A propósito do Australian Open: o calor e outras coisas e nós por cá?
Andamos nós por estes dias entretidos e animados a assistir aos empolgantes encontros do Australian Open, pesem embora as horas de sono perdidas quando queremos ver alguns encontros em directo.
Mas esse é o único preço a pagar. Por esta altura do ano, os jogadores têm de se bater contra várias adversidades e dentro delas, uma das mais temíveis neste Major… O calor, o temível calor que nesta altura do ano se faz sentir nos nossos antípodas!
Se perante um adversário que eleva o seu nível de jogo, nós conseguimos elevar o nosso, perante este oponente esta não é definitivamente a solução. Num dia “fraquinho” este jogador apresenta-se com uns ténues 30 graus celsius, num dia em que venha bem preparado valores acima dos 40 graus é o anúncio de que as nossas competências físicas e técnico-tácticas passam para 2º plano! E 40 graus ou mais, referem-se à temperatura ambiente.
Ao nível do Court e também por causa do tipo de piso, Hardcourt, que causa um efeito de reverberação ou reflexão, potenciando este valor para mais de 50 graus! Este seria o último sítio onde quereríamos estar, mas… os jogadores não têm opção.
Já ouvimos várias descrições de “experiências extracorporais”, desfalecimento, desidratação, recuperação com soro por intravenosa… e as imagens que nos chegam também não são menos simpáticas, expressão do sofrimento dos jogadores, as últimas das quais referentes ao encontro entre Novak Djokovic e Gael Monfils.
Se foi o Francês que se deu pior com este oponente, também o Sérvio enfrentou um duro teste e advertiu que é preciso redefinir os limites, pois está em causa a saúde dos jogadores.
Mas e o que podem os jogadores e a organização fazer contra tão temível adversário?
O uso de boné (evita a exposição solar directa da cabeça e diminui um pouco a da face, bastante sensível às temperaturas, pois é aí que se encontram boa parte dos nossos sensores térmicos); Hidratação contínua, antes, durante e depois dos jogos; Arrefecimento corporal (uso de toalhas embrulhadas em gelo); Períodos de repouso em zonas frescas e abrigadas do sol (o guarda-sol regra geral associado à cadeira do jogador ou aos prestáveis membros da equipa de court); A melhor entre todas, não é no entanto geralmente utilizada, a cobertura do tecto amovível. E a justificação da organização é a da equitatividade: se sofre um, sofrem todos!
Bom e de jogadores profissionais estamos nós falados…
E em Portugal, neste aspecto, está tudo bem?
Daquilo que eu conheço da realidade nacional… não, nós não estamos bem, mas sobretudo da cabeça!
Passaria pela cabeça de alguém, destinar um belo e quente dia de sol, a uma ida à praia e não se munir do precioso guarda-sol ou do dinheiro para alugar um? Talvez aos adolescentes e jovens adultos esta até pareça uma interessante opção, que o tom bronzeado parece ser um interessante aliado para o jogo da sedução e o reforço da confiança, mas nós, os mais velhotes, já não vamos nessa: o desconforto é muito, a pele não gosta e o bom senso impera!
Então e nos courts de Ténis?
As medidas a tomar para a prática do exercício com temperaturas elevadas vêm bem expressas pela Direccção Geral de Saúde, https://www.dgs.pt/paginas-de-sistema/saude-de-a-a-z/calor/recomendacoes-gerais.aspx.
Mas a realidade que eu tenho encontrado, por esses courts fora, no âmbito do circuito nacional de veteranos, é outra: guarda-sol ou zona de sombra inexistente, insuficiente ou inadequada, pois o sol não se compadece das estruturas fixas e estas não o acompanham quando ele muda de posição.
Convém, no entanto, salvaguardar algumas excepções, em que os organizadores cuidam para mimar e proteger os jogadores, como qualquer organização responsável e de bom senso, que quer ter resultados e quer que os jogadores voltem para os próximos eventos…
Na temporada de 2017, preparava-me para jogar o encontro da final, na categoria de SM+50, em Hardcourt. O encontro, num dia de verão, com temperatura ambiente de 42 graus, foi programado para as 14.30h… antes do início do encontro, perguntei ao juiz-árbitro da colocação do guarda-sol no court… Não havia!!!
Estupefacto, iniciei as negociações com um ; sendo assim, não jogo!!! No final, acabámos por encontrar uma solução de compromisso, aproveitando as zonas laterias de sombra no court e com todo o sofrimento e peripécias do encontro, lá sobrevivemos.
Deixo a sugestão à entidade reguladora da nossa actividade, a F.P.T., que penso que acolheria a aprovação total dos intervenientes nos torneios, pais e familiares incluídos: uma supervisão cuidada sobre este assunto em todos os courts em clubes federados, no período de verão, pois acredito, que, pese a idade e a pandemia das doenças neurodegenerativas, ainda estamos todos bem de cabeça! Só que às vezes esquecemo-nos.
Texto de Jorge Félix (facebook e Linkedin), Cinesiologista desportivo, licenciado Educação Física e Desporto F.M.H. e especialista em Exercício e Saúde. Podem seguir a sua página d’ “A Oficina do Corpo – Jorge Felix training systems“