Walter Torre: o legado da construtora WTorre no futebol de um país

Marcial CortezDezembro 14, 20207min0

Walter Torre: o legado da construtora WTorre no futebol de um país

Marcial CortezDezembro 14, 20207min0
A morte do empresário Walter Torre, aos 64 anos, deixa um legado para o futebol brasileiro: o Allianz Parque mudou a vida do Palmeiras.

No último dia 11, faleceu em São Paulo aos 64 anos o empresário Walter Torre, dono da construtora WTorre, uma das mais famosas do Brasil. A Wtorre construiu inúmeros prédios e empreendimentos, entre eles o complexo do Shopping JK e o Allianz Parque, casa do Palmeiras e peça fundamental no renascimento do clube para o futebol brasileiro.

Walter Torre fundou a WTorre em 1981, logo após se formar em Engenharia Civil. A empresa foi crescendo e aproveitou o boom imobiliário ocorrido no Brasil nas duas primeiras décadas do Século XXI. Em 2008 a WTorre iniciou intensas negociações com a diretoria do Palmeiras, e o acordo para a construção do que seria o futuro Allianz Parque fechou em meados de 2009. A construção do novo estádio do Palmeiras iniciou em 2010.

Vista do antigo Palestra Itália em 2011, durante demolição parcial para construção do Allianz Parque. (Foto: Mark Hillary)

Por quatro anos, o alviverde mandou seus jogos em diferentes estádios, como Pacaembu, Canindé, Arena Barueri e outros pelo interior do Estado de São Paulo. Isso causou um prejuízo financeiro e futebolístico ao clube, que nesse período amargou uma queda para a Série B em 2012 e quase uma segunda queda, já depois da inauguração do Allianz, em 2014. Mesmo com todas essas dificuldades, a equipa ainda conseguiu ganhar o título da Copa do Brasil de 2012 e a Taça da Série B em 2013.

E enquanto o Palmeiras sofria, a Construtora WTorre se empenhava na construção da melhor arena multiuso do hemisfério sul. O Allianz Parque segue rigorosamente o padrão FIFA e é preparado para receber não só o desporto-rei, mas também shows musicais e reuniões corporativas. A multinacional de seguros Allianz fechou o contrato de naming rights com o Palmeiras e com a WTorre ainda durante a construção, em 2013.

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Assim, o nome WTorre se tornou conhecido entre os adeptos não só do Palmeiras, mas de todas as equipas do futebol brasileiro. No final de 2014, a inauguração oficial contou com a partida entre Palmeiras e Sport, vencida pela equipa nordestina pelo placar de 2 a 0. O jogador Ananias foi o autor do primeiro gol no Allianz Parque, o que rendeu por um tempo o apelido pejorativo de “Ananias Parque” por parte dos rivais alviverdes.

Mas o apelido durou pouco. Em 2015 o Palmeiras renasceu para o futebol brasileiro. Chegou à final do Campeonato Paulista contra o Santos e perdeu o título no jogo final realizado na Vila Belmiro. Mas ali o Palmeiras já mostrava a força de sua arena. No segundo semestre, o Verdão ganhou seu primeiro título na nova casa. Campeão da Copa do Brasil sobre o mesmo Santos. E dessa vez a festa foi em casa. O Allianz Parque viu sua primeira volta olímpica.

Fernando Prass comemora o primeiro de muitos títulos no Allianz Parque. Foto: Friedemann Vogel/Getty Images

Apesar do bom momento, nem tudo eram flores na relação entre WTorre e Palmeiras, como diria o pensador Khalil Gibran. O presidente Paulo Nobre e Walter Torre tinham muitos desentendimentos, especialmente no tocante às demais obras que a WTorre não construiu no clube, além de uma questão jurídica acerca do direito sobre as cadeiras do estádio. O caso foi parar num processo de arbitragem na Justiça, que se arrastou por alguns anos antes de definirem todas estas questões.

