Stranger Rules: Para o ouro ganhar o chão terás de beijar

Rui MesquitaOutubro 29, 20195min0

Stranger Rules: Para o ouro ganhar o chão terás de beijar

Rui MesquitaOutubro 29, 20195min0
Pode um ciclista atirar-se para o chão para ganhar uma corrida e até uma medalha olímpica? Sim, graças a uma regra estranha! Descobre tudo aqui!

O cenário são os Jogos Olímpicos, Londres 2012. Estás pronto para arrancar numa corrida de ciclismo de sprint de equipas. Todos os segundos contam e o arranque da tua equipa é crucial para vencerem a corrida e chegarem à grande final. 3, 2, 1, BANG! Começa a corrida e a tua equipa faz um péssimo arranque, percebes que estão em maus lençóis para o resto da corrida. O que fazes? Fácil, atiras-te para o chão e começam tudo de novo!

A história e a regra

A equipa do Reino Unido defrontava a equipa da Alemanha em casa, nos JO de Londres e eram favoritos para a vitória final. O arranque era um dos seus pontos fortes e era preciso um bom começo para garantir a qualificação. Esse começo forte não aconteceu e, segundos depois, Phillip Hindes estava no chão.

Hindes no chão a ser auxiliado pelo staff da equipa britânica (Foto: Getty Images)

Caindo um ciclista de uma equipa seria de esperar que a equipa adversária vencesse automaticamente a corrida, certo? Não, graças a uma regra estranha isso não aconteceu. A regra 3.2.074 diz que “no caso de ocorrer um acidente na primeira meia volta de prova, a prova é interrompida e repetida.” A regra faz sentido, de forma a não penalizar um azar tão precoce e numa fase tão instável da corrida como é o arranque. O problema é que esta regra abre portas a que uma equipa ou um corredor possa, propositadamente, recomeçar uma corrida que comece da forma desejada.

A pergunta que se coloca é: Phillip Hindes caiu propositadamente para poder recomeçar a corrida? A equipa britânica acabou por ganhar a medalha de ouro na final e, numa entrevista logo após a entrega da medalha, Hindes revelou que caiu de propósito por causa de um mau arranque. Os seus dois colegas riram e ficou no ar que a estratégia teria sido pensada e coube a Hindes cair. No vídeo abaixo é possível ver essa entrevista.

Depois disto rebentou um escândalo pela clara batota dos britânicos para chegar à final mas a Federação responsável veio desmentir os comentários do atleta dizendo que o que ele queria dizer “perdeu-se na tradução”, aproveitando o facto de Hindes ser natural da Alemanha e não ser totalmente fluente em inglês. Em conformidade com isto, o Comitê Olímpico afirmou que não via razão para anular a medalha por não ver nenhuma irregularidade.

Depois da poeira assentar, Hindes voltou a falar sobre o assunto e afirmou que o acidente foi, de facto um acidente, contradizendo a sua primeira versão (vídeo abaixo).

É complicado saber se a queda foi acidental ou premeditada, mas acabou por beneficiar Hindes, que, como já foi dito, acabou por vencer a medalha de ouro. Por não querer tomar partido, o Fair Play deixa o leitor decidir por si próprio se a queda foi ou não acidental. Vê o vídeo abaixo e diz-nos nos comentários o que achas!

As implicações e como resolver este buraco?

Neste caso as implicações foram a oportunidade para os Britânicos de conquistarem a medalha de ouro. Na final ainda conseguiram bater o recorde do mundo! Mas nada nos diz que, mesmo com um arranque pior, não conseguissem passar. Apesar disso, é um buraco gigante numa regra estranha. Cabe ao Comitê Olímpico (neste caso) avaliar se houve um aproveitamento da regra. O CO decidiu que não, apesar dos comentários de Hindes a admitir que esse aproveitamento existiu.

A estranheza da regra leva-nos a pensar como seria aplicá-la a outros desportos e não só de corrida. Imaginem que uma equipa num jogo de futebol, se sofresse dois golos nos primeiros 15 minutos, podia recomeçar o jogo. Veríamos equipas que sofressem um golo cedo a marcar “acidentalmente” golos na própria baliza para recomeçar o jogo?

Os 3 medalhados britânicos, com Hindes no meio (Foto: Daily Mail)

Ou mesmo em corridas, existindo esta regra em corridas de motas ou automóveis. Até que ponto corredores estariam dispostos a correr os riscos de um acidente “apenas para recomeçar a corrida? E em sprints ou natação? Já imaginaram Usain Bolt tropeçar de propósito porque não gostou do seu arranque? Ou Michael Phelps fingir uma cãibra para recomeçar uma prova nos Jogos Olímpicos?

Estes cenários podem parecer ridículos mas a verdade é que, para conseguir chegar ao ouro, Phillip Hindes teve que ir de cara ao chão. Arriscar a sua integridade física por mais uma oportunidade para chegar à final. É feio aproveitar uma regra estranha para ter sucesso, mas o gesto para com a equipa é bonito. O único problema é admitir tudo numa entrevista de medalha ao peito…


Entre na discussão


Quem somos

É com Fair Play que pretendemos trazer uma diversificada panóplia de assuntos e temas. A análise ao detalhe que definiu o jogo; a perspectiva histórica que faz sentido enquadrar; a equipa que tacticamente tem subjugado os seus concorrentes; a individualidade que teima em não deixar de brilhar – é tudo disso que é feito o Fair Play. Que o leitor poderá e deverá não só ler e acompanhar, mas dele participar, através do comentário, fomentando, assim, ainda mais o debate e a partilha.


CONTACTE-NOS