A campeã voltou: a nova dinastia da WNBA

Lucas PachecoOutubro 26, 20258min0

A campeã voltou: a nova dinastia da WNBA

Lucas PachecoOutubro 26, 20258min0
Lucas Pacheco e o início de uma nova dinastia da WNBA, agora a partir de Las Vegas com as Aces

A temporada 2025 da WNBA terminou de maneira surpreendente, coroando um campeão insuspeito, a despeito de sua dominância nos anos recentes. Quando todos apostavam em New York Liberty ou Minnesota Lynx, finalistas de 2024, eis que o Las Vegas Aces ressurgiu das cinzas e faturou o terceiro título em quatro anos (22, 23 e 25).

O desfecho que contrariou o início da temporada: o Aces começou o ano com um basquete deprimente, chegando ao cúmulo de risco de eliminação antes dos playoffs. Ali pela metade da fase regular, a equipe acumulava campanha zerada (14 vitórias e 14 derrotas), lutando pela oitava posição. Era esperada uma queda, devido às várias mudanças sofridas no elenco na offseason, a começar pela despedida de um dos pilares do time bi-campeão; Kelsey Plum solicitou uma troca, em busca de maior protagonismo, e acabou em Los Angeles. Para seu lugar, uma ala tão talentosa quanto, com currículo vitorioso, mas que saiu pelas portas do fundo de sua antiga franquia. Jewell Loyd demoraria a achar seu lugar na equipe.

Além de Plum, a técnica-toda-poderosa Becky Hammon, que praticamente ditou os rumos do Aces durante a montagem do elenco, perdera duas peças importantíssimas de sua curta rotação: Tiffany Hayes e Alysha Clark preferiram sair, deixando uma lacuna difícil de preencher. Elas preenchiam duas funções importantíssimas no esquema vitorioso de Hammon, propiciando o small ball e a fagulha vinda do banco.

O começo não foi nada auspicioso e a equipe parecia prestes a desmoronar. Nem o big three composto por Chelsea Gray, Jackie Young e A’ja Wilson conseguia imprimir o ritmo necessário para competir contra as forças da temporada – Liberty e Lynx, além do Phoenix Mercury, com sua inusitada junção de três craques e um elenco de apoio com faca nos dentes. No dia 02 de agosto, o Aces sofreu uma derrota vexatória para o Lynx, por 111 x 58 – há males que vêm para o bem.

O vexame serviu para mudar a chave do time. Àquela altura, a direção da franquia já trocara uma escolha futura de draft pela pivô NaLyssa Smith, desprestigiada na liga; Becky Hammon já introduzira mudanças na rotação, com a inserção de Kierstan Bell no quinteto titular, puxando Jewell Loyd para a sexta jogadora (a tal da fagulha que faltava). A alteração fez renascer uma jogadora esquecida do elenco (Bell) – mesmo com pouca minutagem, ela mostrou seu melhor basquete na WNBA – e deu liberdade para o anseio de Loyd por arremessos e definição. Faltava achar uma defensora capaz de conter alas-pivôs na formação “baixa” (small ball, com Wilson isolada no garrafão), ajuste que levou um pouco mais de tempo, porém se comprovou essencial nos playoffs.

Chelsea Gray, a armadora principal, encarregou-se desse fardo; sua altura e força, antes utilizada para dominar no ataque, virou uma força também na defesa. O papel antes desempenhado por Clark passava à incumbência de Gray. Jackie Young e A’ja Wilson, após a derrota para o Lynx, subiram sua produção a níveis estelares e consolidaram-se como a melhor dupla da WNBA. A’ja Wilson iniciava ali sua caminhada para abocanhar o quarto prêmio de MVP (Most Valuable Player)

O feito, inédito na história da liga, torna-se ainda maior se pensarmos que as outras jogadoras com três MVPs pertencem a outras eras da WNBA, ainda na fase inicial (Sheryl Swoopes, Lisa Leslie e Lauren Jackson). Some a terceira conquista de DPOY (Defensive Player of the Year), melhor defensora do ano, e o segundo MVP das finais e temos as credenciais para a futura GOAT (greatest of all time) da WNBA – a melhor jogadora de todos os tempos. Isso com 29 anos e uma longa carreira pela frente.