Música e futebol, futebol e música…

Além do relvado, o Allianz Parque se tornou uma das principais, ou talvez a principal, casa de shows do país. Bandas e cantores de repercussão internacional se apresentavam por lá, entre eles “Sir” Paul McCartney, Rod Stewart, Ariana Grande, Maroon 5, Coldplay e Andrea Bocelli, entre outros grandes nomes da música. Nos tempos pré-pandemia, cena comum era ver adolescentes acampados à porta do estádio, muitas vezes meses antes do show de suas bandas favoritas.

Show da banda Coldplay no Allianz Parque. Danos ao relvado foram resolvidos com a implantação do relvado sintético em 2020. (Foto Fellipe Lucena)

No campo, o Palmeiras renascia. Campeão da Copa do Brasil em 2015, o Verdão emplacou uma campanha sensacional no Brasileirão de 2016 que o levou ao título da competição, o segundo em dois anos de estádio novo. O sucesso nos gramados não refletia a relação entre clube e construtora, que continuava abalada. Questões jurídicas como a construção do Museu do Palmeiras se arrastavam na Justiça, longe de serem resolvidas.

O ano de 2017 trouxe mudanças no comando do clube. Com a eleição de Maurício Galiotte para a presidência do Palmeiras, a relação com Walter Torre foi estreitada e algumas questões começaram a ser resolvidas. O Palmeiras reclamava do uso excessivo da Arena para shows, a prejudicar o time que precisava recorrer a outros estádios para mandar seus jogos, além de prejuízo no relvado, que sofria demasiado com a realização destes megashows.

Pelo contrato entre Palmeiras e WTorre, a construtora ficou responsável pela construção e manutenção da Arena, tendo como contrapartida a arrecadação dos shows e eventos, cujo repasse ao Palmeiras segue uma tabela progressiva com aumento da alíquota a cada cinco anos. As rendas dos jogos de futebol ficam somente com o clube.

Em 2018, mais uma volta olímpica no Allianz Parque – dessa vez o Brasileirão, título que colocou definitivamente o Palmeiras no topo do ranking da CBF, posição que o clube ocupa até hoje. Com uma média de público (antes da pandemia) de cerca de 30 mil leais adeptos e arrecadações em torno de 1,8 milhões de reais por partida, o estádio construído pela WTorre mostrou ser peça fundamental no sucesso da equipa alviverde.

Porém, mais uma vez a realização constante de shows prejudicou o Palmeiras em 2019. Nas quartas de final contra o Grêmio em partida válida pela Libertadores, o Palmeiras foi eliminado no estádio do Pacaembu. A eliminação intensificou as negociações sobre o tema relvado sintético, que pode ser rapidamente reaproveitado para partidas de futebol.

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O acordo saiu e em 2020 temos o Verdão a disputar suas partidas em relvado sintético, que não sofre durante os eventos não futebolísticos realizados na Arena. Assim, o número de partidas realizadas no Allianz aumentou consideravelmente. Como consequência, o Palmeiras joga sempre em casa, o que ajudou muito na conquista do Paulistão de 2020, e segue vivo nas três competições que disputa (Brasileirão, Copa do Brasil e Libertadores).

Por outro lado, a WTorre segue com seus grandes empreendimentos. Há uma negociação em andamento para a reforma completa do estádio da Vila Belmiro, que pertence ao Santos. Ainda não houve acordo, mas as negociações seguem firmes. Mesmo com a morte de Walter Torre, os seus sucessores na Construtora Wtorre certamente irão analisar os prós e os contras dessa reforma.

Sim, há muitos adeptos (e eu sou um deles) saudosos do antigo Estádio Palestra Itália. Mas o mundo caminha pra frente e a História se constrói a cada dia que passa. O Allianz era um sonho, tornou-se um projeto, hoje é um estádio real onde a torcida do Palmeiras se sente em casa.

Descanse em paz, Walter Torre. Seu legado ficará para sempre no coração e na memória de cada um dos 18 milhões de adeptos pelo mundo afora. Você certamente fez a diferença nesse mundo.

Projeto Vila Belmiro. Foto Reprodução

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