O novo e empolgante Phoenix Mercury
O início da temporada passada da WNBA foi marcada pela rivalidade entre Las Vegas Aces e New York Liberty, os dois chamados “super times”. Compreensível, o prognóstico acabou não se efetivando, devido à emergência de uma terceira força, não identificável nos primeiros jogos. O Minnesota Lynx, formado com apenas uma grande estrela e um conjunto coeso e balanceado de coadjuvantes, tomou a frente do Aces, conquistou a Comissioner’s Cup e chegou à finalíssima da temporada 2024. Por muito pouco, não desbancou o Liberty.
Os prognósticos para a temporada atual repetem a narrativa, com as duas últimas finalistas concentrando os palpites e apostas. 9 em 10 analistas apontam uma iminente nova final entre NY Liberty e Minnesota Lynx; Las Vegas despencou e a próxima pergunta de milhões passou a ser ‘quem é a terceira força da temporada’.
O Indiana Fever, sob o comando de Caitlin Clark e Aliyah Boston, se reforçou na inter temporada, com o retorno da técnica Stephanie White e contratações de peso. Porém, a primeira parte da campanha demonstrou uma queda, não evolução, do conjunto, a ponto da maior contratação do ano (DeWanna Bonner) já ter sido dispensada. Clark lida com contusões que a afastaram de algumas rodadas e Kelsey Mitchell demorou a aquecer.
Em Seattle, o Storm se desfez da última remanescente do time campeão de 2020 e apostou na dupla Nneka Ogwumike e Skylar Diggins. A ascensão de Gabby Williams adicionou tempero à mistura, ainda insuficiente para almejar um improvável título, devido à diferença técnica do banco de reservas. Atlanta foi outra equipe a inverter sua direção e mudar seu estilo de jogo com a chegada do técnico, super ofensivo, Karl Smesko. A ênfase nos tiros longos e na velocidade, compatível com as alas Rhyne Howard e Allisha Gray, não combina porém com os dois principais reforços para 2025, as pesadas pivôs Brittney Griner e Brionna Jones. O Dream subiu na tabela mas a dúvida sobre o encaixe segue devido às oscilações entre as partidas.
Quem ocupou o posto de terceira força da temporada 2025, com lampejos de poder desbancar a poderosa dupla Liberty-Lynx, foi o surpreendente Phoenix Mercury. No momento, a equipe ocupa a segunda posição da tabela (atrás do Lynx, à frente do Liberty) com 12 vitórias e 4 derrotas, tendo alcançado a marca centenária em duas partidas consecutivas. Ninguém poderia imaginar tal desempenho após 2024 e após uma offseason inusitada.
Fun action from the Mercury to start. Satou Sabally screens with Alyssa Thomas right behind. Looks like it will be Stack or a Double P&R instead it’s an elbow catch for AT. Flows into an empty side handoff, good late find.
— Steve Jones Jr (@stevejones20.bsky.social) June 20, 2025 at 12:06 AM
Os dois esteios da franquia, estrelas em Phoenix por mais de uma década, deixaram o time: Diana Taurasi aposentou (Diana Taurasi, o adeus de uma lenda) e Griner optou em migrar para Atlanta. Por muitas temporadas, inclusive o título em 2014, o elenco girou ao redor de ambas; os últimos anos, entretanto, não trouxeram bons ares. Uma Taurasi cada vez menos efetiva no ataque e menos atenta à defesa, somada a uma Griner pouco motivada e com problemas extra-quadra, deixou gosto amargo em Phoenix. Em 2024, a aposta de renovação concentrou-se no comando técnico, quando o técnico Nate Tibbetts assumiu com promessa de oxigenar e acelerar o ataque. No primeiro ano, não funcionou.
A franquia, ciente da partida de suas duas figuras históricas, movimentou-se de forma heterodoxa para a atual WNBA. O time concentrou seu cap space (teto de gastos) em três estrelas – Kahleah Copper (remanescente de 2024), Alyssa Thomas e Satou Sabally, deixando pouca margem financeira para completar o elenco. Distante da receita de sucesso das últimas campeãs, a diretoria investiu pesado em prospectar talentos longe dos holofotes, arregimentando um elenco com pouca experiência na liga, oriundas de ligas menores e jogadoras não-draftadas. As contusões de Copper e Thomas, nas primeiras rodadas, trouxe ainda mais incerteza.
