40 minutos de classe All Black chega – Rugby Championship
A ronda 1 trouxe uma certeza: os All Blacks não estão mais fracos. Este pensamento em fácil de aceitar depois da excelente (mas não magnifica) segunda parte frente aos Wallabies, invertendo uma desvantagem de um ponto para uma vitória por números bem “pesados” para os Wallabies. Uma questão de classe All Black? Ou foi mais demérito australiano?
E o que dizer do espectacular encontro entre sul-africanos e argentinos, com Malcolm Marx a vestir o papel de principal cavaleiro de Erasmus, enquanto que Morono e Boffelli bem tentaram destruir as linhas atrasadas dos ‘boks?
Toda a nossa análise aqui
UM JOGO DE RUGBY TEM 80 MINUTOS… E OS ALL BLACKS GANHAM SEMPRE NO FIM
É uma frase que é copiosamente dita, repetida e relembrada pelos amantes e apaixonados da bola oval, muito pelo facto dos neozelandeses realmente serem demolidores quando mais necessitam e, frente aos Wallabies na primeira-mão do Bledisloe Cup (competição disputada pelas duas nações desde quase sempre) viraram um 05-06 para um 38-13 em menos de quarenta minutos.
Podemos dizer que não foi uma exibição daqueles fantásticas dos kiwis, mas foi suficientemente boa para dar um pequeno show na segunda metade do encontro ao ponto que humilharam (e sem problema de usar esta palavra) a equipa da casa, com um desnível de 25 pontos algo que ia ficando ao nível de 2016 (08-42 a favor dos neozelandeses).
De forma sucinta, a primeira parte foi um caos em termos de combinações e movimentações de jogo, principalmente por parte dos visitantes, em que surgiram vários erros de handling e de conclusão de jogadas. Veja-se o caso da situação em que Rieko Ioane deixa cair a oval a meros 3 metros da linha, muito por culpa da forma como a segurou mas também pela excelente placagem de Bernard Foley.
Houve uma certa desconexão entre Aaron Smith e Beauden Barrett, que também teve a sua razão de ser… a pressão alta australiana que fechava em “V”, não dando espaço ao número 9 de esboçar um passe mais tenso e o abertura dos All Blacks tinha sempre poucas soluções para entregar a oval em condições. Ganharam algumas quebras-de-linha, mas faltava sempre alguma coisa que alterasse o jogo por completo.
Sobretudo, sentia-se alguma falta da irreverência de Anton Lienert-Brown que entraria logo aos 15 minutos de jogo depois de uma lesão de Ryan Crotty (a 4ª em 2018), o que conferiu mais velocidade e imprevisibilidade. Por seu turno, os Wallabies estiveram longe de efectuar uma exibição de qualidade, operando as suas fases estáticas com calma, saindo a jogar sem muito risco… de vez em quando lá surgia Kurtley Beale ou Israel Folau a imaginarem algo de diferente para animar as hostes, sem contudo ser uma situação consistente.
Reece Hodge e Bernard Foley abriram o marcador ao pé e os australianos iam sorrindo perante a ineficácia e falta de explosão dos All Blacks na linha de vantagem, em específico nos últimos 10-5 metros.
Todavia, aos 39′ veio o factor que alterou o encontro: jogada rápida nos 40, Beauden Barrett entrega a bola a Ben Smith e o defesa rompe a linha de defesa… depois o típico movimento de apoio rápido neozelandês com Smith-Goodhue-Naholo-Read a fazerem a bola saltitar entre si, com uns pops fáceis e bem esboçados, para Aaron Smith finalizar a jogada.
06-05 e vamos para a parte em que os neozelandeses lançaram o ataque esfomeado à equipa adversária. Logo na reabertura de jogo, os All Blacks ganham o seu alinhamento (ganharam 9 dos seus 12), passam a bola para dentro dos 22 metros e numa situação de alto risco decidem sair a jogar… passe longo de Barrett para Goodhue que ataca a linha e antes de chegar aos defesas novo passe para Lienert-Brown. O centro repete o mesmo movimento e mete a oval em Ioane, que sai disparado e foge a tudo e todos… com Folau pela frente, e sem ninguém lá atrás o ponta prende o defesa australiano e completa o passe para Goodhue… ensaio. Fácil, não é?
