Os pecados de Martín Anselmi

Ricardo João LopesJunho 1, 20255min0

Os pecados de Martín Anselmi

Ricardo João LopesJunho 1, 20255min0
Conseguirá Anselmi sobreviver após o Mundial de Clubes? Ou o tempo já está contado para o ainda treinador do FC Porto

Martín Anselmi garantiu ao FC Porto a terceira posição na Primeira Liga, com os dragões a falharem a Champions League pela segunda temporada consecutiva. A prestação no campeonato foi considerada como abaixo das expetativas, embora o alerta em relação à falta de qualidade (e, principalmente, profundidade) da equipa já tivesse sido dado. Somente na Invicta consideraram o clube como capaz de lutar pelo título, evitando-se expressões como ano zero.

Vítor Bruno foi a primeira vítima desta postura. O antigo adjunto de Sérgio Conceição jamais conseguiu o carinho dos adeptos e acabou por sair em janeiro de 2025, apesar dos resultados apresentados estarem longe de ser terríveis. No total, o treinador conseguiu 18 vitórias em 29 encontros e manteve inclusivamente o FC Porto na disputa por troféus. Para o seu posto, André Villas-Boas decidiu percorrer o Atlântico e contratar Martín Anselmi ao Cruz Azul, numa transferência que fez correr muita tinta, com a FIFA inclusivamente a ser envolvida em todo o processo. O argentino fazia com que os aficionados ganhassem uma nova esperança. Afinal, tratava-se de um treinador estrangeiro, com um histórico vencedor, ainda que com algumas polémicas à mistura. Está longe de ser um homem do sistema, algo que é apreciado pelo Dragão.

Descontando o Mundial de Clubes 2025, a época do FC Porto está finalizada e Martín Anselmi não provocou grande efeito no curto prazo. 10 vitórias em 18 jogos, com um futebol pouco atrativo e as bancadas do estádio cada vez mais despidas. A culpa dos maus resultados é somente do treinador? Certamente que não. Possivelmente é dos menos culpados na estrutura. Contudo, há certos aspetos em que ficou aquém.

A insistência no modelo tático é o principal. Martín Anselmi seguiu o espírito de Ruben Amorim e quis forçar o seu 3x4x3. A diferença é que o antigo técnico do Sporting tinha peças para utilizar o sistema por Alvalade. Já o argentino, nem tanto. Baixou Stephen Eustáquio no terreno, com o canadiano a nunca parecer 100% confortável na posição de líbero. Tomás Pérez veio em janeiro na esperança de desempenhar o rol, mas pouco foi utilizado. Samu Aghehowa também saiu prejudicado pela alteração tática, vendo o seu número de golos cair a pique e a perder inclusivamente a titularidade em alguns momentos (quando é de longe o melhor ponta de lança do plantel) para Deniz Gul.

Martín Anselmi nunca pareceu 100% confortável a falar com a imprensa. Apesar da formação em jornalismo e da tentativa de adaptar-se ao português o mais rapidamente possível (não quis um tradutor, quando nas primeiras semanas fazia algum sentido), as suas respostas sempre foram pouco entusiasmantes, algo vagas e curtas. O treinador jamais mostrou na sala de imprensa um olhar confiante, bem pelo contrário, exibindo certa resignação na maioria dos maus resultados, algo a ser trabalhado.

O FC Porto contou com vários casos ao longo do ano que não facilitaram a tarefa dos treinadores. Vítor Bruno não caiu nas graças do balneário, mas Martín Anselmi conseguiu evitar cair na desgraça do seu antecessor. Contudo, também falhou neste aspeto. Se a punição a Tiago Djaló foi exemplar, após ter participado na festa de Otávio, o brasileiro deveria ter sofrido com a mesma medida, já que está longe de ser o elemento mais profissional do plantel. O central já somava algumas polémicas quando jogava no Famalicão (de recordar as publicações que fazia no seu Instagram quando não foi eleito Defesa do Mês para a Liga Portugal), mas continuou a ser aposta de Martín Anselmi, embora longe da titularidade. O técnico teria aqui a hipótese de lançar um jovem da formação, o que até serviria de exemplo. Casos deste tipo nunca beneficiaram as equipas e ‘mais vale cortar o mal pela raíz’, independentemente do atleta em questão.

Rodrigo Mora foi a grande vitória de Martín Anselmi nestes cinco meses. O jovem estabeleceu-se como o melhor ativo do FC Porto, capaz de fazer a diferença em todas as partidas, a qualquer momento, merecendo a confiança inclusivamente de Roberto Martínez. É, a par de Geovany Quenda, a maior promessa do nosso campeonato e promete ser um dos melhores do mundo na sua posição, caso continue a evoluir favoravelmente. Porém, pouco mais há a retirar de positivo da etapa do argentino. Os serviços mínimos foram cumpridos (para quem nunca acreditou no cenário da disputa do título) e há muito trabalho a fazer.

Compreende-se a opção de André Villas-Boas na manutenção da equipa técnica. O projeto parenta ser a longo prazo e o FC Porto não se encontra em condições financeiras para entrar em despesas com despedimentos. Martín Anselmi já referiu que quer mudanças no plantel, mas que não necessita de muitos jogadores, preferindo uma equipa curta, mas com qualidade. Esta parece-me ser a postura correta. Os dragões têm que investir em algumas peças, mas é preferível comprar pouco, mas com qualidade garantida, do que investir em algo incerto. Além disso, seguramente elementos com salários irrealistas vão acabar por sair, como os casos de Iván Marcano ou Marko Grujic.

Martín Anselmi não provocou a revolução que se esperava no FC Porto, mas ainda tem tempo para dar ‘o grito do Ipiranga’. No entanto, terá que contar com todos a remar para o seu lado, já que a situação da instituição está bem menos simpática que a dos rivais de Lisboa, principalmente a do Sporting, que vive um ciclo vencedor, ocupando o lugar dos nortenhos no panorama futebolístico nacional. 2025/26 vai ser fundamental para o clube. Caso se mantenha o discurso terá obrigatoriamente que lutar pelo primeiro lugar e a pressão sobre Martín Anselmi será ainda maior, com uma exigência de resultados que não lhe foi pedida anteriormente. Resta saber é como o treinador vai reagir a esta situação.


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