Não, o futebol não está acima da sociedade

João Pedro SundfeldJunho 22, 20214min0

Não, o futebol não está acima da sociedade

João Pedro SundfeldJunho 22, 20214min0
Jogadores em festas clandestinas, pressão por volta de público e manutenção de campeonatos desnecessários: a crise humanitária no futebol brasileiro

O mundo foi atacado, (quase) simultaneamente, pela pandemia da Covid-19. À princípio, os países foram pegos de surpresa, mas, com o passar do tempo, a doença tornou-se algo conhecido e evitável. Máscara, álcool gel, vacina e distanciamento. DISTANCIAMENTO! Evitar aglomerações para se proteger, mas, acima de tudo, proteger aos outros. No Brasil, porém, o evitável segue matando mais de 2 mil pessoas diariamente. Com isso, esperamos que, aqueles que têm o privilégio de não aglomerar – como os jogadores de futebol – e, assim, podem ajudar a conter o avanço do extremamente disseminado vírus, contribuam para esta causa humanitária. Afinal, já são mais de 500 mil vidas interrompidas.

Alguns, porém, pouco se importam. Se envolvem em privilégios e entendem viver acima da  sociedade. Se juntam em casas de shows e dizem que foram à restaurantes. Fazem festas e, meses depois, criticam os que quebram os protocolos sanitários.

Isso tudo ocorre no Palmeiras. Time exemplar no quesito humanidade. Quando o futebol não podia acontecer no país, diminuiu o salário dos atletas para não demitir aqueles que vivem com menos. Nunca brigou por volta de público ou do próprio esporte, mesmo passando por dificuldades financeiras. Foi perfeito.

A postura irretocável da diretoria, porém, cai por terra por ações dos jogadores do clube. Ramires, que atuou no clube até os meses finais de 2020, deixou o clube pouco depois de ser execrado pela torcida ao ser flagrado numa festa clandestina. Recentemente, mais dois foram vistos em situações similares.

Antes disso, Luiz Adriano testou positivo para o vírus. Foi para casa para não sair em dez dias – dado que poderia (claramente) infectar outros e, inclusive, ser responsável por mortes ou sequelas. Ele, porém, pouco quis saber. Foi ao mercado acompanhado da mãe, e foi descoberto, pois, nessa ‘saidinha’, atropelou um ciclista. Mais um multado pelo clube.

Meses depois, o Palmeiras sofreu um grande baque. Edson Silva, podólogo, e Cristiano Oliveira, segurança, faleceram em decorrência da doença. Profissionais que passaram anos defendendo, e honrando, o verde e branco. Mesmo assim, atitudes irresponsáveis (e desumanas) continuaram a acontecer.

O luto por duas vidas perdidas não acabou, e atletas foram, novamente, pegos em aglomerações. O primeiro foi Lucas Lima, médio que vive péssima fase. Avistado a sair de um restaurante depois do horário permitido pela lei (21h – de Brasília), foi repreendido fortemente pelo clube. Afastado por tempo indeterminado, além de ser multado em 40% do salário. Punição igual foi dada ao jogador Patrick de Paula, flagrado dias depois em situação semelhante.

Todos privilegiados – Patrick e Lucas inclusive vacinados por serem jogadores, privilégio puro – que ignoram o coletivo e entendem poder tudo, no país com a pior administração pandêmica do mundo.

E não são casos isolados. É recorrente. É projeto.

Gabigol em cassino ilegal. Maicom Jesus, da Portuguesa, afastado por descumprir o protocolo sanitário do clube e, posteriormente, teve seu contrato rescindido. Arboleda, do São Paulo, foi visto em festa clandestina com David Neres, que joga da Holanda (!!!!).

Enquanto isso, morrem mais de 2 mil pessoas por dia. No auge, foram mais de 4 mil. E campeonatos prosseguiram, apesar dos riscos. O Flamengo busca a volta do público sempre que possível, além de pressionar a volta do futebol láááá no meio de 2020.

Atualmente, a Copa América acontece no país. Era pra ser na Colômbia e Argentina, mas fechou no Brasil. País que não tem a menor obrigação de apagar o incêndio da Conmebol e salvar a confederação que nada contribui ao país de um prejuízo milionário.

Ainda assim, o presidente Jair Bolsonaro fez questão de aceitar o pedido, e insistir na realização do evento. Desastre cantado. Futebol de baixíssima qualidade e Covid livre, leve e solto. No momento, são 140 infectados pela doença envolvidos na competição brasileira de futebol. Na média, são 12 casos por dia. Mas o protocolo deve, sim, ser louvado, claro!

A impunidade reina, e a falta de humanidade é padrão. Aqueles que mantém isolamento são chamados de idiotas. Aqueles que são contra a realização de eventos que só pioram a situação estão, claramente, a defender interesses próprios, ou de seus empregadores.

Não existe bondade. Se existe, é minoria.

E, enquanto isso, festas, jogos, casos e mortes.


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