Catapultado pela ascensão de Wilson e pelas mudanças de Hammon, o Las Vegas Aces cresceu vertiginosamente na reta final da temporada regular, acumulando 16 vitórias consecutivas. A sequência se mostraria essencial para o título, vez que garantiu a segunda colocação da fase regular (e adiaria um possível confronto contra Liberty – algoz em 2024 – e Lynx – líder da fase regular com um basquete impecável – para a final). O Aces, montado sem muito planejamento, com diversos buracos em seu elenco, soube se reinventar e esconder suas fragilidades, evidentes nas duas rodadas iniciais dos playoffs.

Contra o sétimo colocado, o Aces safou-se na posse final do jogo 3, a partida desempate. Após uma vitória tranquila na inauguração da série, a equipe viu o Seattle Storm virar o jogo 2 e ter a chance da vitória na posse final do jogo 3. Por sorte, Gabby Williams errou o arremesso e o Aces avançou à semi-final. Lá, outra conspiração do destino: o desfalcadíssimo Indiana Fever surpreendeu e eliminou o favorito Atlanta Dream.

 

O que parecia ‘favas contadas’ tornou-se um suplício: o Indiana, repleto de jogadoras e contratos temporários, para completar o elenco devido às múltiplas contusões, levou a série à prorrogação do jogo 5! Sem as três armadoras (Caitlin Clark, Sydney Colson e Aari McDonald), sem suas pivôs de espaçamento (stretch bigs) Damiris Dantas e Chloe Bibby, sem a opção do small ball (Sophie Cunningham), o Fever ainda perdeu sua estrela Kelsey Mitchell no 4Q do jogo 5, machucada. O outro pilar, a pivô Aliyah Boston (única que conseguiu brecar o jogo de A’ja Wilson durante a temporada), saiu eliminada por faltas – e ainda assim, somente na prorrogação o Aces garantiu a vaga na final.

Estava predestinado o título do Aces: do outro lado do chaveamento, o Phoenix Mercury eliminara o New York Liberty e o Minnesota Lynx. Os méritos do Mercury não devem ser minimizados: liderado pela exuberante e intransponível Alyssa Thomas, secundado por Satou Sabally e Kahleah Copper, e um elenco de apoio ciente de suas funções, o time comandado por Nate Tibbetts chegou à final baseado na defesa fortíssima e na jogada que desmontou Liberty e Lynx – o pick and roll invertido.

A jogada foi a marca registrada do Mercury, colocando a armadora (Sam Whitcomb ou Monique Akoa Makani) para bloquear a ala-pivô Alyssa Thomas, que atacava o garrafão. Tanto as bandejas de Thomas quanto as variações e jogadas secundárias (demais espaçadas, prontas a arremessar ou infiltrar) precisavam de um antídoto caso o Aces almejasse triunfo.

Becky Hammon pode (deve) ser criticada como GM, mas sua prancheta segue uma das melhores do basquete. Ela orientou suas armadoras a antecipar o bloqueio e buscar o roubo antes de Thomas infiltrar. Dana Evans brilhou nessa função, assim como Loyd; um possível mismatch de Thomas (na formação baixa de Las Vegas) foi anulado devido às mãos, tempo de bola e força de Gray. Excluídas suas principais armas ofensivas, o Phoenix precisaria fechar tudo na defesa – Young e Wilson não permitiram.

O jogo 1 mostrou-se fatídico (The Morning After: Dana Evans wasn’t always on track to be the hero of Aces’ Game 1 WNBA Finals victory – Yahoo Sports): o Aces virou no final e daí em diante tratou de consolidar sua superioridade, vencendo a série na varrida por 4×0. Era um confronto desigual, um dos poucos em que o Las Vegas Aces tinha clara vantagem.

O título mesclou sorte e ajustes finos, que esconderam as deficiências na formação do elenco, essenciais para a terceira conquista em quatro  anos. Longe da dominância de 2022 e 23, distante do melhor basquete visto na temporada (praticado pelo Lynx), o Aces soube se reinventar durante o ano. O merecido título premia a melhor jogadora da atualidade, líder de um esquadrão que tem tudo para sonhar com mais no futuro próximo.

A intertemporada deve ser das mais movimentadas da história; se dentro de quadra testemunhamos o ressurgimento de uma dinastia, fora dela também devemos entrar em uma nova era da WNBA. As jogadoras lutam pelo reconhecimento do crescimento exponencial vivido pela liga nos últimos anos e duelam contra os donos do dinheiro por uma divisão menos desigual. Não se descarta um lockout; as negociações do novo acordo coletivo aquecerão os próximos meses. Aguardemos os novos capítulos.


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