Bruno Lage: a escolha possível de Rui Costa

Ricardo LopesSetembro 15, 20247min0

Bruno Lage: a escolha possível de Rui Costa

Ricardo LopesSetembro 15, 20247min0
Rei morto, rei posto, ou, neste caso, regresso a um rei que foi despedido no passado. O que significa o regresso de Bruno Lage ao SL Benfica?

O Benfica decidiu despedir Roger Schmidt ao fim de quatro jornadas de campeonato, onde conquistou duas vitórias, um empate e uma derrota. O alemão passou de herói a vilão na Luz, num curto espaço de tempo. Na sua primeira temporada por Lisboa, especialmente na primeira metade, quando ainda existia Enzo Fernández no meio campo encarnado, o técnico era tremendamente elogiado, e os adeptos eram embalados pelo seu chavão à chegada: «Quem ama o futebol ama o Benfica».  A frase, com a missão clara de seduzir os aficionados, até ‘deu trabalho’ à equipa de marketing. No entanto, tudo foi sol de pouca dura.

Roger Schmidt conquistou a Primeira Liga 2022/23 e Rui Costa quis compensar o seu bom trabalho, com um novo contrato válido até ao final de 2025/26 (ainda em maro de 2023). Nada melhor que um vínculo de longa duração para demonstrar confiança nos resultados apresentados. Ninguém diria que nos meses seguintes a situação seria completamente distinta. Durante 2023/24, Roger Schmidt perdeu completamente o balneário e o apoio das bancadas, sendo enxovalhado semanalmente, mesmo quando o Benfica ganhava os desafios. João Neves foi o grande destaque da época e mereceu total confiança do germânico, o grande responsável pelo seu crescimento.

Os pedidos de um despedimento eram constantes, mas a cláusula de compensação tornava a saída de Roger Schmidt inviável. Rui Costa também detinha confiança na equipa técnica. Mesmo com o segundo lugar em 2023/24, Roger Schmidt voltou a manter-se e a preparar a temporada seguinte, embora contasse com menos influências, algo que se verificou nos reforços que chegaram. Contudo, até em pré-época sentia-se que o alemão era um corpo a mais e que não era a peça indicada para o projeto, aos olhos dos adeptos. Assobios e insultos mantiveram a sua presença e tudo agudizou após a derrota com o Famalicão, na primeira jornada.

Rui Costa não podia demitir um treinador logo na primeira semana, algo que Luís Filipe Viera fez com Fernando Santos. Seria matar a época quando a mesma havia começado. Um plantel teria que fazer uma temporada completa com uma equipa técnica que não os treinou na pré-temporada. Teria que haver uma habituação a novas rotinas e falamos de um candidato ao título, não em relação a um clube que luta pela manutenção. Possivelmente foi isto que passou na cabeça de Rui Costa, além dos zeros da indemnização que teria que pagar. A verdade é que Roger Schmidt aguentou apenas mais uns dias e em Moreira de Cónegos tudo desabou, já que não havia volta a dar (em maio existia a esperança que o verão trouxesse um novo ponto de situação, como uma relação à qual se dá uma nova oportunidade).

Roger Schmidt tem quota parte de culpa. Destruiu o balneário, mantendo jogadores no 11 de forma inexplicável (a saída de David Neres justifica-se de forma notória pela manutenção de Ángel Di María). Os laços afetuosos com os adeptos foram nulos a partir da primeira época. A sua relação com a imprensa terá sido a pior em Portugal nos últimos anos, embora a assessoria tenha parte da responsabilidade. Não se esforçou para aprender português, dava respostas sem qualquer sentido e em certos momentos aparentava ter visto um jogo completamente distinto ao que de facto aconteceu.

Se a sua saída mereceu os aplausos dos aficionados, os mesmos foram curtos. Estamos a falar do Benfica, um clube exigente e que por vezes se crê num estrato um pouco mais acima daquele em que realmente está. Rui Costa já estava a ser questionado e passou a ser a única figura contestada, já que Roger Schmidt estava a fazer as malas para se ir embora. O antigo internacional português sabia que este momento era fundamental para o clube e para si próprio, já que há eleições em outubro de 2025.

