O que é o futebol sem a formação?!
Hoje desvio um pouco o meu foco do Futebol Feminino, e opto por uma abordagem um pouco mais abrangente… Olhemos para o mundo do futebol. Olhemos com atenção. O que vemos?! Equipas seniores, equipas milionárias, constituídas por jogadores milionários. Mas o que está por trás dessas equipas milionárias? Será apenas dinheiro, investidores, patrocinadores, troféus?! A resposta, mesmo que muitos não queiram admitir, é “Não!”.
Todos os jogadores e jogadoras de futebol foram, um dia, crianças com um sonho. Esse sonho, para a grande maioria dos jogadores de futebol, começou cedo, no clube da terra, onde puderam iniciar a sua prática desportiva muito jovens (5/6 anos de idade), e aí crescer enquanto seres humanos e jogadores de futebol, dispondo de um processo formativo dentro do seu clube, integrados no seu grupo de amigos.
Para a grande maioria das jogadoras de futebol, principalmente as jogadoras seniores em Portugal, esta não foi uma realidade. Muitas iniciaram a prática desportiva já na adolescência, algumas diretamente integradas em plantéis seniores, saltando importantes e essenciais etapas do seu processo formativo no mundo do futebol. Os gestos técnicos mais básicos, como a receção da bola, ou a orientação dos apoios, foram aprendidos em fases tardias do seu desenvolvimento, tendo um grande impacto no seu desempenho e na sua afirmação como jogadoras de futebol, o que se refletiu (mas reflete cada vez menos) no desempenho dos clubes e das seleções nacionais.
Não é por acaso que só recentemente, os clubes e a seleção portuguesa feminina têm demonstrado uma real capacidade competitiva contra clubes e seleções estrangeiras. Isto acontece pois há relativamente pouco tempo é que os clubes, desde os de maior dimensão, aos de menor, tomaram real consciência da importância de proporcionar um bom percurso formativo às suas atletas, garantindo que as mesmas têm oportunidade de praticar futebol desde tenra idade, à semelhança do que acontece com os seus pares masculinos.
Contudo, importa realçar outra questão. A sustentabilidade dos clubes pequenos, e por mais que muitos ainda teimem em negar as evidências, está diretamente dependente da qualidade da formação que proporcionam aos seus atletas, sejam eles masculinos ou femininos. Podemos falar apenas em sustentabilidade desportiva, pois nos clubes de menor dimensão (e quando refiro “menor dimensão”, refiro-me a clubes que se encontram fora da principal liga de cada género, fora do núcleo profissional ou até semi-profissional, no caso do futebol feminino), as suas equipas seniores serão, maioritariamente, alimentadas pelos/as atletas provenientes da sua formação. No entanto, a sustentabilidade financeira desses mesmos clubes também se encontra diretamente ligada (e dependente) de um bom processo formativo. Pois desengane-se quem acredita que uma equipa sénior, nos campeonatos nacionais secundários, ou distritais, vive apenas de investidores e patrocínios, pois tal é, na minha modesta opinião, matematicamente impossível. Além dos ordenados e/ou ajudas de custos que possam ser pagos aos/às atletas, treinadores, massagistas, diretores, etc., existe todo um universo de despesas “extra”, que são essenciais para que os/as atletas possam praticar futebol.
E quem suporta essas despesas? De onde vem esse dinheiro? É óbvio que parte desse dinheiro provém dos patrocinadores dos clubes, das Associações Distritais de Futebol, da Federação Portuguesa de Futebol, de vendas de rifas, calendários, cabazes, etc., mas também é óbvio que grande parte desses fundos são provenientes dos/as próprios/as atletas ou, mais corretamente, dos seus encarregados de educação, através dos pagamentos das mensalidades associadas à possibilidade de prática desportiva nos clubes.
É essencial, a meu ver, que este pequeno (grande) detalhe não seja esquecido pelos clubes. É essencial promover ambientes saudáveis para o crescimento dos/as atletas, proporcionando as melhores condições de formação e aprendizagem, pois é assim que se conseguem atrair mais e mais atletas, e potenciar o crescimento desportivo, humano e financeiro dos clubes!
Não esqueçam a formação, não subvalorizem a formação, apostem nela, acreditem nela! Proporcionem aos/às vossos/as atletas todas as condições para serem felizes a jogar futebol, pois só assim será possível continuar o processo evolutivo do/a atleta, das equipas, e do clube!
NÃO HÁ FUTEBOL, NÃO HÁ EQUIPAS, NÃO HÁ CLUBES, SEM A FORMAÇÃO!