A partir deste momento, os neozelandeses nunca mais pararam… logo de seguida foi Beauden Barrett a marcar ensaio, depois de um erro de Haylett-Petty no contacto.
O abertura vai de pontapé em pontapé e capta a oval do chão (foi o melhor médio-de-abertura este fim-de-semana, com 80 metros, 1 ensaio, 4 conversões em 7, 3 quebras-de-linha, 4 defesas batidos, 85% de eficácia na placagem, duas delas já em situação de perigo e ensaio iminente… afinal sabe jogar bom rugby).
Um factor decisivo foi também a entrada de Damian McKenzie… a partir da posição de defesa, o pequeno mágico electrizou o três-de-trás e deu sérios problemas aos australianos… mesmo a correr de lado, sempre que aplicava um side-step, prendia uns quantos placadores e abria espaço para os seus colegas entrarem e ganharem metros preciosos.
O melhor esteve para a seguir ao ensaio do médio de abertura dos All Blacks: o ensaio à ponta de Broadie Rettalick. Nova bola rápida, Barrett entrega ao monstruoso segunda-linha que só faz uma finta de passe que “engole” Bernard Foley e vai sozinho até à área de validação. Erro gritante da defesa australiana, pois ninguém veio no socorro de Foley, ficando todos a olhar. Falta de forma física? Ou Michael Cheika não preparou o jogo como prometeu?
Não fosse o ensaio de Maddocks, depois de uma genial saída de Kurtley Beale dos seus 22 metros e a Austrália tinha acabado pior do que terminou. Naholo aproveitou para bisar nos últimos 5 minutos (pontapé táctico de Beauden Barrett genial que trabalhou bem no timing com o ponta), sendo que o seu 2º ensaio foi um show de como atropelar e passar pela defesa.
Notar que os australianos consentiram cinco penalidades na formação ordenada, um sério problema para aguentar a força neozelandesa, para além de que raramente conseguiram fazer um turnover em condições.
All Blacks já têm uma mão na Bledisloe… e para o próximo sábado podem colocar a outra. Steve Hansen voltou a calar os críticos, mesmo sem ter feito um jogo fantástico que bastou no final de contas. Michael Cheika fica com a batata-quente de ter que ganhar em Auckland. Possível?
NAS GARRAS DE MARX E NOS PÉS MÁGICOS DE AM
O melhor jogo da 1ª ronda esteve reservado para o duelo entre África doSul e Argentina, realizado em Durban. Rassie Erasmus versus Mario Ledesma pela primeira vez na História destes dois países… um jogo brutalmente físico, de uma entrega e sacrifício genial que terminou com uma boa e merecida vitória dos Springboks por 34-21, apesar dos Pumas terem tido duas oportunidades nos últimos 5 minutos de encurtar o resultado.
Contudo, perante a fisicalidade sul-africana os argentinos não conseguiram operar na segunda parte de forma expedita, entregando o jogo à medida que o tempo avançava. Sérios erros na comunicação entre a linha de 3/4’s na defesa explica por exemplo o ensaio de Aphiwe Dyantyi. O ponta aos 42′ apareceu solto e sozinho para apanhar a oval depois de um pontapé espectacular de Faf de Klerk para as costas da defesa dos Pumas… ninguém estava lá atrás o que facilitou a missão do speedster sul-africano.
Ou seja, faltou à Argentina várias coisas entre elas o equilíbrio defensivo e a comunicação ágil que pressionasse e amordaçasse o mais tempo possível os Springboks. Porém, a forma com os jogadores da equipa da casa se entregaram no contacto físico foi destruindo a Argentina aos poucos e a vantagem de quatro pontos trazida da primeira parte rapidamente tornou-se um pesadelo.
