O Rayo Vallecano, um clube feito para todos os gostos pt.2

Ricardo LopesMaio 14, 20236min0

O Rayo Vallecano, um clube feito para todos os gostos pt.2

Ricardo LopesMaio 14, 20236min0
Ricardo Lopes conta-nos a história do Rayo Vallecano em duas partes, um clube de esquerda mas que luta por todos os adeptos

Na primeira parte deste artigo abordámos os ideais do Rayo Vallecano, além de uma pequena análise ao seu plantel.

As balanças de transferências até podem ser ligeiramente negativas, mas não são valores que façam a diferença no patamar de equipa de LaLiga (exceto a desta época, especialmente aos oito milhões de euros investidos em Raúl de Tomas). Porém, não nos podemos esquecer do espetacular mercado de 2019/20, que conseguiu vinte e três milhões de euros em vendas: dez milhões por Embarba, nove milhões e setecentos mil euros por Álex Moreno e três milhões de euros por Kakuta. Este valor elevado cobra os investimentos realizados nos últimos anos. Excetuando o pesado valo dado por De Tomas, a transferência mais cara no espaço recente foi na ordem dos três milhões de euros, em Luís Advíncula (que passou por Portugal). Nota que em 2020/21, época em que conquistaram a subida, o investimento realizado foi zero.

Existem três jogadores que estiveram em Portugal e que atuam no Rayo Vallecano e nenhum deles foi grande destaque por cá, seguindo a tradição de contratações. Iván Balliu representou o Arouca entre 2013 e 2015, estando no emblema desde 2021 e transformando-se num indiscutível. Mumin foi contratado esta temporada ao Vitória SC e a pouco e pouco soma minutos, algo difícil com a dupla sólida que Lejeune e Catena fazem. De Tomás atuou no Benfica em 2019, após curiosamente uma grande passagem pelo Rayo e regressou no último mês de Janeiro por oito milhões de euros, quando tinha um valor de mercado de vinte cinco milhões de euros, podendo em 2023/24 ser a estrela, caso regressa à forma de 2018/19.

Podemos afirmar com segurança que o grande segredo do sucesso do Rayo Vallecano, além da inteligência na construção de plantel e manutenção dos valores identitários é a qualidade do seu treinador. Andoni Iraola chegou ao cargo em 2020/21, após um grande trabalho realizado no Mirandés, equipa que na época se esperava que ia descer de divisão: alcançou dezassete vitórias em quarenta e sete jogos, ficando num muito confortável décimo primeiro lugar.

As ideias de Iraola desde essa altura até hoje não mudaram. Taticamente utiliza um 4-2-3-1 (com um forte duplo pivot) que se transforma num 4-4-2 com relativa facilidade na hora de pressionar e defender alto, porém Iraola exige raça aos seus jogadores, que lutem pelo resultado em todos os jogos. Iraola já admitiu que a sua grande inspiração como treinador é Patrick Vieira, que foi seu técnico no New York City.

Tal como Vieira, Iraola confessou que gosta de ver as equipas de Marco Rose jogar, nomeadamente na era do treinador no Borussia Monchengladbach. Ao nível tático os estilos até podem ser semelhantes, contudo a garra e raça que consegue impor aos seus jogadores vem da sua experiência com outro mentor: Marcelo Bielsa. Iraola passou grande parte da sua vida como futebolista no Athletic Bilbao onde se cruzou com o argentino. O antigo lateral direito gosta que a sua equipa tenha a posse de bola e que os seus laterais (nomeadamente Fran García) subam a dar apoio ao ataque, ao mesmo tempo que existem algumas trocas de posição no ataque, já que não existe um avançado com especialidade em jogo de cabeça.

As movimentações dos extremos para o centro tornam que haja um jogo muito mais interior e confuso para quem marca. Na hora de defender, dois elementos vão pressionar alto e obrigam o adversário a jogar no erro, permitindo ao Rayo Vallecano ter o controlo do jogo e do que o adversário pode ou não fazer, não dando liberdade de jogo. Iraola já se assumiu como um adepto de NFL e garante que é interessante estudar esse desporto, passando alguns elementos para o futebol.

À data da produção deste artigo, o Rayo Vallecano ocupa a nona posição da LaLiga, com quarenta e seis pontos, menos dois que o lugar de acesso à Conference League. Era difícil imaginar no inicio da temporada resultados tão positivos, porém desde a época de chegada de Iraola o caminho tem sido o progresso até este ponto.

Na época passada o décimo segundo lugar exibiu um sinal de crescimento, que se está a confirmar em 2022/23, com um bom futebol e a constante elevação do espetáculo, com atletas a crescerem de jornada para jornada. Se olharmos para jogadores como Valentín, Balliu ou Isi, os mesmos evoluíram alarvidades desde a sua estreia na LaLiga até ao dia de hoje. Não podemos considerar o clube um candidato à descida, todavia é natural que a cada Verão, a olhar para o plantel a olho nu, nos pareça que a equipa é humilde. O que leva ao afastamento deste pensamento é a existência de um grande trabalho feito por detrás, com Iraola como protagonista, que leva a que o Rayo seja uma equipa que transmita tranquilidade na tabela, com possibilidade de algo mais.

Esta situação só deverá mudar caso aconteçam dois acontecimentos: uma saída repentina de todos os ativos valiosos e o adeus de Iraola. O primeiro ponto é difícil de ocorrer, pois o Rayo Vallecano é um clube financeiramente estável e não necessita de vender (já irá fazer 10 milhões de euros em 2023/24, com a saída de Fran García e ainda nem chegámos ao Verão), tendo que repor poucas peças, o que facilita o trabalho do scouting, habituado a encontrar ouro em divisões mais baixas, como ocorreu com tantos elementos do plantel que compões atualmente o Rayo Vallecano.

Já a segunda hipótese, a saída do principal líder do clube, também parece algo que não irá acontecer a curto prazo. Iraola rejeitou o Leeds esta temporada, querendo manter-se no Rayo. Em termos de saídas de treinadores da LaLiga, quase nenhuma equipa de um patamar superior vai mudar de treinador. Existe a ideia de que Iraola está á espera do Athletic, algo que não deverá acontecer para já, pois Valverde já renovou e não sairá no final da época.

Mesmo que o treinador acabe por sair (termina contrato no final da época, mas deverá ter proposta de renovação), a direção do Rayo Vallecano terá que mostrar inteligência para contratar alguém que possa chegar ao mesmo nível de Iraola e na LaLiga 2 há candidatos para tal e que devem estar plenamente identificados (Albés, Etxeberria à cabeça, já que transformaram Albacete e Mirandés com poucos luxos).

O Rayo é uma das equipas que melhor joga futebol na Europa, tendo em conta todas as limitações existentes, estando num dos ambientes mais complexos para os adversários, num bairro que apoia o seu clube e que enche o respetivo estádio. É aproveitar as últimas jornadas e disfrutar, esperando pelo Verão para verificar quais são as próximas peças que Iraola (ou outro) terá de aprimorar e transformar para que a máquina do Rayo Vallecano não pare de trabalhar.


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