Selecção de Portugal: as perguntas a responder por Fernando Santos

Francisco IsaacSetembro 28, 20229min0

Selecção de Portugal: as perguntas a responder por Fernando Santos

Francisco IsaacSetembro 28, 20229min0
Portugal está fora da fase final da Liga das Nações e Francisco Isaac realiza algumas questões que Fernando Santos deveria responder em campo

Eliminação e problemas antes do Mundial, algo que Fernando Santos não procurava, mas parece ter gerado por sua própria vontade, isto num momento que a equipa procurava paz, harmonia e acerto… três questões que o seleccionador nacional tem de responder em campo, e da forma acertada.

CONFIAMOS EM 11, 12, 13 OU 26 JOGADORES?

No jogo frente à Espanha a contar para a Liga das Nações, ou ante a Sérvia na corrida por lugar no Campeonato do Mundo 2022, ficou demonstrado, mais uma vez, a existência de um molde táctico que força, em si, os mesmos jogadores, esperando que estes aguentem a intensidade do princípio ao fim, ou até serem substituídos, com estas mexidas a já se darem quando o jogo parece estar completamente “partido” ou perdido. Contra a selecção espanhola, a verdade é que a estratégia escolhida e imputada por Fernando Santos resultou e anulou o adversário até aos 55 minutos – os jogadores de Luis Enrique realizaram o dobro dos passes durante esse período, mas não se aproximaram à área de forma perigosa -, altura em que a capacidade física dos homens do meio-campo começou a cair a pique, requerendo alterações imediatas para manter a equipa contrária na mesma situação, impedindo, também, uma mudança de mãos do controle dos timings e velocidade do jogo.

Porém, a primeira substituição só foi processada aos 73 minutos, momento em que a Espanha já detinha o ascendente e se sentia completamente confortável dentro do meio-campo português, expondo as lacunas do “miolo” nacional, e a colocar os comandados de Fernando Santos numa situação de provável xeque, que chegaria aos 88 minutos. Com Matheus Nunes, João Palhinha e Vitinha como opções, Fernando Santos optou por alterar, em primeiro lugar, um extremo, retirando Bernardo Silva, que foi substituído por João Mário, revelando-se uma decisão não só tardia, como errada.

O estado físico e anímico de Cristiano Ronaldo também poderia ter suscitado uma mudança logo ao início da segunda metade do encontro, atirando Rafael Leão para a frente de ataque, o que poderia causar um impacto significativo na forma como o aparelho defensivo da Espanha teria de reagir… porém, mais uma vez, o selecionador não só não retirou o jogador mais desgastado, como trouxe Rafael Leão demasiado tardiamente para o jogo, tirando qualquer possibilidade de impacto na entrada do avançado do AC Milan.

Este preâmbulo que pode parecer excessivamente logo, ajuda-nos a ter os factos suficientes para realizarmos a seguinte questão: os jogadores que irão estar no Catar detêm todos a mesma dose de confiança, ou efectivamente Fernando Santos só realmente deposita reais expectativas numa gama de atletas? Neste momento, os factos jogam contra a primeira possibilidade, e isto é facilmente observável pelas opções tácticas realizadas quer antes dos jogos de mais importância ou durante, arriscando só em certas soluções em situações extremas ou quando o cronómetro se aproxima do fim do encontro. Se é por receio de quebrar com a harmonia (por vezes, inesperada) construída, como se viu contra a Espanha, então o seleccionador não deveria ter o mesmo medo quando a equipa quebra por completo e expõe falhas suficientemente graves para o adversário dar a volta ao jogo?

O conseguir reequilibrar a equipa com as substituições é um dom e qualidade do mesmo nível de importância que conseguir lançar a equipa certa ao início, ou, até mais nuclear, como demonstrado quer pela Sérvia de Dragan Stojkovic ou a Espanha de Luís Enrique, algo que Fernando Santos peca em excesso, e que acaba por comprometer todo o pequeno ou grande brilhantismo conseguido – quando o consegue – durante o arranque de um dado jogo.

Ao contrário de outras eras e tempos, Portugal detém não só um 11 de enorme qualidade, como um banco de suplentes ou até reservas, tendo quase 30 jogadores de um patamar elevado que podem corresponder com excelência caso a equipa técnica saiba os lançar em campo, e é nesse elemento que Fernando Santos estagnou por completo, em comparação com os resultados conseguidos entre 2016 e 2019. Rafael Leão teria correspondido na posição de Cristiano Ronaldo frente à Espanha, Matheus Nunes e João Palhinha poderiam ter dado outra agressividade num momento de queda, e a própria entrada de Diogo Dalot poderia ter resolvido algumas das falhas defensivas de João Cancelo naquela fase final do encontro.

No Campeonato do Mundo não há segundas oportunidades quando se perdem pontos na fase-de-grupos, e o confiar – verdadeiramente – no grupo é fulcral para levar a equipa a bom-porto. Substituições como aquelas que foram realizadas frente à Sérvia ou Espanha enviam uma mensagem envenenada ao grupo, assim como alguns comentários menos profissionais nas conferências de imprensa.

CRISTIANO RONALDO É INTOCÁVEL?

