Memphis Grizzlies: um caso de estudo

Fair PlayMarço 29, 20226min0

Memphis Grizzlies: um caso de estudo

Fair PlayMarço 29, 20226min0
Uma equipa em reconstrução que começa a despertar, estes são os Memphis Grizzlies que Nuno Canossa fala neste artigo para o Fair Play

Artigo escrito por Nuno Canossa, que fala da ascensão dos Memphis Grizzlies de equipa “perdedora” para uma das novas coqueluches da NBA

Foi no decorrer da última semana que a equipa do Tennessee, sem a sua principal figura Ja Morant, derrotou os Brooklyn Nets dos inspirados Kyrie Irving (43 pontos, 8 assistências) e Kevin Durant (35 pontos, 11 ressaltos, 8 assistências), fechando a série de jogos frente aos nova-iorquinos em 2-0. E após este impressionante triunfo liderado por Bane, Jackson Jr., Brooks e companhia, uma estatística ainda mais impressionante correu o twitter: os Memphis Grizzlies elevaram o seu registo para 15-2 quando o MIP da temporada fica de fora da ficha de jogo. Curiosamente, essa mesma vitória foi a 50ª da época – um feito muito mais assinalável, já que é apenas a 5ª vez que a atingem nos seus 27 anos de história.

Com Marc Gasol, Mike Conley e Zach Randolph, a equipa de Memphis participou nos playoffs 7 vezes consecutivas numa era em que foram uma das forças dominantes do Oeste, entre 2010 e 2017. Apenas 5 anos decorreram e os Grizzlies estão novamente no topo da conferência (2º lugar, à data). E a questão que mais se coloca é como?

SER RACIONAL

Apesar de nesses 7 anos nunca terem alcançado o palco das Finais, os Grizzlies tiveram razões para sonharem com algo mais. Sonhos, no entanto, esbarrados ou pela dinastia dos Spurs, ou pelos decepcionantes Lob City Clippers e, até mesmo, pelo jovem trio de Oklahoma cujo mandato foi demasiado curto. A janela do Grit ‘N Grind havia então encerrado e a administração da equipa não temeu encarar uma nova corrente.

Em 17/18, Zach Randolph rumou a Sacramento, com a equipa de Memphis a tomar a melhor decisão: manter-se debaixo da luxury tax. Os Grizzlies começavam então, pela primeira vez desde 2008, uma época sem Z-Bo, numa temporada que se avizinharia uma experiência: quão longe poderiam ser conduzidos por uma dupla Conley/Gasol com cada vez mais idade nos joelhos? Uma dúvida que não chegou a ser desfeita, dado que o base sofreu uma lesão no tendão de Aquiles ao 13º jogo. Das 22 vitórias totais registadas no final dessa época, apenas 15 surgiram após a última partida de Conley, com Gasol a liderar uma equipa de jogadores em declínio como Tryeke Evans, Chandler Parsons ou Mario Chalmers – destacando-se apenas uma sólida campanha de rookie de Dillon Brooks.

E com esse que foi o 2º pior registo de toda a liga, os Grizzlies decidiram atacar uma reconstrução sustentada no draft. Apesar do plantel envelhecido e uma evidente lacuna em talento, profundidade e juventude, desfazer-se de estrelas como Conley (trocado para Utah) e Gasol (trocado para Toronto) seria sempre uma decisão difícil para um mercado tão pequeno como Memphis. Mas como se diz em bom inglês: the one who doesn’t risk, doesn’t snack.

SER AMBICIOSO

A recompensa de uma temporada com apenas 22 vitórias? Uma posição alta no draft. Com a 4ª escolha, Jaren Jackson Jr. foi a peça seleccionada numa classe recheada de talento: Ayton, Doncic, Young ou Shai. E a realidade é que, pelo menos, esses 4 jogadores floresceram e atingiram um patamar mais competitivo numa fase mais precoce das suas carreiras.

No entanto, o mesmo era expectável, sendo uma das principais críticas à escolha dos Grizzlies a existência de opções mais NBA-ready que se enquadrariam melhor num plantel que, à altura, ainda contava com Conley e Gasol. Contudo, a gestão da equipa optou por este intrigante projecto: um jogador com um tecto defensivo soberbo, atlético e com a habilidade de lançamento de um base. Uma análise feita consensualmente pelos media norte-americanos que, neste caso, tem-se demonstrado acertada, não fosse Jackson Jr. um dos mais sérios candidatos ao DPOY desta temporada e um dos pilares do sucesso da equipa.

No ano seguinte, Ja Morant chega a Memphis com uma equipa completamente reconstruída. Para além do novo court e equipamentos, o plantel demonstra mais versatilidade com veteranos de valor – Jae Crowder e Jonas Valunciunas -, a aposta no faz-tudo e pouco-compromete Kyle Anderson – cuja mobilidade é certamente questionada -, e com um core finalmente jovem e repleto de lançadores respeitáveis – De’Anthony Melton e Tyus Jones – e opções defensivas – Dillon Brooks e Brandon Clarke.

Porém, um plantel de qualidade continua a precisar de um líder e Ja Morant, que em duas épocas em Murray State passou de unranked para 2ª escolha no draft, foi a injecção necessária para os Grizzlies se tornarem numa das equipas mais competitivas da liga. Morant, um dos jogadores mais atléticos, explosivos e inteligentes dos últimos anos, faz a sua estreia na liga com uma evidente lacuna: o seu lançamento. E os seus 49% de field goal e 34% da linha dos 3 pontos também ajudam a explicar a posição dos Grizzlies na tabela.

SER APLICADO

Apesar de tudo o que já foi referido, continua a ser surpreendente um 2º lugar numa Conferência Oeste que há largos anos é a mais competitiva da NBA. E para se ter resultados, não basta ter talento ou peças que encaixem bem umas nas outras. É preciso trabalho e comprometimento nos dois lados do campo.

É preciso tratar bem a bola, não cometer faltas desnecessárias, saber criar e interpretar linhas de passe, ser agressivo e disputar todas as bolas. E os Grizzlies não só o têm feito – são, por exemplo, uma das equipas com menos turnovers e a líder destacada em ressaltos ofensivos (aqui, destaque para Steven Adams que cria uma série de segundas oportunidades para converter os lançamentos) – como continuam a ser uma das equipas que mais geram espectacularidade e highlights.

Mérito final para Taylor Jenkins, sério candidato a treinador do ano, que apesar das várias adversidades (como a ausência de Morant em 17 jogos, dos quais venceram 15) conseguiu converter estes Grizzlies numa das mais eficientes defesas, mantendo a qualidade ofensiva num ritmo de jogo frenético (a 4ª equipa com mais posses por 48 minutos) sem comprometer a evolução dos seus jogadores, que ainda assim, estão longe do seu potencial máximo.

P.s. – Tudo o que aqui escrevi tornar-se-ia automaticamente inválido se não mencionasse a temporada sensacional de Desmond Bane. Tornou-se rapidamente um dos lançadores mais eficazes e temidos da liga, com um upside defensivo que imediatamente nos traz a figura de Klay Thompson à cabeça. Conseguem imaginar a felicidade de um fã dos Grizzlies que, actualmente no 2º lugar, olha para o trio Morant/Jackson/Bane e percebe que o mais velho tem 23 anos?


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