“Wales, Golf, Madrid”: A ascensão e queda de Gareth Bale no Real Madrid

Bruno DiasAbril 2, 20227min0

“Wales, Golf, Madrid”: A ascensão e queda de Gareth Bale no Real Madrid

Bruno DiasAbril 2, 20227min0
Chegou a Madrid como "galáctico", mas vai sair pela porta pequena do clube. Afinal, onde falhou a relação entre Gareth Bale e os "merengues"?

Corria o Verão de 2013 no futebol. O Real Madrid, em pleno duelo aguerrido com o rival de sempre – o FC Barcelona – pelo domínio interno e até europeu da modalidade, investe a astronómica quantia de cerca de 100M€ para contratar Gareth Bale ao Tottenham. Uma contratação milionária, mas em parte justificada pela estrondosa época que o na altura jovem talento acabara de realizar em White Hart Lane, com 26 golos em 44 jogos.

Seria o início de uma longa história. Uma que, sabemos agora, durará cerca de 9 anos e terminará daqui por algumas semanas, no Verão de 2022. O contrato de Bale chega ao seu fim no final da presente temporada e é praticamente garantido que nem o jogador nem o clube têm qualquer intenção de prolongar a ligação. Bem pelo contrário, os últimos meses (anos, até) trouxeram contornos de novela a este enredo, com acusações de parte a parte e ataques indiscriminados e até insultuosos da imprensa madridista ao avançado galês.

Mas, afinal, como se explica o caminho entre a chegada triunfante ao Santiago Bernabéu e a partida tumultuosa daquela que, à data, foi a contratação mais cara da história do futebol mundial?

 

O início: a criação da “BBC”

À data da chegada de Gareth Bale à capital espanhola, o Real Madrid já possuía uma armada ofensiva de respeito, repleta de capacidade criativa, desequilibradora e finalizadora. O galês era, assim, a “cereja no topo do bolo”, o possível elemento diferenciador que inclinaria um pouco a balança a favor dos “merengues“.

E o início foi bastante promissor. Em estreia pelo clube, numa partida frente ao Villarreal a contar para a “La Liga“, Bale só precisou de 39 minutos para se estrear a marcar e ditar aquela que seria a tendência de uma temporada muito bem sucedida. O galês entendeu-se rapidamente e de forma natural com Karim Benzema e Cristiano Ronaldo na frente de ataque, o Real Madrid conquistou a Champions League e esse bom rendimento reflectiu-se também nos números individuais, com 22 golos e 19 assistências em 44 partidas, sendo um deles talvez o mais icónico da sua passagem pelo clube, quando na final da Taça do Rei frente ao Barcelona arrancou ainda no seu meio-campo, bateu Marc Bartra em velocidade com um sprint por fora da linha lateral (!) e só parou na baliza contrária.

Estava assim criada a “BBC”: Bale, Benzema e Cristiano, três talentos de classe planetária, sempre presentes no momento de debater os melhores avançados do futebol mundial, capazes de ir buscar a vitória em qualquer partida, frente a qualquer adversário. O futuro parecia temível para os adversários do Real, que contava agora com um trio de ataque demolidor, em cima de todo o talento igualmente existente por detrás desses 3 craques.

Bale, na sua estreia pelo Real Madrid (Foto: en.as.com)

 

O ponto de ruptura: do futebol para… o golfe

No entanto, as energias positivas de Bale em Madrid não durariam para sempre. Potenciado pelas inúmeras lesões musculares que regularmente teve desde que chegou ao Real Madrid, o avançado galês foi progressivamente perdendo fulgor, rendimento e preponderância no colectivo “blancoao longo dos anos, apesar de ocasionalmente conseguir demonstrar todo o seu talento (como na final da Champions League de 2018, frente ao Liverpool, quando bisou na partida e marcou um dos melhores golos em finais da competição, com um pontapé de bicicleta irrepreensível). Isso, naturalmente, aumentou o tom das críticas às suas prestações. Qual “bola de neve”, as relações entre o jogador e o mundo madridista foram-se deteriorando, até um evento crítico e bem representativo desta realidade.

Em Novembro de 2019, o País de Gales confirmava a qualificação para o Euro 2020, com uma vitória por 2-0 sobre a Hungria. Mas foi a celebração pós-jogo que dominou as notícias nos dias que se seguiram: na bandeira galesa que os jogadores seguravam para as câmaras – com Bale em plano central – podia ler-se explicitamente “Wales, Golf, Madrid. In that order”.

Uma provocação ostensiva ao seu próprio clube, e um sinal claro e inequívoco do estado de espírito do galês no Santiago Bernabéu. A relação entre os espanhóis e o jogador estava agora em queda livre e atingia o seu ponto de ruptura, pelo menos no que à real utilidade desportiva do avançado dizia respeito.

Mas a verdade é que esta era uma ruptura que já vinha dando sinais de poder existir ao longo do tempo. Há múltiplos relatos de que o galês demonstrou sempre dificuldades de adaptação ao grupo e à própria cultura espanhola, sendo o exemplo mais claro o facto de Bale nunca ter aprendido a falar espanhol, mesmo passando um período extenso da sua carreira em Espanha. Para além disso, o facto de ter vivido sempre “na sombra” de Cristiano Ronaldo certamente terá também afectado a sua motivação e confiança para recuperar o rendimento regular que tardava em não se consolidar.

Antevê-se então assim o fim da caminhada de Bale no clube, no que parece já ser a “nova realidade” a 1 de Julho deste ano.

(Foto: irishtimes.com)

 

O futuro: o que se segue para Bale?

Apesar dos seus 32 anos – idade perfeitamente razoável para um futebolista de alta competição – há uma grande probabilidade desta ser a última temporada em que veremos o galês dentro dos relvados.

Bale já por várias vezes mencionou e/ou deu a entender que perdeu muita da sua paixão pelo jogo e pela profissão, e apesar dos inúmeros rumores produzidos pela comunicação social servirem muitas vezes como meras armas de arremesso ao atleta, a verdade é que é notório que o seu comprometimento para com o futebol já não é o mesmo que o fez atingir o estrelato com inteiro mérito.

Este comportamento, de resto, é claramente evidente na diferença entre as prestações recentes de Bale pelo seu clube e as suas prestações pelo País de Gales, onde continua a ser figura principal e decisiva. Mas, caso os galeses falhem a qualificação para o Mundial 2022 (aguardam neste momento na final do play-off de acesso pelo vencedor da partida entre a Ucrânia e a Escócia, que apenas se disputará em Junho devido à actual guerra no território ucraniano), a reforma poderá mesmo ser o passo seguinte.

Um “galáctico” sem polémica a ele associada nem seria bem um “galáctico”, mas Bale nunca pareceu sequer encaixar bem nesse papel mediático. Talvez esse tenha sido o maior pecado da sua carreira: a falta de capacidade (ou predisposição) para assumir o protagonismo que justamente conquistou com o seu futebol, com tudo o que de bom e de menos bom isso significa.

Se estes forem realmente os últimos capítulos da sua longa história (pelo menos, no que ao Real Madrid diz respeito), uma coisa é certa: já ninguém apagará a marca que Gareth Bale deixará no futebol quando se retirar. Numa carreira marcada claramente por duas fases bem distintas, importa não deixar cair em esquecimento todo o talento e a magia que o galês evidenciou, por muito tempo, nos relvados da “La Liga” e do futebol mundial.


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