“Cromos” do FC Porto: Costinha e Juary
COSTINHA E UM ANIVERSÁRIO QUE ABRIU CAMINHO A ALGO ESPECIAL
Aniversário de Costinha no dia 1 de Dezembro de 2003. O ministro junta a equipa do Porto, a meio da semana, para uma jantarada no seu dia de anos. Felizmente já tinham passado aos oitavos de final da Champions. Mas o campeonato ia a meio. Nesse fim de semana, jogavam contra o Marítimo. Jantar correu bem. No final, Costinha avisa os colegas que ele vai beber um copo com os amigos que trouxe de Lisboa e que não queria sair com nenhum deles para não dar bronca na estrutura portista. Cada um vai à sua vida. Saltamos para domingo de jogo.
O Porto empata. Ui. No treino seguinte, Costinha chega cedo ao Olival e vê o carro do presidente Pinto da Costa estacionado, o que significa que alguém vai levar uma dura. Nessa semana o Porto ia jogar contra o Real Madrid, num jogo a contar para feijões. Costinha já contava não jogar porque, caso levasse amarelo, não jogava o primeiro jogo das oitavas e sendo ele titularíssimo, mais valia guardar a prata. Quem ia levar a dura era ele. Mourinho chega ao balneário e aponta para Costinha:
“Tu aí! És o responsável pelo empate no domingo. Levaste a equipa para a noite. Ficas a saber que se perdermos campeonato, a culpa é tua. E vais jogar em Madrid. Não me importa se levas amarelo porque já disse ao presidente que tu em Janeiro vais embora. Não te quero mais no Porto.” Costinha tremeu.
Que vida será a minha? Incógnita. Mas siga treinar. E jogar. Costinha vai a Madrid e joga. Pior: leva mesmo amarelo. No final do jogo, Mourinho abraça Costinha. Este gajo é doido. Na semana passada disse que me ia mandar embora e hoje abraça-me? Mourinho diz-lhe: “eu sabia que podia confiar em ti.” Regressa o campeonato português e Costinha também joga a titular. Sai o sorteio da Champions: Manchester United.
Dias depois, num certo treino, Mourinho vem a caminhar relvado fora em direção a Costinha: “Pá, grande sorteio de Champions. Manchester em casa. Não podes jogar mas vamos ganhar pela margem mínima. No jogo fora, vais dar um jeitaço para controlar o jogo aéreo e estamos safos. Vai correr muito bem” E correu.
JUARY E UMA VIDA TORTA QUE ENDIREITOU
Juary nasceu sem a certeza se ficaria para sempre em São João de Miriti, cidade pequena do estado do Rio de Janeiro. Sem certeza se seria embalado pelo colo da sua querida mãe até não caber mais nos seus braços. Começou a jogar na estrada da sua rua e garante que foi amor à primeira vista por aquele joguinho que era a maior cerimónia das tardes dos traquinas da sua rua. Porém, sem a certeza se seria um amor suficiente para se tornar profissional. Como ele conta na Conversa de Cromos, ainda miúdo, o racismo negou-lhe a entrada no portão principal do campo do Fluminense, o que o fez pendurar as botas e voltar a jogar de pé descalço, na rua, sem compromisso. Injustiça ao portão, injustiça na rua, injustiça no mundo e decidiu estudar. Direito.
Mas rápido o pai o convenceu a voltar para ao futebol. Juary sempre viveu na incerteza se o caminho que percorria nas camadas jovens de Vila Belmiro lhe ofereceria um baú reluzente capaz de fazer valer cada lágrima de esforço ou se, pelo contrário, seria mais um dos muitos protótipos de Pelé que prometiam mais do que eram.
Era o combo perfeito para se erguer um dos determinantes elementos da primeira e autêntica geração dos Meninos da Vila. Tinham como missão fazer esquecer da era Pelé. No Santos FC , foram 101 golos, com direito a dança frenética no canto do terreno. Em Avellino, viveu momentos inesquecíveis e encantou até Raffaele Cutolo, que o tinha como jogador favorito na época. No FC Porto, fez, para mim, o golo mais importante da história do clube.
Se o percurso foi incerto, o final da jornada não engana: Juary é um cromo raro, encantador e que deixou saudade por onde passou.