenas ao alcance dos melhores. É por isso que hoje, em 2020, olhando para trás, temos razões para sorrir perante a trajectória até aqui realizada pela modalidade, mas sem deixando de celebrar o carácter iniciático desse mítico mundial de Copacabana 2005, a primeira página de uma linda história que continua a escrever-se nos areiais desse mundo fora.