Rui Costa poderia pensar de uma de duas maneiras. Contratar um nome importante e manter tudo como está até ao final do ano. Ou então, fechar com alguém ‘menor’, de modo a começar um novo projeto, que teria o seu verdadeiro apito inicial no mercado de janeiro. Possivelmente esta última ideia levará o leitor a pensar que 2024/25 seria uma época ‘deitada ao lixo’. A verdade é que sim, mas se ainda não reparou, o Benfica é ‘uma casa a arder’, desesperando por novos protagonistas, que sejam mais baratos, de preferência.

O relatório apresentado no dia 8 de setembro exibiu quão mau está o clube da Luz. Porém, voltando ao que interessa, Rui Costa optou pela primeira via, procurando um nome importante, de peso. Levou imensas negas durante o processo. Afinal, quem quer pegar num clube (por mais importante que o mesmo seja), em que o presidente está contra as cordas e o plantel foi montado para outra equipa técnica e possivelmente outro estilo de jogo? Num processo realizado em tempo recorde, a direção teve que encontrar um nome mais realista, que puxasse ao coração.

Bruno Lage acabou por ser o eleito, assinando contrato por dois anos. Depois de se falar em Allegri ou Mancini (que já passaram o seu pico há algum tempo), o nome do português fica um pouco curto. As justificações foram simples: conhece a casa e sabe o que é ganhar pelo Benfica. Bruno Lage até começou por trabalhar a sua relação com a imprensa desde o primeiro minuto, cumprimentando os jornalistas que foram ao Seixal que foram cobrir a sua (tímida) apresentação:

«Há pouco tempo tive oportunidade de falar com colegas vossos [jornalistas] sobre o que foi a minha primeira passagem no Benfica, fiquei com a sensação que a história não podia acabar daquela maneira e quis o destino que, ao dia de hoje, na situação que o Benfica vive, eu pudesse estar disponível para regressar a esta casa. Sinto uma vontade enorme de trazer o sentimento de ser benfiquista, é o que sinto quando estou a falar com as pessoas. Que não conseguem descrever o que é ser Benfica, mas conseguem sentir. Quase como o sistema nervoso que percorre o nosso corpo. É essa chama que temos de trazer para cá e dar energia positiva aos jogadores. Independentemente do momento, é pelo Benfica que temos de nos unir para voltarmos a fazer um trabalho que vai ser diário, de muito sacrifício, mas acredito que, com a união de todos, podemos chegar ao fim com sucesso», afirmou, assumindo que união é de facto a palavra chave.

No entanto, se consideramos que o Benfica está num momento delicado, Bruno Lage vive exatamente o mesmo. Após ter perdido a Primeira Liga 2019/20 para o FC Porto de Sérgio Conceição, quando contou com uma vantagem absurda a meio do campeonato, o setubalense passou pelo Wolverhampton, onde fez uma época aceitável e em seguida acabou demitido e foi um dos responsáveis máximos pela perca do título do Brasileirão por parte do Botafogo. Em 2023, eleito para substituir Luís Castro, conquistou apenas quatro vitórias em 15 partidas. Caso não alcance o sucesso no Benfica, terá que baixar um patamar, algo que Roger Schmidt também fará. Bruno Lage foi a escolha possível, porque era ‘o menos mau de todos’, sendo que isto não significa que não tenha qualidade ou que não possa ser campeão.

Rui Costa e Bruno Lage passam a ser duas personagens a andarem de braço dado. O futuro do dirigente, está nas mãos do treinador. O futuro do técnico, passará a estar dependente da equipa que lhe foi fornecida pela direção. O Benfica atravessa um período negativo e pode dar aqui a volta a situação. Necessita é que todos remem para o mesmo lado e se apoiem, numa altura em que qualquer derrota contra qualquer equipa terá como consequência uma assobiadela monumental da Luz.

Roger Schmidt passou a ser um fantasma, mas a culpa do Benfica estar um caos não é apenas dele. 2024/25 vai-nos mostrar quem era o verdadeiro antagonista, com um antigo ‘maestro’ a ser o principal candidato a esse posto.


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