Federação Portuguesa de Judo e a queda da direção: o que implica?
O Presidente e a Direção da Federação Portuguesa de Judo (FPJ) vão perder o mandato, na sequência de um inquérito a incompatibilidades feito pelo Instituto Português do Desporto e da Juventude (IPDJ), que aponta, “nas suas conclusões”, para o incumprimento por parte do presidente da direção federativa.
Cumpre-me manifestar alguma apreensão. Estamos a um ano e meio dos Jogos Olímpicos de 2024 e temo que toda esta turbulência possa, irremediavelmente, destabilizar e condicionar um processo de qualificação cada vez mais difícil, bem como ameaçar o normal funcionamento da FPJ.
Presidente da FPJ em processo de destituição
Foi com alguma supresa, confesso, que no dia 15 de novembro vi anunciado pelo IPDJ que este organismo tinha dado instruções à Assembleia-Geral da FPJ para dar início ao processo de destituição do Presidente e da Direção da FPJ. A minha supressa foi pela rapidez, rara nestes organismos, com que se chegou às conclusões que suportam a decisão. Fica a dúvida se esta celeridade se deveu à pressão e visibilidade que a carta aberta, publicada em agosto por um grupo de atletas do projeto olímpico, deu a um conjunto de situações e ocorrência graves, ou se foi o corolário de uma investigação que teve início na sequência de uma denúncia da Associação Distrital de Judo de Castelo Branco, sobre alegadas incompatibilidades que acabaram por se confirmar.
Curioso, ou não, foi que esta denúncia teve origem na Associação de Judo de Castelo Branco, cujo presidente é Abel Louro, atual treinador do judo do Benfica e da Escola de Judo Ana Hormigo e marido de Ana Hormigo, treinadora do Benfica e, até há umas semanas, treinadora da Seleção Olímpica, Sénior e Sub 23. A curiosidade vem do facto de esta Associação, bem como estes protagonistas, sempre terem sido muito próximos de Jorge Fernandes, tendo usufruído do seu apoio, quer para desenvolvimento do excelente trabalho que têm protagonizado na divulgação e crescimento do Judo na região de Castelo Branco, quer por via de nomeações para cargos de relevância na estrutura federativa.
Como tive oportunidade de referir aquando do seu conhecimento, se é verdade que a carta aberta denuncia diversas situações muito graves, que exigem, na minha opinião, uma pronta e minuciosa averiguação do IPDJ, Comité Olímpico Português (COP) e do ministério publico, a verdade é que esta “notificação”, ou decisão, acaba por, face ao conteúdo da carta, ficar aquém do que foi denunciado.
Além da consequência da carta aberta assinada por sete judocas do projeto olímpico, em agosto, a atleta revelou ainda, num texto publicado nas redes sociais, que a selecionadora Ana Hormigo foi despedida por e-mail esta segunda-feira, na véspera d… https://t.co/bkAzbXPSVi
— Expresso (@expresso) October 17, 2022
Não sei se decorrem mais investigações, mas fico com a dúvida, caso o presidente em processo de destituição volte a candidatar-se, como já anunciou (e com uma vitória quase certa, pois a vasta maioria dos delegados à Assembleia apoiam o atual presidente ao contrário da vasta maioria da opinião publica), se dentro de poucos meses não seremos, de novo, surpreendidos com mais processos e noticias pouco prestigiantes para a modalidade. É lamentável e preocupante que o Judo, que até há pouco tempo gozava de um enorme prestígio e reputação face ao notável conjunto de resultados que vinha a acumular nos últimos anos, se encontre nesta situação. Independentemente de outras considerações, penso que Jorge Fernandes deverá refletir se a sua presença na estrutura federativa não estará, atualmente, a ter um impacto negativo e a lesar a modalidade. Será que vamos ter “sangue novo” na Federação?
Circuito Mundial
Em novembro o Circuito Mundial visitou a capital do Azerbaijão, Baku. Uma etapa sempre difícil, muito competitiva, com muitos judocas do “antigo” bloco de leste a participarem. Portugal levou 7 judocas e o destaque foi inteiramente para as duas judocas do Sport Lisboa e Benfica, Telma Monteiro e Rochele Nunes, que terminaram de prata, respetivamente nas categorias femininas dos 57Kg e +78Kg.
