Roberto Olabe e os 60/40 que fazem dele um dos melhores do mundo pt. 2
Esta é a segunda parte de um artigo dedicado à influência de Roberto Olabe na Real Sociedad e a parte 1 podes ler aqui.
O 60/40 pode ser estudado ainda com mais profundidade. Dentro dos 60%, ou seja, os elementos que são provenientes das camadas jovens, nem todos de Guipúzcoa. A ideia é que 80% sejam provenientes da província e outros 20% que venham de outras zonas, chegando ainda nas etapas formativas, a tempo de beberem das ideias da turma de San Sebastián. Isto faz com que a Real Sociedad seja um clube ativo no mercado de futebol jovem e esteja a tento a várias promessas que apareçam, aproveitando o baixo valor das mesmas (se têm contrato profissional), para as trazer para o clube e moldá-las ao pormenor. Vejamos alguns casos de jogadores e ex-jogadores da equipa A que são de perto da cidade do Anoeta (a distância apresentada é relativa entre a cidade em que ao atleta nasceu/cresceu e San Sebastián):
• Aritz Elustondo- 42 km
• Igor Zubeldia- 46 km
• Asier Illarramendi- 48 km
• Mikel Oyarzabal- 0 km
• Ander Barrenetxea- 0 km
Grimaldo debuta con asistencia en la Selección: Oyarzabal lo agradece y hace el 0-2 de España en Chipre. pic.twitter.com/XlKufZl2I8
— GOAL España (@GoalEspana) November 16, 2023
Há dezenas de casos, muitos com sucesso total. A Real Sociedad transformou-se num “polvo” para atrair estes jogadores, alguns ainda na fase de adolescentes, providenciando-lhes grandes condições de treino e qualidade na educação, já que o sucesso escolar é muito importante para Roberto Olabe, porque para a formação de um ser humano, o desporto-rei é dos temas menos importantes, havendo a consciência de que nem todos os atletas que estão nas camadas jovens vão ser futebolistas profissionais.
Vejamos os elementos da formação (ou que chegaram nesse período/equipa B) que a Real Sociedad possui no seu onze inicial mais utilizado:
• Martín Zubimendi;
• Igor Zubeldia;
• Robin Le Normand;
• Ander Barrenetxea
• Aihen Muñoz;
• Mikel Oyarzabal.
Num total, são seis jogadores de onze, o que reflete na perfeição a ideias de 60/40 presente na Real Sociedad e imposta com toda a força por Roberto Olabe. Alguns destes nomes são jogadores titulares na seleção espanhol e outros estão à espreita de uma convocatória. Na formação sucede o mesmo, com muitos elementos chamados para os escalões mais jovens.
Imanol Alguacil reagiu assim à última convocatória da seleção de Espanha,
«É um sinal muito bom. De certeza que Luis de la Fuente não convocou mais três por vergonha».
Estavam presentes cinco atletas da Real Sociedad: Álex Remiro, Martín Zubimendi, Mikel Merino, Mikel Oyarzabal e Robin Le Normand. Os três que o basco referiu eram Igor Zubeldia, Ander Barrenetxea e Brais Méndez. Quantas equipas que não estejam a lutar pelo título conseguem levar esta cifra de atletas à seleção? E não estamos a falar de um conjunto qualquer. A Espanha é uma das candidatas a vencer o Euro 2024 e no mínimo quererá chegar às últimas rondas.
Ao entendermos como funciona a parte dos 60%, falta verificar os 40% e não precisamos de citações de Roberto Olabe para a compreender. Basta olharmos para o plantel de 2023/24 e ver os nomes que não são formados na Cidade Desportiva de Zubieta. São indivíduos que chegaram por valores elevados, mas com alta probabilidade de sucesso, em idades que garantem que os atletas ainda vão crescer. Mikel Merino foi formado no CA Osasuna, onde conseguiu dar espetáculo, mas já não o fez no BVB Dortmund, nem no Newcaste United FC. Porém, regressou a Espanha por 12 milhões de euros e é um pilar no meio campo dos txuri-urdin. Brais Méndez consolidou-se no RC Celta, mas por 14 milhões de euros, tornou-se num dos focos da Real Sociedad. Takefusa Kubo explodiu ao serviço da turma de Alguacil, após ter sido contratado por 6.5 milhões de euros ao Real Madrid CF, depois de uma temporada satisfatória no RCD Mallorca. São investimentos pesados, mas com garantia de retorno dentro de campo, assim como fora dele, como nos provou o caso de Alexander Isak (vendido por 70 milhões de euros).
