Razões para a queda: de Sérgio Conceição a Yacine Brahimi

Francisco IsaacAbril 3, 201811min0

Razões para a queda: de Sérgio Conceição a Yacine Brahimi

Francisco IsaacAbril 3, 201811min0
O FC Porto voltou a bater num obstáculo e já está a 1 ponto do SL Benfica... quem são os culpados? Yacine Brahimi é vítima da queda da equipa? Ou responsável também?

O FC Porto perdeu a vantagem de 5 pontos, perdeu a liderança, mas perdeu algo mais importante à passagem da 28ª jornada da Liga NOS: perdeu a confiança no último terço do terreno.

Nem o regressado Soares, nem Aboubakar (não marca desde o jogo contra o SC Braga em Fevereiro, sendo que falhou três jogos por lesão dos últimos oito), nem Paciência (porquê o regresso do português quando estava a dar-se tão bem em Setúbal, para jogar uns parcos minutos no Dragão?), nem o suposto “mágico” Brahimi conseguiram fazer balançar as redes no Estádio do Restelo.

Explicações podem existir muitas para a actual situação dos Dragões, que estão a 1 ponto do rival, sendo que ainda têm de fazer uma viagem à Luz, o momento de Vida ou Morte para o plantel liderado por Sérgio Conceição.

Vamos ser sucintos em algumas delas para tentar perceber o porquê da desaceleração ofensiva de uma equipa que estava a dominar a Liga NOS, aplicando o melhor futebol (que não deixa de ser um futebol algo abaixo da qualidade que existia há alguns anos atrás) das 18 equipas que integram o campeonato nacional.

A ausência de Moussa Marega tem sido pesada nos jogos fora, já que coincidentemente o FC Porto perdeu ambos os últimos encontros fora de portas ante o Paços de Ferreira e CF “Os Belenenses”. Foi notória a falta de algo mais que desse outra capacidade de perfuração e de “destruição” à equipa azul-e-branca, especialmente na velocidade ou no jogo em profundidade.

O avançado do Mali, que conta já com 20 golos no campeonato (mais 5 que Aboubakar e mais 13 que Soares), traz ao jogo “armas” que poucos adeptos acreditavam que alguma vez conseguiria trazer: velocidade, capacidade de rasgo, desgaste nos centrais e laterais, entrosamento com os colegas, insistência nas segundas bolas e e boa capacidade em arranjar soluções na hora de rematar.

Marega não é de todo um jogador formidável, não está ao nível de um Jonas ou Bas Dost (dois atletas já por si muito diferentes, mas que primam na hora de finalizar), mas esta época imbuiu-se de toda uma mística e crença que levou os adeptos portistas a apaixonarem-se por um jogador ridicularizado há duas épocas atrás.

Nos jogos contra equipas pequenas, Marega foi fulcral para desbravar caminho: com o GD Chaves, Estoril-Praia, Vitória FC, Boavista FC ou Rio Ave. São alguns casos da sua preponderância no ataque de Sérgio Conceição. Gostando-se ou não, Marega soma 21 golos e 6 assistências em toda a temporada, algo que ninguém acreditaria antes do início da temporada.

Outra razão pode ter a ver com o aspecto físico e dos jogadores do FC Porto terem mais dificuldades em explodir e surgir mais rápidos ou fortes que os adversários. Não é mentira alguma dizer que foram os Dragões a dominar o jogo do Restelo, com mais ataques, mais remates, mais posse de bola e mais insistência ofensiva.

Todavia, quantidade não significa qualidade, como demonstra o resultado final de 2-0 a favor dos azuis do Restelo. Os azuis-e-brancos pareceram sempre uma equipa sem ideias, perdida nas laterais (inúmeros cruzamentos de Alex Telles, Sérgio Oliveira, Herrera ou Ricardo, na esperança de alguém aparecer para desviar para as redes), com pouca acutilância e poder de fogo na hora de rematar (os remates tanto na Mata Real como no Estádio do Restelo foram na sua maioria fracos em termos de qualidade e potência) e sem que alguém conseguisse ganhar no duelo com os centrais do CF “Os Belenenses”.

