Quadro tático da LaLiga: como joga o CA Osasuna

Bruno DiasDezembro 15, 20227min0

Quadro tático da LaLiga: como joga o CA Osasuna

Bruno DiasDezembro 15, 20227min0
De Pamplona, principal cidade da região de Navarra, chega-nos uma das boas surpresas colectivas da LaLiga 2022/23.

Na era do “futebol-negócio”, dizer que um clube pertence aos seus sócios e adeptos começa a ser cada vez mais invulgar. No topo do futebol espanhol, de resto, este tem deixado de ser o caso para a grande maioria dos clubes ao longo dos últimos anos.

Neste momento, sobram apenas quatro emblemas nessa situação: os “colossos” Real Madrid e FC Barcelona e o ultra-regionalista Athletic, marcado veementemente pela sua ligação ao País Basco.

O quarto emblema é igualmente histórico na sua fundação, embora não acompanhe os restantes ao nível das glórias conquistadas. De dimensão mais modesta, o CA Osasuna tem procurado estabelecer um lugar habitual na LaLiga em anos recentes, fazendo da luta pela manutenção o seu principal objectivo, época após época.

Porém, a temporada 2022/23 está a revelar-se acima das expectativas, e os “rojillos chegam à época natalícia com um lugar bem mais tranquilo na tabela do que aquele que seria de esperar. Liderados pelo técnico espanhol Jagoba Arrasate, de 44 anos, ocupam neste momento o lugar, com 23 pontos em 14 jornadas, encontrando-se a apenas um único ponto dos lugares de acesso à Champions League.

Números muito positivos para um clube que vive com recursos financeiros limitados e que aposta claramente no talento local e nacional (no plantel actual há apenas dois jogadores que não possuem nacionalidade espanhola). Este espírito de maximização de recursos estende-se também à forma colectiva, altruísta e determinada como o Osasuna se apresenta em campo, e foram estas características que conduziram a formação da região de Navarra de regresso ao escalão máximo do futebol espanhol em 2019, já com Arrasate ao comando da equipa.

Um todo que vale mais do que a soma das suas partes.

(Foto: lared1061.com)

 

Taticamente falando: o 4x4x2 de Arrasate

A cumprir a sua quinta temporada aos comandos do Osasuna, o técnico espanhol enquadra-se quase na perfeição no espírito robusto e resiliente do clube, e o futebol apresentado dentro das quatro linhas reflecte essa forma de estar no jogo.

Normalmente a partir de um 4x4x2 (mas utilizando também, ocasionalmente, uma linha de cinco defesas), Arrasate procura que a sua equipa ataque de forma vertical, numa óptica que conjuga duas ideias-base: ferir o seu oponente em ataques rápidos e assegurar um equilíbrio e solidez defensiva em todos os momentos do jogo. É a partir desses princípios que o Osasuna sobrecarrega rapidamente os corredores laterais (sobretudo o esquerdo), procurando superioridade numérica que lhes permita colocar bolas na área adversária, onde se encontram sempre três ou até mesmo quatro elementos para tentar finalizar. Mais do que a qualidade ou até a diversidade das suas acções ofensivas, ambicionam ter volume nas oportunidades de que dispõem para visar a baliza.

Eficazes nos duelos individuais, procuram manter um bloco compacto e relativamente recuado em momentos defensivos. É verdade que, até pela forma como atacam, os “rojillos” reagem rapidamente e com vários elementos à perda da bola em terrenos mais adiantados mas, quando não a recuperam nos primeiros segundos, optam por uma abordagem mais conservadora, organizando-se novamente e jogando na expectativa daquilo que o adversário possa fazer em posse.

A entreajuda é constante e os espaços para se jogar na zona central são escassos e encontram-se congestionados pelo número de jogadores que aí concentram. Os alas tendem a dedicar especial atenção ao reforço dessa zona, um dos avançados recua para procurar condicionar o construtor de jogo adversário (normalmente, o médio que vem buscar jogo e joga mais frequentemente por fora do bloco defensivo) e deixam apenas um avançado como referência única para saídas rápidas para o ataque. Com isto, o Osasuna procura canalizar o jogo para os corredores laterais e aí sufocar progressivamente o portador da bola até forçar o erro.

Rotinas consolidadas, que resultam num conjunto cada vez mais oleado e que tem colhido os frutos desse trabalho.

 

A figura: “Chimy” Ávila

O principal destaque deste Osasuna é alguém de quem já falamos anteriormente.

3 anos depois, Ezequiel “Chimy” Ávila continua fiel ao jogador aguerrido e vertical que descrevemos em 2019, encontrando-se agora em pleno pico das suas capacidades. Recuperado de uma grave lesão, que o deixou de fora dos relvados durante mais de um ano, tem demonstrado que os dias negros ficaram definitivamente para trás com um rendimento muito elevado dentro das quatro linhas.

Na LaLiga 2022/23, conta já com 6 golos em 13 jogos, assumindo-se como o melhor marcador da equipa e tendo uma importância fulcral no excelente percurso que o Osasuna realizou até ao momento.

Principalmente pela sua velocidade e capacidade de desequilíbrio em drible, tem actuado mais vezes a partir dos flancos no 4x4x2, alternando durante as partidas entre o corredor direito (onde normalmente inicia o jogo) e o esquerdo. Em ambos, Arrasate confia no argentino para assumir a iniciativa individual, ganhar o duelo com o seu adversário directo e servir a dupla de avançados ou procurar ele próprio visar a baliza, graças à sua facilidade de remate acima da média.

Dotado de uma elevada qualidade técnica, o seu “poder de fogo” é mesmo a sua principal característica distintiva. Porém, o argentino tem desenvolvido a forma como utiliza esse recurso, demonstrando evolução no momento da tomada de decisão, cometendo menos erros em posse e perdendo menos bolas no plano ofensivo. Um salto de qualidade na leitura de jogo e no seu comportamento em campo que, de resto, fazem do avançado de 28 anos um melhor jogador em termos globais, por comparação ao futebolista de há 3 anos.

Também no plano defensivo, Ávila cresceu exponencialmente ao longo deste período, trabalhando arduamente na reacção à perda da bola para criar dificuldades aos seus oponentes. Necessita ainda de moderar o seu temperamento em algumas abordagens mais agressivas, que por vezes o podem colocar em problemas disciplinares. Porém, essa é uma característica intrínseca ao próprio perfil combativo do avançado, que não consegue deixar de olhar para todas as disputas de bola como se fossem as últimas.

Sempre ligado à corrente, assume cada vez mais um papel de liderança por exemplo dentro de campo, e a combinação do seu recorte técnico com a sua intensidade máxima contagia positivamente os seus companheiros.

O protagonista individual de uma equipa que trabalha para brilhar colectivamente.

Num clube tradicionalmente modesto e sem ambições desportivas desmedidas, Jagoba Arrasate e a sua equipa vão trilhando um caminho positivo e tranquilo na LaLiga 2022/23. Um trabalho de alguns anos, cada vez mais rotinado e capaz de alcançar bons resultados de forma consistente. Este Osasuna pode passar com facilidade debaixo dos radares, mas apresenta-se actualmente como uma das boas equipas deste campeonato espanhol.


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