Edith Nunes e o auge do basquete feminino paraguaio

Lucas PachecoJaneiro 19, 20235min0

Edith Nunes e o auge do basquete feminino paraguaio

Lucas PachecoJaneiro 19, 20235min0
Uma lenda do basquete do Paraguai, uma das maiores atletas do basquetebol sul-americano, Edith Nunes deixou uma marca que Lucas Pacheco relembra

Quem acompanha basquete feminino, associa imediatamente a figura de Paola Ferrari ao Paraguai. Sua longevidade e talento no circuito europeu transformaram-na em sinônimo de basquete feminino do pequeno país sulamericano. É preciso retornar às longínquas décadas de 50 e 60 para achar outra referência na modalidade. Ninguém menos que a cestinha do Mundial de 1957, disputado no Rio de Janeiro: a paraguaia Edith Nunes.

Raras são as informações disponíveis sobre a atleta na internet. Se para o basquete feminino atual há pouca repercussão, o que esperar dos primórdios da modalidade? Edith Nunes jogou seu primeiro Mundial na edição inaugural em 53, no Chile, com apenas 14 anos; foi em 57, porém, que ela se destacou, já com 18 anos de idade. O Paraguai passou pela fase classificatória com uma vitória sobre a Austrália e, após o heptagonal final, terminou o torneio na honrosa sexta posição. Em um time com média de 48,8 pontos por jogo, Edith responsabilizou-se por quase 50%, finalizando com média de 23,4.

Nossa imaginação precisa de estímulo para tantas diferenças em relação ao basquete atual. Seja pela idade de Edith em seu primeiro Mundial, seja pela baixa pontuação, ou ainda por um país distante dos principais torneios figurar em boa posição. Sem a contextualização histórica, não entendemos esse momento inicial da modalidade e das incipientes competições internacionais.

Foto: Proballers.com

Até mesmo a seleção campeã, os Estados Unidos, encontrou obstáculos impensáveis hoje. Longe do profissionalismo e anterior à emenda Title IX (que obrigou o investimento igualitário entre os gêneros no esporte universitário), as principais jogadoras recrutadas advinham de universidades de cunho religioso, voltadas exclusivamente ao público feminino; e nos elencos bicampeões em 53 e 57 só havia jogadoras brancas. As jogadoras norte-americanas precisavam, ainda, adaptar-se a regras diferentes, como o drible ilimitado e a possibilidade de circulação na quadra toda.

Por outro lado, ia gerando-se em 57 o principal confronto da história do basquete feminino de seleções, EUA x URSS, com vitória das americanas por apenas 3 pontos. Os EUA sagraram-se bicampeãs com o mesmo técnico (John Head) e apenas uma jogadora do elenco de 53 (Katherine Washington, a mais velha do time, com módicos 24 anos). A MVP foi a americana Nera White.

Foto: ProBallers.com

Outra jogadora americana campeã em 57, Rita Alexander, conheceu seu futuro marido, conterrâneo que trabalhava no Rio de Janeiro para o governo de seu país. Já como Rita Alexander Colman, ela rodou o mundo acompanhando o marido e retornou ao Rio de Janeiro, ocasião em defendeu o Fluminense. Na final do Campeonato Carioca de 60, ela marcou 8 pontos na final contra o Botafogo.

Voltemos ao Paraguai, que viveu sua melhor fase na modalidade nesse período, tendo inclusive se sagrado campeão sul-americano em 52, título que se repetiria em casa em 62, no último torneio da carreira de Edith Nunes. Novamente, ela teve papel fundamental: a cesta do título, no último jogo, contra o Brasil, veio de suas mãos, em uma bola de longa distância no lance derradeiro, virando o jogo. Após o título, a pivô de 1,85m casou-se e aposentou-se das quadras.

O basquete feminino sul-americano era então bem disputado, sem a hegemonia que o Brasil alcançaria anos depois. O Chile sediou o primeiro Mundial (8 das 10 seleções participantes egressas do continente americano) e conquistou a prata.

Edith Nunes (direita) (Foto: Arquivo Pessoal)

Na campanha de 57, o Brasil entrou direto no heptagonal final, finalizando em quarto lugar, tal qual na edição de 53. A brasileira Zilda Ulbrich, conhecida como Coca, foi escolhida a segunda melhor jogadora do torneio. Inimaginável hoje, Zilda fez parte das seleções brasileiras de basquete e vôlei, e auxiliou as anfitriãs à campanha de 3 vitórias (Hungria, Paraguai e Chile, todas apertadas) e 3 derrotas (para as seleções do pódio – EUA, URSS e Tchecoslováquia). No jogo final, pela disputa do bronze, o Brasil foi derrotado após vencer o primeiro tempo e levar a virada.

A evolução da modalidade trouxe boas novidades ao Brasil, que após consolidar-se como potência no continente, faturou o Mundial quase 40 anos depois de sediar a segunda edição. Se os brasileiros foram agraciados, nossos vizinhos praticamente sumiram do mapa. A tal ponto chegou, que mesmo o resgate de figuras históricas, como Edith Nunes, esbarram em parcas notícias. Felizmente, além do talento, Paola Ferrari mostra-se ídola também ao recuperar suas antecessoras, as pioneiras que desbravaram a modalidade em terras paraguaias.


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