À Procura de Contas à Moda do Porto
Nos últimos anos, os portistas têm sustido a respiração sempre que está iminente a divulgação do relatório de contas do clube. Sucessivos anos de loucuras financeiras desmedidas retiraram saúde financeira e capacidade negocial ao Futebol Clube do Porto, obrigando agora a um apertado e rigoroso controlo das contas. O caminho ainda é longo, mas o Fair Play elenca os principais pontos positivos e negativos do relatório de contas referente à temporada de 2016/2017.
4 Pontos Positivos
1) Cumprimento do acordo celebrado com a UEFA
O acordo respeitante ao fair play financeiro assinado entre a UEFA e o FC Porto obrigava a que o clube reportasse um prejuízo, excluindo entre outras coisas os custos com as atividades das camadas de formação, para o exercício 2016/2017 inferior a 30 milhões de euros. Nesse sentido, subtraindo aos 35,3 milhões de euros do resultado negativo cerca de 9,9 milhões de euros dos tais custos excluídos no acordo com a UEFA, temos que o FC Porto fechou a época desportiva 2016/2017 com um prejuízo para a UEFA de 25,4 milhões de euros. Assim sendo, o clube azul e branco não só cumpriu a meta intermédia como foi além dos objetivos acordados com a autoridade máxima do futebol europeu.
2) Redução dos custos com pessoal
Há muito que o dinheiro gasto em salários com jogadores e equipas técnicas preocupam os adeptos portistas, porém, este parece ter sido o ano da inversão. No relatório de contas apresentado, a SAD liderada por Jorge Nuno Pinto da Costa conseguiu uma redução nos custos com pessoal de 3,3%, o que equivale a uma poupança de mais de 2,5 milhões de euros nesta rubrica. Este sinal positivo pode ainda conhecer novos contornos na época 2017/2018, especialmente se tivermos em conta ao elevado número de jogadores excedentários que abandonaram o Dragão, bem como, há redução substancial do vencimento de Iker Casillas. Convém salientar que ainda há um longo caminho a percorrer para que os custos com o pessoal, atualmente à volta de 73,2 milhões de euros, sofram uma queda significativa que se coadune com a realidade desportiva portuguesa.
3) Crescimento das receitas operacionais
Se há rubrica em que o clube portista deve crescer é nas receitas operacionais, uma vez que estes proveitos permitem ao FC Porto reduzir a sua dependência em relação à transferências de jogadores para o exterior. Ora, na última temporada desportiva os azuis e brancos viram as receitas operacionais ao nível do merchandising, bilheteira e direitos de transmissão/distribuição televisiva crescerem ligeiramente (cerca de 3,7 milhões de euros no total), mesmo tendo em conta a fraca performance desportiva do clube. Por último, nota bastante positiva para os proveitos operacionais relacionados com as provas da UEFA que totalizaram 30,8 milhões de euros (+19 milhões de euros face a 2015/2016), demonstrando bem a importância de se realizar uma boa campanha desportiva na Liga dos Campeões.
4) EBITDA novamente em terreno positivo
O EBITDA (resultado antes de juros, impostos, amortizações e depreciações) é um indicador financeiro importante para prever a capacidade de uma empresa gerar lucro no futuro e de pagar os seus encargos financeiros através das suas atividades operacionais. O exercício de 2016/2017 volta a mostrar um EBITDA positivo, mais concretamente, no valor de 22,7 milhões de euros, isto depois de em 2015/2016 este indicador ter sido de -5,6 milhões de euros. Contudo, convém alertar que para que a situação financeira do FC Porto estabilize é necessário que o seu EBITDA continue a crescer no futuro. A título de exemplo, na época 2014/2015, quando a instituição azul e branca ainda respirava alguma saúde financeira, o EBITDA cifrou-se nos 69 milhões de euros.
4 Pontos Negativos
1) Capitais próprios negativos
Se no exercício anterior a SAD portista podia ainda argumentar que tinha capitais próprios positivos, o mesmo não se pode dizer com base no exercício de 2016/2017. O relatório de contas mostra um agravamento significativo deste campo devido à incorporação do resultado líquido, sendo que o capital próprio passou para terreno negativo, ou seja, o ativo do FC Porto é inferior ao passivo do clube em 9,1 milhões de euros. Esta situação, comummente denominada de “falência técnica”, coloca em sentido toda a administração portista, cada vez mais sob a mira dos aficionados azuis e brancos que se preocupam com a saúde financeiro do emblema do Norte.
2) Resultado líquido consolidado negativo
O relatório de 2015/2016 foi uma hecatombe em termos de resultado líquido consolidado do período, contudo, a última temporada desportiva também não foi melhor. O resultado líquido passou de -58,4 milhões de euros para -35,3 milhões de euros, ou seja, um valor absolutamente impensável para a realidade portuguesa e para um clube que há uns anos atrás era visto como exemplo ao nível da administração desportiva e financeira. Dependendo de quantos ativos desportivos o FC Porto quer perder e da capacidade do clube em reduzir despesas e aumentar receitas, o resultado líquido consolidado provavelmente irá continuar em terreno perigoso e negativo.
3) Crescimento do passivo
O crescimento do passivo por si só já seria uma má notícia, no entanto, este facto é ainda agravado pela composição do passivo. Para além de ter ocorrido um aumento do passivo na ordem dos 38,3 milhões de euros, justificado pelo aumento ao nível dos fornecedores, o passivo corrente (curto prazo) cresceu mais em valor absoluto (+24,1 milhões de euros vs. +14,2 milhões de euros) do que o passivo não corrente (médio-longo prazo). Ora, este agravamento do passivo corrente coloca maior pressão no curto prazo sobre a tesouraria azul e branca, podendo obrigar o clube a refinanciar as suas obrigações financeiras no curto prazo.
4) Encargos com transação de jogadores
A perda desportiva de ativos como André Silva e Rúben Neves era inevitável face à situação financeira do clube, bem como, ao facto de estarmos perante 2 jogadores da formação cuja (quase) totalidade dos direitos desportivos pertencia ao FC Porto. Nesse sentido, é incompreensível que dos 54 milhões de euros gerados pelas 2 transferências, apenas 40,3 milhões de euros foram parar aos cofres portistas, uma vez que foram subtraídos quase 14 milhões de euros em efeitos de atualização financeira, responsabilidades com o mecanismo de solidariedade, valores de venda para terceiros que detinham partes dos passes e, fundamentalmente, custos de intermediação.