Caderneta de Cromos e Chalana, o Pequeno Genial

Pedro PereiraFevereiro 27, 20186min0

Caderneta de Cromos e Chalana, o Pequeno Genial

Pedro PereiraFevereiro 27, 20186min0
A caderneta e o Fair Play cola um cromo raríssimo, com uma carreira tão cheia de boas jogadas como de boas histórias. De quem falamos? Chalana, o astro do SL Benfica

Texto escrito em parceria com a página do Instagram caderneta.de.cromos

A caderneta.de.cromos cola Fernando Chalana, ou como carinhosamente foi apelidado pelos franceses “Chalanix”, culpa das parecenças físicas e transcendentes com o herói gaulês de Uderzo.

Foto: Pinterest

Fernando Chalana nasceu no Barreiro, apesar de ter sido no Lavradio que crescera. Naquelas ruas, os meninos e a bola eram os últimos a dormir, e claro, Chalana era um desses meninos, sempre junto da sua melhor amiga redondinha. Voltaria mais tarde para o Barreiro para crescer como jogador de futebol, fazendo parte da equipa federada de futebol de 11. Convém também assinalar, que ainda antes do futebol de onze, o futsal foi a casa das fintas do menino prodígio.

Mais tarde, num jogo entre Barreirense e Oriental, Pavic, na altura treinador principal do Benfica, foi assistir ao jogo com a missão de observar um suposto craque do Barreiro. Pavic viu dez minutos de jogo. Era óbvio. Trazê-lo para a Luz era obrigatório.

Chalana estreia-se pelo Benfica com 17 anos, no dia 7 de Março de 1976, tornando-se no jogador mais jovem de sempre a jogar pela equipa A dos encarnados. Nesse ano, foi campeão pelos juniores e pelos seniores. Se esse ano foi surpreendente, o seguinte não foi menos já que Chalana foi convocado para a Seleção A de Portugal por José Maria Pedroto.

Foto: Expresso

O curioso é que Chalana poderia ter sido lançado quatro dia antes, na primeira mão dos quartos-de-final da Taça dos Campeões Europeus, no Estádio da Luz, diante do Bayern Munique. Contudo, a UEFA não permitiu que atuasse, considerando que não tinha idade suficiente. Mesmo assim, Mário Wilson levou-o para o estágio, em Sesimbra.

Chalana relembrou esse estágio com uma passagem curiosa, ilustrativa da sua maneira de viver o futebol.

“Perguntei ao Toni, que era o capitão, onde é que me poderia sentar à mesa durante as refeições.” A resposta não tardou: “Disse-me para deixar sentar toda a gente e para ficar com a cadeira que, no final, já com todos à mesa, estivesse vaga. A partir dessa altura, aquele foi o meu lugar, sempre na mesma mesa. Fiquei com o Toni, o Artur e o Bento.”

Jogou até 1984 pelo Benfica, tornando-se referência no clube lisboeta. Prova disso são os cinco campeonatos ganhos e as inúmeras jogadas de classe suprema vestido de vermelho. Em 1983 teve um papel fundamental na caminhada do Benfica até à final da taça UEFA de 1983. A sua primeira passagem pela Luz contabilizou 262 jogos com a águia ao peito. Mário Wilson, que foi treinador de Fernando no Benfica, disse uma vez que “Ele é futebol da cabeça aos pés. Sim, ele é todo futebol.

É senhor de intuição extraordinária para jogar à bola. Um rapaz capaz de solucionar qualquer problema. Além disso, não se envaidece. Por isso, Chalana é um craque”. Porque para além do talento imenso, Chalana era um génio introspectivo capaz de se expressar com a bola nos pés e pouco mais.

Foto: Pinterest

Mas claro que para além da sua personalidade marcante e da sua qualidade técnica ímpar, acho que o que melhor define o Chalana é o facto de ele ser o melhor pé esquerdo de sempre do futebol português… Apesar de ser destro. Como o próprio diz “eu sou destro, as pessoas é que não percebiam. O esquerdo é força e o direito é da parte que vem para aqui (aponta para a cabeça)”, explica ele numa entrevista dada há uns anos.

Engraçado ele a contar como batia os penalties. Os canhotos normalmente, ao apanhar balanço, vão para o lado direito da bola para conseguir bater bem com o pé esquerdo. Os destros, ao apanhar balanço vão para o lado esquerdo da bola. Chalana era diferente. Apanhava balanço no meio e partia de frente para a bola porque só ele sabia com que pé ia bater o penaltie. Era diferenciado.

Depois de um Europeu de 84 abismal onde destruiu a defesa francesa, Chalana é comprado pelo Bordéus, a troco de 350 mil contos. Muito dinheiro na altura. Foi com esse dinheiro que o Benfica construiu o terceiro anel do velhinho estádio da Luz. Em França, as expectativas foram grandes e algumas lesões atrapalharam a performance de Chalana que completou apenas 16 jogos pelos Girondins.

Foto: OldSchoolPanini

O pequeno génio voltaria à Luz em 1987 para ser aplaudido pelo “seu” terceiro anel. Foram três anos de aplausos de encanto e de já uma saudade antecipada. Saiu para o Belenenses em 1990 e termina a carreira em 1992, no Estrela da Amadora. Se há momentos duros para um jogador, o pior com certeza é o final da carreira. Dizem que esteve quatro anos sem conseguir entrar num estádio. Ficou sem dinheiro para pagar as contas da água e da luz. Os amigos desertaram porque Chalana já não era o Chalana, aquele das fintas e dos golos.

Os holofotes e os microfones mudaram as direções. As entrevistas são cada vez menos. Acabaram os gritos por Chalana. Os meninos de hoje não sabem quem é Chalana. Os jovens adultos de hoje sabem que foi um treinador que tinha dificuldade em expressar-se.

Os adultos mais velhos tendem a esquecer-se daqueles que, como Chalana, raramente aparecem. E é nesses momentos que as cadernetas são preciosas. Por favor, abram-nas e relembrem. Mostrem aos vossos filhos, netos e amigos. Mostrem esta publicação a alguém que mereça lembrar ou conhecer o talento de Chalana.
Porque, como disse Toni,

“há jogadores de hoje, de ontem e de sempre. O Chalana é de sempre!”

Foto: 10golo

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