O Brasil e a conquista do primeiro mundial em 1958
Em 1958 a selecção brasileira já era “Canarinha” e vinha de dolorosos reveses nos últimos dois mundiais: oito anos antes, em 1950, a derrota em casa que custou o título diante dos seus quase duzentos mil adeptos. Quatro anos mais tarde, em 54, a eliminação com um convincente jogo imposto pelos magiares. Fora de campo, o suicídio do então presidente Getúlio Vargas “mergulha” o país em incertezas. No entanto, um movimento legalista toma conta do Brasil.
As eleições acontecem em 1955 com a vitória de Juscelino Kubitschek (foto abaixo, ao centro) para a presidência da República. Começava um período de grande prosperidade e crescimento na economia e na cultura com a Bossa Nova. Ademais, começava a construção da nova Capital Federal, Brasília.
Apurado para o Mundial daquele ano, a seleção brasileira de futebol era responsabilidade da antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD), presidida por João Havelange (foto abaixo, à direita), antigo atleta Olímpico de Pólo Aquático (Berlim 1936) e que futuramente seria presidente da Federação Internacional de Futebol (FIFA) entre 1974 e 1998. A conquista da Copa na Suécia era a meta principal e todos os esforços foram nela concentrados.
O carioca Havelange, que viveu boa parte da sua vida em São Paulo, sabia bem desta rivalidade dos paulistas com o Rio de Janeiro, quer seja no relvado ou fora dele, entre os dirigentes. Tal rivalidade prejudicou a selecção do Brasil em muitos momentos.
Para ocupar o importante cargo de Chefe de Delegação para o Mundial na Escandinávia, o Presidente da CBD convidou o empresário paulista Paulo Machado de Carvalho (foto abaixo, ao centro, ao lado de Zagallo, que está à direita), proprietário de emissoras de rádio (por exemplo a Pan-Americana “Jovem Pan”) e uma de televisão (Record).
Com uma delegação que incluiu um período de ambientação em uma cidade termal, dentista, psicólogo, cozinheira e comida levada do Brasil, os brasileiros partem para a Suécia ainda sob o estigma do “complexo de Vira-Latas” (em outras palavras, que não possuem valor, que ‘sucumbem’ diante dos momentos decisivos,) levantado pela imprensa nacional após a derrota na Copa de 50, no Maracanã, para o Uruguai. Entretanto, havia esperança naquela equipa, sobretudo pela presença dos melhores do Brasil, nomeadamente Garrincha, o guarda-redes Gylmar dos Santos Neves, Djalma Santos, Vavá, Zito, Bellini e uma jovem promessa, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, então com 17 anos.
A campanha do Brasil é impecável. Um 0 a 0 contra a Inglaterra e um convincente 2 a 0 sobre a União Soviética, em momento em que muito se temia o “futebol científico” dos russos, que no ano anterior se puseram em vanguarda pelo lançamento em órbita do primeiro satélite artificial de sempre, o “Sputnik”. A vitória sobre o País-de-Gales por 1 a 0 eternizou a estreia de Pelé em mundiais. Nas meias-finais, um sonoro 5 a 2 sobre a França do goleador Just Fontaine.
Pois bem. Brasil classificado para a final diante dos anfitriões, os suecos, cujo uniforme é muito semelhante ao brasileiro: camisola amarela com calção azul. O Brasil adoptou este equipamento mediante concurso promovido pelo jornal “Correio da Manhã”, do Rio de Janeiro, em 1953. Em sorteio realizado, os suecos vencem e a eles é dada a opção de jogarem a final com o primeiro equipamento: amarelo e azul. O Brasil teria que jogar com outro.
O de cor branca estava fora de cogitação porque muitos diziam dar azar, como fora oito anos antes, diante dos orientais. O azul estava previsto como camisola número dois, mas convencer os futebolistas brasileiros a não jogarem de amarelo foi tarefa difícil. Este impasse só teve fim quando o chefe da delegação do Brasil, Paulo Machado de Carvalho, dirigiu-se ao plantel e disse que jogariam de azul e estariam abençoados, porque azul era – e ainda é – a cor do manto de Nossa Senhora de Aparecida, Padroeira do Brasil.
E o argumento convenceu. Na decisão os escandinavos saíram na frente, mas os “Canarinhos”, vestidos de azul, repetiram o marcador da meia-final: 5 a 2 e Brasil, pela primeira vez, campeão mundial de selecções.
Bellini, defesa do CR Vasco da Gama e capitão do escrete, ao receber a Taça Jules Rimet, atende a pedidos dos fotógrafos para erguê-la, a fim de que ficasse visível para as fotografias. O Brasileiro com as duas mãos a ergue sobre a cabeça, em gesto que seria, dali em diante, repetido por todos os capitães campeões do mundo.
“Complexo de vira-latas” colocado abaixo. Festa no Brasil. Comemorava-se o título do escrete, tido pela opinião pública como verdadeiramente brasileiro, com base na ideia da mistura de raças. Celebrava-se também a efervescência cultural e a força da economia, com a implementação da indústria automobilística e a nova capital da República. Para comemorar este momento, é lançado o samba “A Taça do Mundo é Nossa” (Wagner Maugeri, Lauro Müller, Maugeri Sobrinho e Victor Dagô):
“A Taça do Mundo é nossa
Com brasileiro, não há quem possa
Ê, eta esquadrão de ouro,
É bom no samba, é bom no couro
O brasileiro lá no estrangeiro
Mostrou o futebol como é que é
Ganhou a taça do mundo
Sambando com a bola no pé
Goool!”
A conquista de 1958 também é marco para o Brasil e o futebol do país. Entretanto, o que acontecia no cenário dos clubes, é tema para o próximo artigo.