Uma reflexão sobre Vinícius Júnior

Ricardo João LopesNovembro 2, 20255min0

Uma reflexão sobre Vinícius Júnior

Ricardo João LopesNovembro 2, 20255min0
Ricardo João Lopes faz uma reflexão ao talento e frustração de Vinícius Júnior, naquilo que tem sido um ano delicado para o extremo

Ponto prévio: Vinícius Júnior é um dos melhores jogadores do mundo e teria lugar em qualquer plantel do futebol mundial. A sua qualidade dentro de campo é inquestionável, e ainda poderá crescer mais nos próximos anos, já que não atingiu o seu pico.

O brasileiro chegou ao Real Madrid em 2018, depois de ter brilhado com as cores do Flamengo. O jogador integra o grupo de talentos que os merengues contratam ainda em idade jovem — por valores elevados — para evitar pagar ainda mais caso passem antes por outro clube europeu. Rodrygo, Reinier, Estêvão e Franco Mastantuono são outros exemplos dessa política, que tem enfraquecido equipas como as portuguesas, outrora habituadas a recrutar promessas da América do Sul para depois vendê-las aos “tubarões”. Uma jogada de Florentino Pérez que serviu de exemplo e merece ser elogiada — até pelo seu maior crítico.

Se inicialmente se previa a sua colocação no Real Madrid B na primeira temporada, Vinícius Júnior rapidamente provou que o seu lugar era outro. Conquistou espaço no plantel principal e começou a lutar pela posição de extremo-esquerdo, tal como aconteceu com Rodrygo. Depressa se percebeu que o brasileiro era diferenciado e poderia marcar uma geração, assumindo até a liderança da sua própria seleção, papel que antes pertencia a Neymar Júnior.

Os números comprovam o sucesso de Vinícius Júnior — nem é preciso destacá-los. Afinal, era o menino bonito do Bernabéu e o protegido de Carlo Ancelotti. Contudo, à medida que a sua importância crescia dentro dos relvados, as polémicas também aumentavam. Vinícius Júnior foi alvo de racismo em várias ocasiões, gerando interrupções de jogos, conflitos entre jogadores e adeptos, protestos e críticas por parte de várias figuras ligadas ao futebol. Todos queremos esses adeptos mal-intencionados fora do desporto. Vinícius foi protegido e tornou-se o rosto de uma luta que jamais deveria existir. Porém, há outro lado no jogador.

Vinícius Júnior não é um santo. É provocador, procura desestabilizar adversários e adeptos, fala para a bancada, protesta com os árbitros, simula faltas e tenta alterar o estado emocional dos oponentes, levando-os a perder a cabeça. O jogador tem os seus alvos bem definidos e, quando recebe resposta, recorre aos colegas para se proteger. Com o passar dos anos, o mundo do futebol percebeu a sua estratégia. Se antes, pela juventude, tais atitudes se compreendiam, agora já não se perdoam a um adulto que deve assumir responsabilidades.

Os últimos meses não têm sido fáceis para Vinícius Júnior e para o seu ego, que precisa de constante validação. Ele acredita que é o melhor, mas necessita que lho digam frequentemente. O ano de 2024 ficou marcado pelo seu segundo lugar na Bola de Ouro — justo para uns, injusto para outros. O Real Madrid solidarizou-se com o jogador ao faltar à gala, mesmo com outros elementos a receber prémios. Para os merengues, era impensável Vinícius Júnior ter perdido o troféu para Rodri.

Consultando os critérios de atribuição da Bola de Ouro, há um ponto designado “Classe e jogo limpo”. Os jornalistas não viram em Vinícius um exemplo nesse aspeto, e o seu segundo lugar deveu-se, em parte, à nota negativa neste critério. Com a bola nos pés, foi o melhor — mas as suas atitudes fora dela contribuíram para a derrota.

Em 2024 surgiu outro acontecimento que impactou Vinícius Júnior, refletindo-se em 2025: a chegada de Kylian Mbappé ao Real Madrid. O francês trocou o PSG pelos blancos para assumir a frente de ataque. Sempre solidário com a posição de Vinícius, Mbappé foi um dos coadjuvantes da equipa — o brasileiro manteve o lugar na esquerda, embora tanto Mbappé como Rodrygo rendessem mais nessa faixa do que nas posições onde eram colocados. Porém, a época 2025/26 está a evidenciar a diferença entre os dois. O ex-PSG tornou-se o verdadeiro craque da equipa, sem provocações, apenas com talento — mostrando estar um passo acima dos restantes.

Vinícius era a estrela de Ancelotti, mas para Xabi Alonso é apenas mais uma peça. E isso deixa-o furioso. O brasileiro não suporta ser substituído e perdeu a cabeça quando o novo treinador o retirou frente ao Barcelona, chegando a dizer que queria deixar o Real Madrid — tudo captado pelas câmaras. Assim, Vinícius acabou por ser o protagonista do El Clásico sem ter feito nada de especial com a bola nos pés.

O pedido de desculpas nos dias seguintes foi uma mera formalidade. Engana-se quem pensa que Vinícius está arrependido. No próximo jogo — curiosamente frente ao Valência, um dos clubes com quem mais se envolveu em polémicas — poderá voltar a reagir mal ou, pelo contrário, fazer um jogaço e ser capa pelos bons motivos. Xabi Alonso saberá lidar com a situação, tendo passado por balneários cheios de egos (desde logo com Cristiano Ronaldo) e acumulando experiência nesse tipo de contexto.

Contudo, o futuro de Vinícius Júnior é incerto. Florentino Pérez é paciente, mas não tolera casos de indisciplina. Xabi Alonso já deu a entender que Kylian Mbappé é o único intocável do projeto, e Vinícius já não tem a mesma proteção de outrora. O técnico admira Kenan Yildiz, jogador da Juventus que atua precisamente na mesma posição do brasileiro — e a sua chegada colocaria o ex-Flamengo em xeque. Os rumores que o ligavam ao PSG ou à Arábia Saudita eram outrora vistos como absurdos, já que o Real Madrid era a sua casa. Hoje, já não é bem assim.

Não é descabido imaginar Vinícius Júnior como um dos protagonistas das próximas janelas de transferências — algo impensável há poucos anos, quando muitos acreditavam que seguiria os passos de Cristiano Ronaldo e permaneceria no Bernabéu durante todo o seu auge.


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