A época vai longa e Sérgio Conceição avisou à direcção que “fico satisfeito com o plantel que tenho, mas se vierem reforços não digo que não”, tendo chegado Paciência, Waris, Paulinho e Osório.

Para os defendem que o plantel do FC Porto é curto, é uma ideia falsamente concebida do ponto de vista dos números: os Dragões têm 27 jogadores no plantel (quatro são guarda-redes, fazendo lembrar a altura que o clube da Invicta tinha 5 guarda-redes, na época de Correia, Espinha, Baía, Ovchinnikov e Paulo Santos), enquanto que o SL Benfica tem 26, por exemplo.

Se falarmos em termos de qualidade aí a discussão é outra, mas que também poderá ser algo relativa dependo dos pontos-de-vista que cada um conseguirá apresentar. Exemplo disso, é o caso de Sérgio Oliveira, que poucos acreditavam que alguma vez voltasse a ter a preponderância que conquistou nesta temporada, sendo quase “glorificado” por parte da massa associativa azul-e-branca.

Paulinho parece ter sido um desejo realizado da SAD portista, já que desde o final da temporada passada, existiam rumores do interesse no médio-avançado do Portimonense, quando ainda estava na Ledman Liga Pro. A primeira boa volta do brasileiro convenceu a direcção a apostar num empréstimo-compra (de forma a “enganar” as regras do Fair Play da UEFA), dando a Sérgio Conceição uma arma para o ataque.

Osório e Waris parecem ter sido escolhidos a dedo pelo treinador do FC Porto, baseando a nossa premissa nestes argumentos: Osório encaixa-se no perfil de jogador que Conceição gosta (possante, forte fisicamente, decidido nas bolas altas e agressivo no 1 para 1, isto quando jogava no Tondela) e entrava assim para dar outra solução para o centro da defesa.

Por outro lado, Waris tinha se cruzado com o timoneiro dos azuis-e-brancos na temporada passada, conhecendo bem alguns dos atributos que fizeram do ganês um dos bons jogadores do Lorient (não evitou a descida do clube).

Infelizmente, todos os reforços têm se revelado uma autêntica desilusão (ao jeito da maioria dos últimos, desde Óliver, Depoitre, Boly ou Suk por exemplo, sendo que todos juntos dão um valor de despesa de quase 35M€) e não deram a resposta esperada em momentos cruciais da época.

Em suma, a parte física tem mais a ver com a exigência de jogo e estratégia de Sérgio Conceição do que com que com as limitações do plantel. Por vezes, o segredo para desbloquear jogos não passa por correr muito, pressionar desenfreadamente ou manter um ritmo alto durante a maior parte do jogo, mas deve passar pela inteligência de jogo e boas combinações entre as personagens principais.

Outro factor vai para as escolhas de Conceição, que voltou a aplicar Maxi num jogo de alta intensidade, quando o Uruguaio já mal participa no ataque e apresenta sérias lacunas na defesa. Diogo Dalot, que estava a jogar na esquerda com uma qualidade exibicional surpreendente, não poderia ter sido o escolhido para o jogo frente ao CF “Os Belenenses”?

E porque não colocar Otávio a titular, tirando Herrera de modo a que o mexicano recuperasse devidamente? Ou porque não meter o brasileiro no lugar de Soares ou Aboubakar, construindo o 4x3x3 que tem dado tão bons resultados? A verdade é que Herrera pareceu jogar a 50% das suas capacidades e Soares mal conseguia arrancar com velocidade para a bola.

Finalmente, outro factor que tem sido decisivo para a queda significativa para o FC Porto é o desaparecimento de Yacine Brahimi. O argelino ou aparece em grande, fazendo um jogo daqueles endiabrados, conquistando boas linhas de ataque, fugindo para a quina da área para depois dar o tal drible típico que acaba em remate cruzado ou numa assistência para quem vem de trás… ou faz um jogo de sucessivas perdas de bola, de insistências em jogadas mal concebidas e desenhadas ou em passes mal esboçados em que só o criativo é que imaginou algo que nunca lá esteve.