Eis que, contrariando todas as expectativas e assumindo a identidade da fênix, a equipe floresceu. Quando tudo jogava contra as expectativas, quando pareceu que o Mercury iria para a reconstrução, o técnico, a diretoria e as jogadoras trataram de provar o contrário. A começar pela diretoria, encabeçada pelo GM (general manager) Nick U’Ren, com um trabalho invejável de prospecção em ligas secundárias da Europa e conferências menores do circuito universitário.
Por essa via, chegaram Lexi Held (cortada na pré-temporada após ser desprezada no draft de 2022), Monique Akoa Makani (camaronesa de 24 anos, oriunda de times medianos da França) e Kathryn Westbeld (ala-pivô de 29 anos). O trio despontou sob as diretrizes táticas e proposta de jogo do coach Tibbetts, transformando suas aparentes debilidades em potências. Excelentes arremessadoras de três pontos, o trio foi incentivado por Tibbetts a praticar uma defesa agressiva (mesmo em constante desvantagem de altura, no caso de Westbeld), elevando a décima defesa em 2024 a escalar e atingir a quarta posição em 2025.
The gaps close quick against the Mercury defense. Good help, good recovery, good team defense.
— Steve Jones Jr (@stevejones20.bsky.social) June 20, 2025 at 12:36 AM
Os contratos mínimos de veteranas foram preenchidos por Sami Whitcomb (outra chutadora voraz) e Kalani Brown (única pivô de ofício do elenco), além da aposta no desenvolvimento de Natasha Mack como uma rim-runner (pivô mais baixa que compensa com velocidade e proteção de aro) e em Kitija Laksa como um risco às defesas adversárias atuando sem a bola, saindo de bloqueios indiretos.
Tibbetts tem sido primoroso em comandar o “desnivelado” e inusitado elenco. As mudanças não se restringiram ao lado defensivo: o time passou do sétimo (2024) ao segundo (2025) time mais acelerado da liga. O ataque não subiu tanto quanto os demais quesitos, passando do oitavo (2024) ao sexto (2025) melhor ataque; a timidez na evolução precisa de contexto, vez que o time perdeu a maior pontuadora da história da WNBA e atuou a primeira metade da temporada com DIVERSOS desfalques. Por um bom período, Phoenix atuou sem duas de suas três estrelas – sem perder em poderio ofensivo.
Apesar dos três eixos (Copper ainda em busca da melhor forma física), o time atua coletivamente, com clara definição de papéis e funções, incentivando as coadjuvantes a assumirem responsabilidade crescente. A cada jogo, a prancheta de Tibbetts mostra-se mais ampla, com muitos bloqueios de amadoras para pivôs, espaçamento e constante movimentação. Junte a agressividade nas infiltrações e o alto QI do elenco e temos a fórmula de sucesso do Phoenix Mercury.
The versatility of the Mercury really helps their flow offensively. Stagger for Satou Sabally, that turns into an elbow catch for Alyssa Thomas. Now it’s a split, no switch on Satou, helps open up AT on the roll.
— Steve Jones Jr (@stevejones20.bsky.social) June 20, 2025 at 12:08 AM
Sequer as diversas intercorrências do começo da temporada (o time sofreu muitas lesões e se viu obrigado a recorrer a contratos temporários para completar o elenco) afetaram o basquete de primeira qualidade praticado. Quem quer que esteja uniformizado, dentro da quadra, com contrato garantido ou intermitente, corresponde; normalmente mais baixa em estatura, a equipe compensa com agressividade, intensidade e fluidez. O mais assustador para o resto da liga é que o conjunto sequer esboçou suas reais potencialidades: Copper insere-se gradativamente no conjunto, AT e Satou Sabally ainda desenvolvem o entrosamento e há peças marginais do elenco que podem florescer (Murjanatu Musa).
Sabally retomou a melhor forma técnica após alguns anos apagada em Dallas, com desempenho digno de menção para a disputa de MVP; durante as ausências de Thomas e Copper, ela assumiu o protagonismo e chamou a responsabilidade quando necessário, sem obscurecer o elenco de apoio. Alyssa Thomas mantem o nível altíssimo e é a timoneira do time em quadra; sua versatilidade ainda deve ser mais explorada por Tibbetts (favorito, até aqui, ao prêmio de ‘técnico do ano’).
Não duvidemos desse renovado e rejuvenescido Phoenix Mercury; Lynx e Liberty buscarão, a qualquer custo, fugir do confronto no playoff.