De Nader a Pichardo, as vitórias do que realmente é Portugal
Dias de bonança correm no desporto português, com mais duas medalhas de ouro conquistadas nos Mundiais de Atletismo, para além de uma prestação extremamente positiva no EuroBasket, no Mundial de Voleibol, Campeonato da Europa de Hóquei em Patins e muito mais. Depois de décadas em que chegar a fases finais ou conquistar medalhas era algo raro e excepcional, o desporto nacional começou a conquistar novas metas e a estender horizontes, o que até fez uma boa parte do público português ter perdido perspectiva, exigindo mais conquistas sem ter noção dos processos de crescimento e desenvolvimento.
Porém, o tema de hoje é algo que já falei num artigo anterior que dediquei a Neemias Queta: o que é realmente Portugal. Portugal não é aquele país que um partido antidemocrático tenta vomitar para os meios de comunicação social (seria importante que os membros da OCS começassem a realmente a combater e a fazer um verdadeiro fact-checking à extrema direita e não a serem autênticos cheerleaders).
Portugal é uma nação que abraça novas comunidades e nacionalidades, que bem acolhe e recebe e que cresce graças aos préstimos de pessoas de diferentes proveniências, culturas e níveis sociais. Pedro Pichardo, nascido em Cuba, escolheu Portugal para viver e continuar a sua vida enquanto atleta profissional. Sim, verdade que veio para este país à beira mar por virtude de um contrato oferecido pelo SL Benfica, mas por cá ficou, teve o seu primeiro filho em território nacional e, mesmo depois de ter terminado a sua ligação contratual com as águias, continua a saltar e a obter medalhas com o símbolo de Portugal no seu peito. Ver Pichardo a correr junto às bancadas com a bandeira de Portugal nas suas costas é uma imagem que perdurará para sempre na história, especialmente quando representou Portugal em dois Jogos Olímpicos e diversos outros torneios internacionais.
A associação de Pichardo com Portugal é a demonstração que este não é um país ‘pequenino’ ou feito só para os que nasceram aqui, pois pertence a todos que queiram fazer parte da cultura nacional, não tendo que renegar as suas origens.
Noutro espectro está Isaac Nader. O corredor nasceu e cresceu em Portugal de pai marroquino e mãe portuguesa. E isto bastaria para não sequer permitir que aquela conversa abjecta do racismo e xenofobia ganhasse força. Porém, como parte da comunicação social portuguesa está apostada em viver do engajamento e dos cliques, deram asas para que uma série de racistas e xenófobos pudessem ecoar os seus urros ilegítimos em praça público. Para os que defendem ‘é liberdade de expressão’, só há uma resposta: não, não o é. Opinião que atropele os direitos sociais e democráticos de outrem não entra dentro da legitimidade da liberdade de expressão. Isaac Nader, ou qualquer outro atleta que represente Portugal, não merece o tratamento que têm sido vítima por parte de uma fatia da população portuguesa. A ignorância mata tanto quanto um cancro, empurrando as sociedades contemporâneas para um clima de medo e terror que deviam ter sido sanadas após a 2ª Guerra Mundial.
Isaac Nader sagra-se campeão do mundo dos 1500m com um final INCRÍVEL! 🥇🇵🇹pic.twitter.com/H34ovzpwV0
— B24 (@B24PT) September 17, 2025
Porém, cá andamos a legitimar os urros dos irracionais que vivem enraivecidos porque foram um fracasso nas suas vidas. O que vale é que Isaac Nader, Neemias Queta, Pedro Pichardo, Bárbara Timo, Jorge Fonseca e outros não tenham medo de representar Portugal, porque para eles este é a sua casa. Uns nasceram cá, outros vieram para aqui viver a certa altura das suas vidas, tendo todos os mesmo objectivos: viverem a sua vida em paz, serem bem sucedidos e ter a oportunidade de amar continuamente Portugal.
O multiculturismo fez o desporto português atingir outro patamar de excelência, e para os que têm dúvidas, agradeço que verifiquem a cadência de conquistas entre os anos 30 a 80 do século XX e o que foi conseguido após os anos 90. Se ainda assim têm dúvidas, então não há nada a fazer. Nenhuma medalha de ouro ou troféu vai mudar a vossa opinião e por vezes mais vale nem sequer dar espaço a debate com quem não quer compreender. O humanismo não é para todos, e sobretudo não é para aqueles que se revêm nas palavras de um líder de um partido que só está aqui para fomentar a divisão.
A mais Pedro Pichardos. A mais Raphael Guerreiros. A mais Francisco Fernandes. A mais Jéssica Inchudes. A mais Neemias Quetas. A mais todos aqueles que querem fazer parte de Portugal.
Foto de destaque da Federação Portuguesa de Atletismo.