“Cromos” com técnica: Nakata e Garrincha
Dois “cromos” recheados de técnica e que tiveram carreiras curtas demais, cada um por razões diferentes mas com ambos a deixar umas saudades especiais aos adeptos do Desporto-Rei. Hidetoshi Nakata e Manuel dos Santos “Garrincha”, relembrados pela Caderneta dos Cromos.
O GÉNIO E ANJO DE PERNAS TORTAS
Antes de o contratar, o Botafogo chamou Garrincha para ir treinar ao grande clube do Rio de Janeiro e fazer um teste. Alma humilde e ingénua, Garrincha chega ao estádio acompanhado por dois amigos da sua terra. Ele entra no relvado onde é recebido pelo treinador Gentil Cardoso. “Você é que é o craque do Araty?”. Garrincha encolheu os ombros, sem saber o que responder. Sem esperar resposta, Gentil entrega o rapaz ao seu adjunto para o integrar no treino que iria consistir num treino conjunto 11×11. O treinador adjunto do Botafogo, não conhecendo o jogador que estava à experiência, pergunta: “você joga de quê, meu filho?”, ao que Garrincha responde: “de chuteiras.”
O TSUBASA QUE SAIU DE CENA DEMASIADAMENTE RÁPIDO
Hidetoshi Nakata é o exotismo de chutaria nos pés. Um cromo manga difícil de manter preso numa caixinha de banda desenhada. Tecnicamente irrepreensível, fintava quem o desafiava no um para um com a audácia de um samurai.
Cresceu num país de costas voltadas para o futebol e, por isso, sem ídolos, sem cromos de referência. Focou-se na única referência futebolística que o mainstream lhe oferecia: Oliver & Tsubasa.
Foi isso que o alimentou durante anos até chegar à Europa, ao Perugia. De lá, saltou para a Roma. Lá, foi campeão italiano, o último scudetto do clube. Na sombra de Totti, vai para Parma e mais tarde para a Fiorentina, com passagem pelo Bolonha.
Terminou a carreira prematuramente em Inglaterra, nos Bolton, aos 29 anos. O nipónico que sempre procurou jogar por prazer, deu por si num emaranhado em negociatas ao longo das últimas épocas. Decidiu terminar.
“O futebol sempre foi um hobby para mim. senti que a equipa estava a jogar apenas por dinheiro, não pelo gosto de se divertir. Eu sempre senti que a equipa era como uma grande família, mas já não era mais assim.”
Quando terminou a carreira viajou por mais de 100 países. “Quando eu era jogador, viajei muito, mas só vi hotéis, estádios, aeroportos. Queria ir sozinho para descobrir os países e as pessoas que me fascinam. Quero ver o mundo com meus olhos, não pela TV ou pelos jornais. As pessoas têm medo dos lugares que fui, porque não sabem que, além da guerra, existem povos estupendos. Se viajassem mais, existiriam menos idiotas preconceituosos.” Nestas viagens, perguntavam-lhe muito sobre a sua carreira e também pela cultura japonesa. Nakata sentiu que não possuía respostas sobre a sua própria cultura.
Embarcou noutra aventura e foi conhecer os 47 prefeituras japonesas. Depois desta viagem, decidiu fundar uma empresa facilitadora de negócios para os produtores de sake das várias regiões japonesas. Mas o futebol, esse, continua um hobby. “Por todos os lugares por onde passei, joguei futebol. Sinto a mesma paixão de quando tinha 10 anos. Para mim, é tão agradável jogar descalço na rua quanto em um estádio. E, depois, jogar uma pelada é a melhor maneira de se fazer amigos, descobrir o mundo real.”