O movimentado recesso e o retorno da Euroliga

Lucas PachecoJaneiro 12, 20256min0

O movimentado recesso e o retorno da Euroliga

Lucas PachecoJaneiro 12, 20256min0
Recomeça a Euroliga e Lucas Pacheco coloca-te a par de todas as movimentações e novidades das equipas ainda a disputar a prova

Após o recesso do final de ano, a Euroliga retornou na segunda semana de janeiro. Seguimos na segunda fase de grupos, que classifica as quatro primeiras colocadas para a(s) próxima(s) fase(s); porém, muita coisa mudou na competição e nas equipes durante a passagem de ano. A bem da verdade, esse fenômeno de mudanças acontece em todas as temporadas; mantendo a tradição, o clube com mais alterações em relação à última rodada de 2024 foi o Çukurova Mersin.

Segundo grande favorito ao título, com dinheiro de sobra, o clube turco não consegue estabilizar o time e garantir condições de crescimento orgânico. Perante qualquer obstáculo, a opção é pela troca da comissão técnica. Não foi diferente desta vez: algumas derrotas da liga nacional causaram a demissão de Victor Lapeña, a despeito da invencibilidade na Euroliga. Acrescente ainda a ausência de Kayla Thornton, Regan Magarity, Karlei Samuelson e Marina Johannes na partida inaugural de 2025 (algumas dessas por contusão, outras por rescisão contratual) e temos um conjunto completamente diferente àquele que encerrou o ano com um atropelo sobre o Schio. Agora, o trabalho em Mersin recomeça do zero, com quatro meses até a finalíssima (Bridget Carleton chegou para reforçar o elenco).

Novidade mesmo foi a exclusão da equipe polonesa Polkowice da Euroliga, a pedido do clube, sob alegação de falta de dinheiro. De fato, nas duas últimas partidas o time jogou com apenas 5 jogadoras de rotação, com duas das três principais sem aparecer. Algo estava errado e a confirmação chegou junto com 2025. A cada dia fica mais evidente a derrota da Euroliga na competição pelas melhores atletas – Emma Cannon, destaque do Polkowice na competição, fez as malas e migrou para o atraente mercado chinês. Com isso, o grupo F conta agora com 5 times, com os resultados prévios envolvendo a equipe polonesa descartados.

A dificuldade em manter as extra-comunitárias aumenta a cada dia; as contratações pontuais de final de ano, típicas da Euroliga, restringiram-se às europeias ainda sem clube. O Fenerbahçe, grande favorito, adicionou outra excelente pivô à sua rotação já cheia e a alemã Nyara Sabally chegou na equipe comandada por Valeria Garnier. A equipe carece de mais peças na rotação do perímetro, mas a exiguidade do mercado não permitiu contratações dessas posições. A terceira força da competição fez uma contratação de peso: a alemã Leonie Fiebich reforçou o Valencia. Sua incorporação ainda vai precisar de ajustes e, na estreia, uma larga derrota para o concorrente Fenerbahçe (92 x 56), numa atuação discreta de alemã.

Mersin também venceu com facilidade o Landes (53 x 73), com desempenho notável de Natasha Howard (24 pontos e 14 rebotes); na parte de baixo da tabela, na luta pela classificação, o Avenida deu-se melhor contra o Zabiny Brno (64 x 58). No duelo mais equilibrado da rodada, o Zaragoza saiu vitorioso contra o USK Praga (73 x 68); a nota triste do encontro pesou sobre a contusão da ala espanhola Maria Conde. Na melhor temporada da carreira, tendo desenvolvido seu playmaking e assumido maiores responsabilidades ofensivas, a espanhola saiu de quadra empurrada em cadeira de rodas, sem poder contribuir na tentativa de virada de seu Praga. Sem informações sobre a gravidade da lesão, os exames podem vaticinar o destino do time tcheco na competição.

O grande jogo da rodada, a meu ver, foi o confronto direto entre Schio e Bourges, com campanhas idênticas até então. As duas equipes não possuem os elencos mais fortes da competição, mas conseguiram atingir um padrão de jogo e uma identidade tática que compensam a ausência de grandes estrelas. Bourges, comandado pelo notável crescimento da armadora Pauline Astier, faz uma campanha acima dos prognósticos iniciais, confirmada pelo primeiro tempo excelente na Itália. A equipe comandada por Olivier Lafargue foi ao intervalo com 11 pontos na frente, sem dar chances às italianas.

Em grande parte, a receita do sucesso repetiu a fórmula que vem sendo utilizada para conter o Schio (executada à perfeição por Mersin na rodada anterior): apertar a marcação nas alas Kitija Laksa e Janele Salaun, principalmente sem a bola, evitando os arremessos livres de três pontos, característicos do time de Georgios Dikaioulakos. A fórmula exige velocidade e timing para trafegar por bloqueios indiretos. No ataque, cause desequilíbrios na rotação, finalizando com ataques sobre a fraca defensora Laksa. Parecia que o jogo estava ganho àquela altura.

A volta do intervalo trouxe uma mudança à dinâmica da partida e, ainda que o ataque seguisse empacado, o Schio conseguiu anular as principais armas ofensivas do Bourges. A ala-armadora Morgan Green (17 pts e 9 ast) e a ala Amy Okonkwo (22 pts) anotaram a maioria de seus pontos no primeiro tempo, sem repetir a eficácia no segundo. A defesa italiana voltou outra do intervalo: individualmente com mais disposição e atenção, evitando cortes simples; coletivamente, com ajuda para fechar as linhas de infiltração. Mudança sutil, mas que se mostrou determinante no quarto período.

O Schio recebeu, com o torneio em andamento, a armadora Ivana Dojkic e a pivô Dorka Juhasz, importantes peças para uma rotação até então curta. Acontece que o time encontrou o melhor entrosamento muito cedo na temporada e as chegadas mudaram o padrão da rotação. Dikaioulakos tem mexido nos quintetos titulares desde então, num sistema de peso e contrapeso para equilibrar um elenco carente de uma definidora nata, de uma estrela. Nas últimas rodadas, por exemplo, ele optou por Dojkic e Juhasz, formando um quinteto com menos atleticismo para cobrir as deficiências defensivas de Laksa. A falta de acerto deixou marcas no primeiro tempo contra o Bourges. O time só foi encontra seu melhor ritmo (pace) no quarto quarto.

Os arremessos de três começaram a cair, a armadora Constanza Verona ditou o ritmo e melhorou a defesa, Juhasz conseguiu pontuar próxima à cesta e roubar bolas decisivas. Foi uma tempestade: em 4 minutos, a diferença que chegara a 15 pontos desmanchou. Bourges saíra do prumo e não conseguiu pontuar no segundo tempo inteiro (19 pontos em 20 minutos); Astier tentou protagonizar o ataque, sem sucesso (os 3 desperdícios dela ocorreram nos dez minutos finais). O Schio enfim impôs sua belíssima movimentação ofensiva, explorando a gravidade de Laksa (a confiança depositada nela pelo técnico, bem como sua evolução, merece um texto à parte).

O resultado final (67 x 62) foi alcançado graças à última parcial (27 x 9). No momento em que mais precisou, os desafogos ofensivos do Bourges tinham sido anulados pela defesa italiana. Assim, o Schio abriu vantagem na tabela de classificação e figura no momento na segunda posição do grupo E. O jogo de abertura do ano da Euroliga merece ser visto.


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