Em Paços de Ferreira, Brahimi perdeu cerca de 5 bolas em jogadas de insistência de drible que ficam nos pés dos centrais ou acabam fora de campo. 17 passes falhados, zero remates, 3 dribles ganhos e 2 bolas recuperadas, números tão pobres para um jogador que nos jogos em casa se agiganta. A coroar a exibição, Brahimi falhou um penalti que estava destinado a Sérgio Oliveira, naquilo que pode ser compreendido como um dos erros fatais de Conceição em toda a temporada.

No jogo em casa com o Boavista, Brahimi voltou a ter uma exibição pouco expedita para o que se exige de um ala criativo e que tem tanta magia nos pés: 6 bolas perdidas, 11 dribles ganhos, zero passes para finalização, zero remates, duas recuperações de bola e pouco mais. Aboubakar voltou a ficar a zeros em termos de golos e talvez se explique um pouco por aqui.

Chegamos ao jogo do Restelo e Brahimi é decididamente o jogador mais inconformado da equipa do FC Porto, com bons números: 7 dribles ganhos em 11 tentativas, 5 remates (todos ao lado ou mal direccionados), 15 recuperações de bola (cinco foram respostas a bolas perdidas pelo próprio argelino) e 2 passes para finalização (ambos para zonas onde não estava ninguém).

Ou seja, o argelino apareceu muito, tentou ter a bola no pé mas não foi clarividente o suficiente para dar a resposta que a equipa precisava. Acima de tudo, parecia querer jogar sozinho e assumir toda a importância do jogo em si, não se preocupando em jogar dentro do colectivo.

Esta foi uma etiqueta que se colou a Yacine Brahimi durante as épocas de Julen Lopetegui ou Nuno Espírito Santo, treinadores que entregaram o ataque do FC Porto ao argelino e às suas capacidades, rendendo o colectivo ao virtuosismo do individualismo de um jogador com uma genialidade nos pés incomum (NES demorou mais tempo a colocar o argelino em campo que o espanhol).

A genialidade não pode ser argumento para permitir que um jogador se perca na sua própria fantasia, pelo contrário, é necessário que essa criatividade funcione ao serviço da equipa, como Brahimi já o conseguiu fazer em certos momentos da temporada. Mas na hora das grandes decisões, pressionado pelo sonho de sair para um campeonato de um patamar superior, o argelino esquece-se que está no Dragão para servir o clube e não se servir a si mesmo.

Uma comparação que pode ser ou não ineficaz ou excessivamente dramática, surge se olharmos para os números do jogador do SL Benfica que mais se aproxima ao argelino: Eduardo “Toto” Salvio. O argentino leva 7 golos marcados e 5 assistências na equipa da Luz, ao jeito que Brahimi leva os mesmos golos mas só mais duas assistências.

Este é só o registo em números e só por si eles podem dizer muito pouco, pois Brahimi tem uma maior e mais positiva participação ofensiva que Salvio, muito pelo facto do argentino já não ter os melhores argumentos em termos físicos (constantes pequenas lesões). Mas a verdade é que os adeptos do FC Porto glorificaram um jogador com números tão parcos que fazem de Deco, Hulk, James Rodriguez parecer mitos da História do FC Porto.

A queda acentuada de qualidade de jogo dos portistas explica-se pelo “fim” do BAM, o trio que estava a ter dos melhores números a nível europeu… Brahimi deixou de ser decisivo, Aboubakar deixou de marcar golos e de ser preponderante no ataque e Marega está há três jogos no estaleiro, com a lesão da Vitamina-Soares a ser também um percalço nas contas de Sérgio Conceição.

Segue-se a luta pelos 18 pontos finais, no qual o FC Porto só depende de si para ser campeão… mas uma equipa que sucumbe na Mata Real, Restelo, deixa-se empatar na Vila das Aves e em Moreira de Cónegos, terá argumentos para ganhar na Luz ou Barreiros, no momento descendente da temporada?

Para o futuro de Yacine Brahimi este final de época é decisivo para a sua carreira, já que conta com 28 anos, não vai ao Mundial, perdeu a montra da Champions League (pareceu um jogador vulgar contra o Liverpool) e pode voltar a não conquistar qualquer título na sua 4ª época de Dragão ao peito. Um génio com uns pés diabólicos mas com uma mentalidade de juvenil? Ou um jogador que teve azar com os colegas que lhe surgiram no campo?


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