Observando o encontro, há que destacar alguns pontos fundamentais para a vitória dos ‘boks, a começar pela forma como atacaram o breakdown enquanto defesas. A Argentina apresentava um bloco bom nesse aspecto, mas sempre que eram placados e postos no chão com Malcolm Marx, Siya Kolisi, Warren Whiteley ou Lukhanyo Am por perto, perdiam a batalha… 7 penalidades conquistadas no chão deram possibilidade dos sul-africanos atacarem os 22 e 5 metros argentinos em vários momentos do jogo.
Marx então foi impressionante… mal atacava a oval no chão, não havia forma de tirá-lo de lá. Posição corporal de excelência, trabalho fenomenal no ataque à bola e espírito de luta foram ingredientes que resultaram na conquista dessas faltas. Marx não apareceu tanto no jogo rápido ou com a oval nas mãos, preocupando-se em fazer o trabalho nas sombras, o que levou a sua equipa à vitória no fim.
Contudo, um aspecto negativo foram três alinhamentos perdidos nos últimos metros… este erro alastrou também, e principalmente, aos Pumas, só que os Springboks a jogar em casa, com uma avançada de topo não podia perder tão facilmente assim a bola. Alguma falta de comunicação ou de entrosamento, que depois na 2ª parte lá apareceu e catapultou-os para outro patamar.
Outro ponto bastante positivo foi a forma como as linhas atrasadas dos sul-africanos operaram… harmonia completa, especialmente no três de trás onde Dyantyi, Mapimpi e Le Roux foram protagonistas de alguns dos melhores momentos do encontro. Os três juntos foram responsáveis por 2 ensaios (Dyantyi 2), 1 assistência (Le Roux ao pé), 170 metros conquistados, 8 defesas batidos e 8 quebras-de-linha.
A somar a este apontamento, há exibição do par de centros: Andre Esterhuizen e Lukhanyo Am. Ambos foram destruidores para os Pumas, aparecendo bem sempre que estes tentavam procurar soluções no lado aberto, somando 20 placagens, 4 turnovers e nunca perderam um combate corpo-a-corpo. Foi um duo sólido e duro o suficiente para parar com as movimentações dos argentinos.
Onde a Argentina esteve, por sua vez, bastante bem foi a explorar o contra-ruck muito mal defendido por parte da equipa da casa que se expôs em demasia. O ensaio de Pablo Matera acontece nesse sentido… ruck para os Springboks à ponta, dois jogadores limpam bem mas acabam por dar um encosto fatal na oval, que rebolou para fora e Moyano apanho-a, entregando ao seu asa.
Foi recorrente este erro dos Springboks e só ficou devidamente sanado quando Faf de Klerk começou a preocupar-se um pouco mais com este aspecto. O número 9 voltou a fazer uma excelente exibição comandando o pack e o ritmo de jogo, apresentando-se sempre como um mestre de cerimónias dos Springboks. O melhor 9 da semana, não há dúvidas.
A vitória foi inteiramente justa e agora segue-se uma viagem até Buenos Aires. Conseguirá Ledesma ganhar aos sul-africanos? Ou Erasmus vai chegar ao encontro frente à Austrália imbatível no Rugby Championship?
EQUIPA DA SEMANA: Joe Moody, Malcolm Marx, Owen Franks, Broadie Rettalick, Eben Etzebeth, Pablo Matera, Sam Cane, Kieran Read, Faf de Klerk, Beauden Barrett, Aphiwe Dyantyi, Kurtley Beale, Jack Goodhue, Waisake Naholo e Willie Le Roux;
JOGADOR DA SEMANA: Malcolm Marx (África do Sul)
PONTUADOR MÁXIMO: Beauden Barrett (Nova Zelândia) – 14 pontos
MELHOR ENSAIO: Jack Maddocks (Austrália)