Guarda-Redes Avançado: A Revolução do Futebol de Praia Moderno (Parte II)
No seguimento do sucesso do Taiti no mundial 2013 e à imagem das selecções da Europa de leste, a utilização do guarda-redes no processo ofensivo foi-se enraizando na cultura do futebol de praia dos vários continentes. A temporada europeia de 2014 marcou uma intensificação significativa no uso desta táctica, que se tornou prática recorrente em grande parte das equipas da divisão A, mas também da divisão B.
O torneio de qualificação para o mundial, realizado em Jesolo em 2014, ilustra cabalmente esta tendência, quando comparado com o torneio anterior (de 2012).
No entanto, a mundialização do 1:2:2 tomaria novo fôlego em 2015, num mundial em que praticamente todas as selecções (talvez à excepção do Senegal) recorriam ao 5:4 pelo menos esporadicamente ao longo do jogo.
A Rússia, que chegou a Espinho como bi-campeã europeia e mundial, preparava-se para estender o seu reinado com a mesma estratégia de sempre, que lhe foi muito proveitosa nos quartos de final frente ao Brasil, e o Taiti apresentava-se com uma versão melhorada das suas dinâmicas ofensivas a partir do 5×4 montado por Jonathan Torohia (que viria a ser considerado melhor guarda-redes do mundo na competição e no ano civil).
Ambas as equipas seriam derrotadas por uma selecção portuguesa muito próxima da perfeição, que também recorria frequentemente ao 5×4 montado por Elinton Andrade, imagem de marca da selecção das quinas desde então.
O 1:2:2 afirmava-se assim cada vez mais como uma estratégia de sucesso no plano global, tendo os dois anos seguintes confirmado plenamente a nova tendência geral no futebol de praia. Praticamente todas as selecções incluem esta forma de saída para o ataque de forma consistente no seu modelo de jogo, sendo que mais de metade das selecções de topo assume o 1:2:2 como principal forma de lançar os ataques.
Além dos crónicos Taiti, Rússia e Ucrânia, outras selecções europeias de topo, com a Itália e a Suíça, adoptaram o 5×4 como sistema de jogo por defeito, assim como outras presenças assíduas no Top 10 mundial, como o Irão (3º lugar no mundial 2017), os Emirados Árabes Unidos e o Paraguai. Inclusivamente Portugal tem vindo a recorrer cada vez mais frequentemente ao 2:2, mediante a composição do 5 de campo.
Ainda assim, a selecção lusitana é, a par do campeão mundial Brasil, das muito poucas selecções a nível mundial que não alterou completamente a sua forma de jogar para se render ao 1:2:2 durante a quase totalidade do encontro.
Futebol de praia em 1:2:2 – um olhar crítico
No nosso ponto de vista, a utilização do 1:2:2 traz diversas vantagens e tem vindo a potencial um incremento da qualidade de jogo de diversas equipas, bem como do nível de jogo em geral. Todavia, a focalização excessiva do jogo no 5×4 tem trazido alguns pontos negativos ao futebol de praia, nomeadamente quando os guarda-redes que assumem a organização do jogo da sua equipa não são dotados tecnicamente (o que se verifica com grande frequência em selecções de nível médio e em muitas equipas à escala nacional nos diversos países europeus).
Além disso, quando o 1:2:2 é montado sem noções claras de como tirar partido da superioridade numérica, ou apenas com o intuito de permitir o remate do guarda-redes, a disposição dos jogadores neste sistema acaba por conduzir a uma anarquia mal disfarçada, que não se traduz na pretendida melhoria dos resultados.
Este último problema acaba por afectar inúmeras equipas, incluindo as selecções de topo a nível mundial, que por vezes parecem sentir dificuldades para perfurar a organização defensiva adversária. Tal facto leva-nos ao ponto culminante desta nossa argumentação: o 1:2:2, enquanto inovação que se tornou moda, tem vindo a ser cada vez mais estudado, o que possibilita a identificação de formas de o anular.
Se é verdade que uma jogada rápida ao primeiro toque conduzida com inteligência pode ser indefensável, assim como um remate atrás da linha do meio campo quando se cria espaço para tal, a tendência será no sentido do aperfeiçoamento dos sistemas defensivos por forma a anular esta táctica.
Por outro lado, não se tem assistido, nos últimos 2 anos, a uma evolução do sistema 1:2:2, que parece ter-se tornado estéril, estandardizado em torno de moldes repetidos ao longo do tempo, em vez de potenciar novos desenhos de jogadas que gerem o dinamismo pretendido para o futebol de praia.
Que futuro para o 1:2:2 ?
Para rematar, sugerimos uma nota de reflexão: a selecção do Brasil, saindo a jogar no âmbito de um sistema convencional 3:1 ou 1:2:1, mantendo os seus jogadores em constante rotação pelas várias posições, acaba por conseguir inovar o seu jogo a cada jogada de uma forma que, neste momento, não está ao alcance das suas congéneres. Poucas excepções se poderão contar, sendo a mais evidente a acção do trio da selecção portuguesa composto por Jordan, Léo e Bê Martins.
A grande questão acaba por se centrar no modo como o 1:2:2 irá moldar o futebol de praia nos próximos anos: continuará a padronizar a modalidade e a restringir a dinâmica dos jogos, ou acabará por cair em desuso, vítima da crescente eficácia dos sistemas defensivos para o anular?
O mais interessante seria, sem dúvida, uma nova reinvenção do papel do guarda-redes, que conjugasse os desequilíbrios do 5×4 com novos designs tácticos e margem para criatividade.