A questão poderia se aplicar tanto ao capitão da selecção nacional, como a qualquer outro jogador que tem merecido a confiança cega do seleccionador num momento de forma negativo ou que está em fase de recuperação de uma lesão, podendo comprometer parte da estratégia de Portugal para um dado encontro ou campanha. Deveria Cristiano Ronaldo ter ficado de fora destes dois últimos embatas na Liga das Nações? Talvez, mas o mesmo poderia ser aplicado a João Félix (um arranque de temporada que começou bem, e que no entretanto amargou ao ponto de não ter uma influência significativa no Atlético de Madrid) ou Diogo Jota, com Fernando Santos a optar por segurar qualquer um destes jogadores, uma vez que estarão no grupo de trabalho para o Campeonato do Mundo. Mas não poderia ter o astro do Manchester United ter sido relegado para o banco de suplentes ou, pelo menos, substituído tanto contra a Chéquia e, especialmente, frente à Espanha?

A imagem deixada é que parece que Fernando Santos e a selecção portuguesa decidiram transformar estes dois jogos como “pré-época” para Cristiano Ronaldo, retirando peso à importância destes encontros para a Liga das Nações. Com Rafael Leão numa momento de forma extraordinário, a substituição de um pelo outro não iria tirar qualidade ao ataque, pelo contrário, até poderia ter injectado uma influência positiva na manobra e estratégia que Fernando Santos procurava imputar, alterando o rumo dos acontecimentos, e a tirar alguma carga de cima de Cristiano Ronaldo. Ao deixar o capitão dentro de campo até ao apito final, a imagem sai riscada e só prejudica o avançado num momento crítico tanto na preparação para o Campeonato do Mundo como de dar confiança e paz aos seus restantes colegas.

Esta questão vai também para William Carvalho, João Cancelo, Diogo Jota, Bernardo Silva ou qualquer outro jogador que não esteja a retirar o rendimento desejado, podendo facilmente optar por Vitinha, Diogo Dalot, Pedro Neto, Matheus Nunes, João Palhinha ou Ricardo Horta, com qualquer um a deter da qualidade suficiente para vestir a camisola sem prejudicar os objectivos finais da equipa.

O manter jogadores dentro de campo, numa situação quase de ad eternum, compromete o processo de jogo, prejudica a imagem do seleccionador, e só cria um conflito entre diversas partes que não interessa para o projecto de Portugal – criticando ou aceitando a decisão de Rafa, a verdade é que abriu um mundo de rumores de protecionismo de alguns jogadores em detrimento de outros, algo indesejável para uma instituição desportiva.

A ARROGÂNCIA NA COMUNICAÇÃO NÃO PREJUDICA A COMUNHÃO COM TODOS?

Durante algum tempo, os adeptos e comentadores desportivos portugueses exigiram que Fernando Santos fosse mais aberto nas suas comunicações públicas, partilhando comentários em relação a escolhas, estratégias adoptadas e outros pormenores. Todavia, o facto é que quando o seleccionador partilhou algumas ideias e informações nas últimas duas semanas, ficou à vista uma certa arrogância e alguma falta de nexo, prejudicando não só o ambiente fora da selecção nacional, como dentro, algo que surgiu, por exemplo, com a explicação da não chamada de Pedro Gonçalves “Pote”, no qual Fernando Santos disse que o atleta do Sporting CP “está a bater à porta”, quando, na realidade, já esteve dentro da mesma e tem realizado os números mínimos para ser chamado aos trabalhos de Portugal.

A história com Tiago Djaló, que apesar de ter uma dose de honestidade importante (não terá sido o primeiro, nem último, treinador a ter este tipo de esquecimento), revela uma quebra de comunicação, com o staff técnico das Quinas a mostrar um desacerto que não traz paz aos adeptos nacionais, e oferece uma insegurança profunda aos próprios jogadores, com estes a questionar se o seleccionador se lembra da sua existência nos momentos de maior stress de um dado jogo.

Por fim, depois de perderem, novamente, o lugar na Final-Four da Liga das Nações, Fernando Santos não foi capaz de tirar fervura à situação, e acabou por reagir, da pior forma, a uma questão sobre a sua continuidade, apontado para o contrato que detém – até 2024 – como se fosse algum tipo de blindagem anti-despedimento, caso a campanha no Mundial seja um fracasso. O esgar, a postura e o discurso só favorecem a uma animosidade crescente e que está, neste momento, a prejudicar certos jogadores (Cristiano Ronaldo, Pepe, William Carvalho, Bruno Fernandes, Diogo Jota, etc) e a preparação para o Campeonato do Mundo.

Realizámos três questões, existindo muitas mais e que devem ser realizadas de uma forma coerente, justa e séria ao seleccionador nacional, mesmo que este não responda por inteiro ou parcialmente a elas. Fernando Santos, e a própria Federação Portuguesa de Futebol, têm de perceber que todo o bom trabalho realizado, ou até um jogo bem conseguido, pode ser deitado a perder quando se revela falta de estratégia para o plano A funcionar até ao fim, ou conseguir arrancar um plano B de última instância, e que pode gerar não só um distanciamento, como um desprezo por parte dos adeptos portugueses.


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