Analisemos os números do sucesso da dupla Olabe-Alguacil em dois prismas, o ponto de vista da economia e o ponto de vista dos resultados (2018/19 não entra na equação, já que o técnico não estava no banco desde agosto).
Verifiquemos uma tabela que nos apresenta o resultado da balança de transferências desde a entrada da dupla:
Temporada Saldo da balança de transferências
2019/20: – 22,75 milhões de euros
2020/21: +18,25 milhões de euros
2021/22: -2,5 milhões de euros
2022/23: +27,5 milhões de euros
2023/24: -10,6 milhões de euros
Total: +9,9 milhões de euros
Como podemos verificar, a Real Sociedad, mesmo dando o salto de patamar que conseguiu dar, conseguindo contratar elementos relevantes em panorama nacional e internacional, conseguiu gerar lucro no final de todo este processo.
De acordo com a avaliação feita pelo Transfermarkt, os txuri-urdin são o quarto plantel com maior valor de mercado, avaliados em 432,6 milhões de euros, bem próximos do terceiro posto (Club Atlético de Madrid- 472 milhões de euros) e muito afastados dos restantes, já que o quinto lugar é ocupado pelo rival Athletic Club, com o valor de 218,8 milhões de euros. Neste aspeto, a Real Sociedad está muito próxima do pódio, o que demonstra o caminho positivo que tem percorrido.
Vamos a resultados dentro de campo. Eis uma tabela que mostra a prestação da equipa de San Sebastián nestas épocas:
Temporada Posição na La Liga
2018/19 – 9º lugar
2019/20 – 7º lugar
2020/21 – 5º lugar
2021/22 – 6º lugar
2022/23 – 4º lugar
A turma de San Sebastián transformou-se numa equipa que habitualmente luta por postos europeus, marcando presença na Champions Leaguem 2023/24, onde já garantiu a passagem para os oitavos de final, algo que entra inevitavelmente na história do clube. O investimento feito é acompanhado de boas campanhas na La Liga, uma das mais equilibradas de todo o planeta, quando se trata da luta fora do top 3.
It was Take Kubo (Real Sociedad, 22) 🇯🇵
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— DataMB (@DataMB_) November 25, 2023
Roberto Olabe criou o “futebol de proximidade”, termo atribuído ao jornalista Roger Sabatés, do El País, quando comparou a sua estratégia com a cozinha de proximidade. Não é fácil implementar o projeto que a Real Sociedad tem. A maioria das equipas faz várias contratações anualmente, em busca do lucro, muitas vezes com pouca objetividade. Não há uma identidade. Neste caso, é tudo o contrário e o sucesso é gigantesco. Este é um modelo completamente vencedor:
«O nosso objetivo não é outro senão o de competir com os nossos rapazes a nível de elite. A vocação do clube está profundamente enraizada e não é outra senão a de promover o desenvolvimento de jogadores de futebol». As palavras de Roberto Olabe fazem todo o sentido e em Portugal já sentimos as consequências do seu projeto.
Quando discutimos quem será o melhor diretor desportivo do mundo, todos pensamos em nomes que estão em equipas fortes, com bastante capital em investir, estilo Luís Campos ou Txiki Begiristain. Poucos pensam em Roberto Olabe. Porém, o feito que o mesmo realizou, a famosa tática de 60/40, não é para todos e muitos desistiriam antes de alcançar o sucesso.
O espanhol terá que ser considerado um elemento de topo no seu posto, mesmo que não esteja em um clube que lute pela La Liga ou por competições europeias. Conseguiu que a Real Sociedad se tornasse num clube formador e inteligente na hora de comprar. Transformou uma equipa “de meio de tabela” em uma fonte de atletas para a seleção espanhola e que conta com olheiros de tubarões europeus em todos os jogos. Provavelmente o futebol seria muito mais interessante se existissem mais pessoas nas estruturas a pensar como ele, mas há que admitir que é um projeto dificílimo de replicar.