Mulheres na F1: Não basta querer, é preciso fazer!

Luís MouraAgosto 31, 20236min0

Mulheres na F1: Não basta querer, é preciso fazer!

Luís MouraAgosto 31, 20236min0
Luís Moura avalia a actualidade das Mulheres na F1 e a necessidade de começar fazer algo sério pela sua inclusão

A Fórmula 1 é uma entidade que promove a formação, mas que ostraciza a progressão e reduz (involuntariamente) a importância da mulher no futuro, no mais progressista dos desportos motorizados, que por estes dias vê o WEC e a Indy como principais alternativas para as jovens pilotos que ambicionam fazer das corridas uma carreira.

Em novembro de 2022, a Fórmula 1 (F1) anunciava através dos seus órgãos de comunicação a criação de uma categoria destina a mulheres, com o intuito de formar jovens pilotos e prepará-las para competir ao mais alto nível. Um projeto altamente acarinhado e recebido, de certa forma, em êxtase pelo comum fã da modalidade.

Inclusivo e com valores progressistas que assentam nas características do rejuvenescimento do público-alvo da competição, a F1 Academy herdava o pesado fardo do insucesso da anterior tentativa de incluir a mulher no cenário elitista da antiga F1- a fórmula destinada aos milionários que viam nas corridas o seu entretenimento e um bom destinatário para os seus investimentos- a WSeries. Extinta no final da época de 2022 não teve o êxito esperado.

Acompanhou a F1 em algumas das suas provas, proporcionou às atletas o convívio com grandes nomes do desporto e, principalmente, mediatizou algumas pilotos, como é o caso de Jamie Chadwick. Mas é factual que não passou disso. Não passou da tentativa de criar impacto mediático que acabou por cair em esquecimento.

Dos adeptos, mas não só. A maior prova disso, é o facto de apenas Chadwick (vencedora das duas edições realizadas) permanecer na memória dos poucos que acompanharam a competição. Jamie não viu a sua carreira afetada (positivamente) em grande escala. Conseguiu assinar contrato com a Williams Racing para desempenhar as funções de piloto de desenvolvimento (nada mais é do que passar infindáveis horas à frente de um simulador e esporadicamente marcar presença nos grandes prémios de F1). Sem nenhuma porta aberta no seio da F1, a bicampeã da WSeries foi obrigada a emigrar para os Estados Unidos para competir na Indy NXT (competição de formação da Indy Car, equivalente à F2).

À data do artigo, Chadwick ocupa a 13ª posição do campeonato, entre os 25 pilotos inscritos. A duas vezes campeã da WSeries é a única mulher a competir na Indy NXT. Chadwick é um dos rostos do desaproveitamento de talento feminino nas competições geridas pela F1, mas não é caso único. E que o diga Tatiana Calderón, mais um exemplo de emigração para a orbita da Indy Car. A piloto colombiana tem um trajeto similar a Chadwick, pese embora, não tenha participado em nenhuma competição, apenas e só, destinada a mulheres.

Começou a correr em 2010 nos karts fazendo o caminho habitual, até alcançar as fórmulas de promoção. Sem oportunidade de chegar à F1, a não ser como piloto de desenvolvimento da Alfa Romeo, atravessou o atlântico para correr pela AJ Foyt Racing. A equipa americana viria a perder o main sponsor, o que levou ao afastamento de Calderón da equipa, por falta de patrocínio.

Foi neste contexto (com falta de oportunidades para as mulheres) que Susie Wolff assumiu o cargo de diretora geral da F1 Academy. A ex-piloto- exemplo de competência feminina na F1- foi uma das poucas mulheres a ter a oportunidade de guiar um carro de Fórmula 1. Com expectativa alta, cedo se percebeu que as mudanças implementadas para a F1 Academy não eram significativas, muito pelo contrário, eram um downgrade em relação à WSeries. Principiando com a incompreensível falta de transmissão televisiva, exceto na derradeira prova do campeonato, à competitividade dos carros, o projeto da F1 Academy nasceu com o sucesso hipotecado.

Até ao momento, deu a conhecer muito pouco das qualidades e características das suas atletas. Com cinco equipas e quinze pilotos a F1 Academy está à parte da esfera da F1. Só vai acompanhar a competição mãe no Grande Prémio de Austin, numa completa alienação do objetivo principal da competição. Incluir a mulher no panorama do desporto. Daí acreditar no total fracasso do projeto, que prometia mundos e fundos, e que acabou por “parir” uma montanha cheia de nada. Uma montanha que ajuda a bloquear o caminho árduo que as mulheres têm vindo a percorrer, até então, por um desporto mais inclusivo e com paridade de géneros.

Promover os contactos com equipas de F1 para permitir ás pilotos passar horas a dar voltas num simulador (como prometido por Susie Wolff), ou competir para vencer sem progressão não vai beneficiar as mulheres no longínquo percurso até almejarem chegar “às pista”. Assim, a F1 é uma entidade que promove a formação, mas que ostraciza a progressão e reduz (involuntariamente) a importância da mulher no futuro, no mais progressista dos desportos motorizados, que por estes dias vê o WEC e a Indy como principais alternativas para as jovens pilotos que ambicionam fazer das corridas uma carreira.

A ideia de que fisicamente a mulher é inferior ao homem, e que por isso é incapaz de competir “mano a mano” no desporto motorizado é uma falácia. Michèle Mouton, piloto francesa duas vezes campeã do mundo , é um caso que demonstra que a igualdade, entre homens e mulheres nos motores, é uma realidade, e não uma utopia. Com a falta de atitude e de agenda mediática das grandes chefias da F1, da liberty e da própria FIA,  leva-se a querer que a vontade de ter mulheres nas pistas poderá não ser assim tanta. Não basta dizer que se quer, é preciso querer-se e, principalmente, fazer-se.


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