A volta ao passado: diário de um palmeirense no Morumbi
No último sábado, o clássico entre Palmeiras e Santos, com mando da primeira equipa, foi disputado na casa do São Paulo, o bom e velho estádio do Morumbi. Foi um acordo entre as equipas, de uso mútuo de suas arenas por motivos de força maior. No caso em questão, um show no Allianz Parque justificou a migração da torcida alviverde para a casa do São Paulo
Ao contrário do que poderia parecer, tudo transcorreu normalmente. A torcida compareceu em peso e cerca de 50 mil adeptos puderam acompanhar a vitória do Verdão por 3-1, em jogo válido pela primeira fase do Campeonato Paulista. Grande parte destes 50 mil torcedores pisaram no Morumbi pela primeira vez em suas vidas. Para outros, o jogo representou uma carinhosa volta ao passado.
O Estádio Cícero Pompeu de Toledo (nome oficial) foi inaugurado em 1960. Por conta do seu gigantesco tamanho, por muitos anos foi o único estádio da Capital em condições de receber grandes torcidas, e assim os clássicos eram sempre disputados no estádio. Todas as principais equipas do Estado tem histórias de memoráveis jogos, vitórias e títulos na casa do Tricolor.
Corinthians, o inesquecível título de 1977
Em 13 de outubro de 1977, o Corinthians vinha de um jejum interminável de títulos que ja durava 23 anos. A última conquista do Timão havia sido no ano do IV Centenário da Cidade de São Paulo. Naquela época, decidiu-se o Paulista numa melhor de 3 jogos, todos eles realizados no Morumbi. O Corinthians venceu o primeiro confronto com a Ponte Preta pelo placar de 1-0. Na segunda partida, vitória da equipa campineira por 2-1, com público de quase 140 mil pessoas, o recorde do estádio até os dias de hoje. Sobrou para o terceiro confronto, no qual Basílio entrou pra História do Timão ao fazer o único gol da partida e trazer o Caneco para o Parque São Jorge, 23 anos depois.
Palmeiras em 1993
Em 1993 foi a vez do Palmeiras sair do jejum de 17 anos sem levantar uma Taça sequer. O time comandado pelo entẽo jovem técnico Vanderlei Luxemburgo fez uma campanha fantástica e chegou a final contra o arquirrival Corinthians com amplo favoritismo. Após uma derrota na primeira partida pelo placar 1-0, o avançado Viola comemorou o gol a imitar um porco, animal que simboliza o Palmeiras. No jogo da segunda mão, 104 mil pessoas viram uma sonora vitória do Alviverde por 4-0, o que colocou fim à fila e ao jejum de títulos. Pra consolidar o sucesso, seis meses depois cerca de 90 mil adeptos assistiram a uma nova conquista no Morumbi, desta vez contra o Vitória por 2-0, que trouxe o título brasileiro ao Verdão. Um Paulista e um Brasileirão no mesmo ano, ambos ganhos na casa do Tricolor Paulista.
Santos em 2002
O Santos também já comemorou alguns feitos no Morumbi. Em 2002, Robinho, Diego e uma turma de miúdos que depois ficaram famosos, sob o comando de Emerson Leão, levantou o título de Campeão Brasileiro ao derrotar o Corinthians por 3-2 no jogo derradeiro, testemunhado por cerca de 75 mil pessoas. O Peixe já tinha vantagem por ter ganho o jogo da primeira mão, também no mesmo Morumbi, pelo placar de 2-0.
E os donos da casa?
Obviamente, o número de conquistas do Tricolor em seus domínios é imenso. Mas a partida que parece ser unanimidade entre os adeptos do São Paulo é a final da Libertadores de 2005, contra o Atlético Paranaense (atual Athletico). O Tricolor havia empatado a primeira partida e precisava vencer pra garantir a Glória Eterna. E foi uma apresentação de gala: o São Paulo massacrou o Atlético sob o olhar de pouco mais de 70 mil pessoas. Foi a terceira Libertadores da História do Tricolor. Um jogo a ser comentado para sempre e passado de pai pra filho e de filho pra neto.
Saudades de um tempo que não volta mais
Mas voltemos à época atual. O Morumbi continua o mesmo: gigante, impávido, imponente. A diferença entre os dias atuais e os saudosos anos do passado não está no estádio. Está nas atitudes. A rivalidade hoje é muito mais tóxica do que nos tempos de outrora, quando duas torcidas literalmente disputavam o espaço cadeira a cadeira, e cada ganho de território nas arquibancadas era comemorado como se fora um gol da equipa amada.
Nas tribunas do Morumbi, o estádio treme. Literalmente. Deu saudade do barulho da arquibancada nos momentos que antecedem as olas. O efeito de mais de 50 mil adeptos a baterem seus pés no chão cria um clima de terremoto, como se uma força da natureza invadisse a torcida e essa energia toda fosse canalizada para potencializar o time.
O estádio está muito bem conservado e o gramado impecável. Além disso, o acesso hoje em dia é muito mais fácil com a estação de comboio da linha amarela, que passa perto da arena. É gostoso caminhar naquele mar de gente a fazer o caminho da estação até o palco da partida, acompanhado pelo perfume inconfundível dos deliciosos sanduíches de rua vendidos neste caminho.
Voltar ao Morumbi foi uma experiência antropológica. Um filme passa pela cabeça. Legalmente, o estádio pertence ao São Paulo. Mas emocionalmente ele está no coração de todas as torcidas paulistas. Parabéns ao São Paulo por manter tão conservado este verdadeiro patrimônio do futebol paulista.