Jovens estrelas que caíram cedo demais: Márcio Sousa

Quantas jovens estrelas atingiram o patamar mais alto do futebol mundial para depois caírem abruptamente ou, pior, devagar sem nunca encontrarem um rumo de regresso aos títulos internacionais e aos grandes palcos (neste caso em especifico, Márcio Sousa)?

Nesta rubrica não procuramos descobrir quem tem culpa, mas sim as razões desse desaparecimento, perceber onde foram parar e se há alguma hipótese de redenção. E atenção, não dissemos desaparecemos porque ainda jogam seja numa primeira, segunda ou terceira divisão.

Se conheces mais casos deixa nos comentários para investigarmos e falarmos desses nomes.

MÁRCIO SOUSA, O MARADONA DA INVICTA

17 de Maio de 2003, às 19h20, Portugal sagrava-se campeão da Europa em sub-17. derrotando a Espanha por 2-1, numa tarde que iniciava um futuro bem positivo para diversos dos nomes que faziam parte dos convocados de António Violante, como por exemplo Paulo Machado, João Moutinho, Bruno Gama, Miguel Veloso (capitão), Vieirinha ou Hélder Barbosa, sendo que não foi nenhum desses jogadores a marcar os dois golos da vitória ou a receber a distinção de um dos melhores da competição. Quem foi então?

Márcio Daniel Ribeiro de Sousa, mais conhecido por “Maradona” – alcunha recebida dos seus tempos de iniciado e juvenil no Vitória SC -, foi um o artilheiro e fantasista da tarde, acertando com total perícia e classe na baliza defendida por Antonio Adán, deslumbrando os 9 mil adeptos que estavam no Estádio do Fontelo em Viseu, deliciando as bancadas com pormenores técnicos só ao alcance de um génio prematuro e fadado para ser algo especial no futuro próximo.

Passados quase 20 anos dessa data especial para Portugal, Márcio Sousa acabou por não ter a carreira que merecia ao mais alto nível, apesar de ter sido uma das peças-chave para o crescimento auspicioso do CD Tondela durante os anos de 2010 e 2015, arrancando, no emblema viseense, mais de 158 jogos, que terminou com o coroar do título de campeão na Liga SABSEG. Mas era Márcio Sousa esse pequeno génio que descrevemos ao início do artigo? É ver que o médio-ofensivo chegou a ser elogiado por José Mourinho em 2003, à data treinador do FC Porto, sendo lançado na Taça de Portugal frente ao Maia, isto com apenas 17 anos nas pernas, com o técnico azul-e-branco a confidenciar ao próprio que,

“Vieste aqui, porque eu quis e vens aqui para mostrares aquilo que tens feito até agora e continuares o teu trabalho!”.

O futebol adornado com passes em profundidade vertiginosos, uma técnica individual desconcertante e irritante para o adversário, e uma visão de jogo perfumada, compunham um reportório alargado de pormenores e detalhes saborosos e apaixonantes, merecendo à época uma atenção por parte da equipa técnica do FC Porto e de alguma da imprensa, podendo ser Márcio Sousa um dos novos grandes produtos da formação do clube da Invicta, a par de Paulo Machado e Vieirinha, dois atletas que também viriam a chegar cedo à equipa principal. Formado inicialmente no Torcatense, passando depois por Guimarães até chegar ao Porto em 2002, Márcio Sousa “Maradona” acabou por não conseguir atingir o estrelato que lhe parecia vaticinado em 2003, muito devido à inconsistência de visão dos “dragões”, com as equipas técnicas a optarem por outro tipo de atletas já mais “trabalhados” ou de outra origem, significando isto um relegar para a equipa “B” e, subsequentemente, dois empréstimos ao Covilhã e Vizela.

Aos campeões de sub-17: os conselhos de Márcio Sousa, herói de 2003 #Euro2016 #under17 #Portugal #MarcioSousa https://t.co/17HXBlctL2

— zerozero (@zerozeropt) May 23, 2016

A pouca utilização acabou por criar problemas no desenvolvimento do internacional sub-19, e a queda não só em termos de qualidade técnica ou táctica, assim como de competitividade, jogando nas divisões inferiores ao Campeonato de Portugal. Passagens pelo Nelas, Penafiel (em 2009 encontrava-se 3ª divisão, subindo nessa temporada com Márcio Sousa na equipa), Esmoriz, para chegar em 2010 ao CD Tondela, revitalizando a carreira em Viseu, a 20 kms do local onde tinha sido feliz em 2003 por Portugal. Ao serviço dos tondelenses, Márcio Sousa voltou a ganhar confiança e a despertar aquele lado genial com a redonda nos pés, driblando adversários com um toque quase felino, suavizando processos e a conferir uma palete de cores apaixonante a um emblema que começava a procurar um futuro diferente, que nunca tinha conseguido na sua história.

Entre 2010 e 2012, ajudou o clube oriundo da região de Viseu a começar a trilhar os passos certos, obtendo a promoção para a Segunda Liga em Maio de 2012, sendo constantemente considerado um dos melhores jogadores tanto do CD Tondela como do Campeonato Nacional da Segunda Divisão (actual Liga 3). O perfume manteve-se na divisão acima, enchendo o Estádio João Cardoso com aquela panóplia de detalhes que o fizeram ser chamado ao plantel principal do FC Porto aos 17 anos, conseguindo ajudar o clube a sedimentar a sua posição numa liga mais competitiva e árdua.

Em 2014/2015 acabou por perder o lugar na equipa principal, mas ainda actuou os jogos suficientes para ver o CD Tondela a conquistar a Liga SABSEG e a chegar à Primeira Liga, um evento histórico e inédito, no qual Márcio Sousa pôde assinar com letras douradas. Findada a ligação com o Tondela, Márcio Sousa ainda voltou a jogar mais uma época na Liga SABSEG, agora ao serviço do SC Farense, “emigrando” novamente para as divisões inferiores – que incluiu ligas distritais – a partir do ano de 2016, com passagens pelo Lusitano VRSA, Limianos, Moncaparachense, Torcatense (um regresso à casa de partida), Ninense, Vilaverdense e, finalmente, Os Sandinenses, fechando a carreira aqui e quase 300 jogos depois ao fim de quase 20 anos como jogador sénior profissional.

Numa entrevista concedida a Diogo Matos do ComUM, Márcio Sousa, o “Maradona de Guimarães” recordou aquele que foi, talvez, o momento mais auspicioso de uma longa carreira no futebol português,

“É uma sensação indescritível. No momento não tens noção do que acabaste de ganhar. Tínhamos uma seleção forte, mas toda a gente dava a Espanha como favorita. O fator casa foi muito importante para nós”.

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