Começando pela judoca dos 57Kg, a notável Telma Monteiro, assistimos a uma prova cabal que evidenciou que a sua aposta para estar presente pela 6.ª vez consecutiva nuns Jogos Olímpicos, é para levar a sério, muito a sério. A sua prestação foi imaculada e só na final, frente à fortíssima canadense de origem japonesa, Christa Deguchi, campeã do mundo em 2019, acabou por ser derrotada, já no golden score, por acumulação de castigos. Um grande desempenho de Telma, que celebrou a passagem à final com muita emoção, claramente a passar uma mensagem para quem a tem desvalorizado, ou já lhe vaticinava um penoso final de carreira.
Rochelle Nunes, que participou numa categoria de peso pouco concorrida, acabou fazer valer o estatuto de cabeça de série no sorteio. No entanto, foi surpreendida na final pela judoca Sérvia Milica Zabic, que já acumulava um total de 4 derrotas com a judoca portuguesa. Fica um sabor agridoce pois o ouro era alcançável, mas no Judo somos surpreendidos com muita frequência…
Como aspeto menos positivo há a referir, a prestação de Jorge Fonseca e a de Catarina Costa, que apesar de se apresentarem como cabeças de serie do sorteio, acabaram por ser derrotados, logo no primeiro combate.
Equipa feminina do Sport Lisboa e Benfica de Bronze na Champions League
Depois dos êxitos da equipa masculina do Sporting Clube de Portugal, nas edições de 2018 e 2019 da mais importante competição de clubes da europa, onde conquistou o primeiro lugar, desta vez foi a equipa feminina do Sport Lisboa e Benfica, liderada por Telma Monteiro, que terminou esta importante competição de equipas, que decorreu em Gori na Geórgia, num notável 3.º lugar. A equipa do Benfica, para além de Telma Monteiro, Barbara Timo e Rochele Nunes, contou com duas aquisições de luxo, a Hungara Reka Pupp e a britânica Katie-Jemima Yeats-Brown. Parabéns ao Benfica e a estas autênticas guerreiras, que foram a jogo sem judocas suplentes!
No entanto, tenho de deixar uma nota de desagrado e alguma inquietação para o que se passou no encontro entre as equipas do Fighter (Georgia) e do PSG-Paris Saint Germain (França). O combate deste encontro entre os judocas Guram Tushisshvili e Teddy Riner, velhos conhecidos, da categoria de +100Kg, ficou marcado por uma desastrosa decisão a favor do georgiano, que combatia em casa… . Um movimento proibido, que dá direito a desqualificação direta (Hansoku-make), foi ignorado e transformado numa vantagem, a poucos segundos do fim, para o georgiano. O que se passa com a arbitragem? Para que serve o VAR?
Campeonato nacional de equipas
A nível interno, destaque para as sempre emocionantes competições de equipas, que voltaram em força nos meses de outubro e novembro. No que respeita ao escalão sénior, a vitoria foi para o Benfica em femininos, e para o Sporting em masculinos. No escalão de Juniores, o Algés venceu em femininos e o Sporting em masculinos. Por último, no escalão de Juvenis, destaque para a vitoria do 4Judo em femininos e para o Judo Clube Pragal em masculinos. Parabéns a todos e a quem esteve nas bancadas, que tornou as competições ainda mais emocionantes!
Para terminar, nota para o Campeonato Nacional de Séniores, em tempos a mais prestigiada e importante competição interna, que irá decorrer no fim-de-semana de 3 e 4 de dezembro, imagine-se, em Coimbra. Hoje é uma competição que perdeu o carisma, com categorias de peso com um número de atletas residual o que, infelizmente, não é positivo para a promoção da modalidade e para que, internamente, o nível competitivo seja alto. Está na altura de repensar o modelo competitivo do campeonato nacional de séniores, de modo que esta prova recupere a competitividade e entusiasmo de outros tempos.