Nuno Miguel e Francisco Madureira. “Em Tomar já se respira rugby.”

Francisco IsaacJaneiro 5, 201815min0

Nuno Miguel e Francisco Madureira. “Em Tomar já se respira rugby.”

Francisco IsaacJaneiro 5, 201815min0
Os "pais" do ThomarRugby falaram do projecto para a cidade/região. As origens, o impacto da modalidade numa entrevista com Nuno Miguel e Francisco Madureira
Como explicam o rugby em Tomar? Quando começaram o projecto quais foram as vossas primeiras preocupações?

NMM – O Rugby em Tomar aparece em 1975, ano da fundação do Rugby Clube de Tomar, por intermédio de um grupo de Tomarenses. Uns estavam ligados ao ensino de educação física, outros já tinham tido contacto com a modalidade e outros eram entusiastas, embora nunca tivessem jogado. O Rugby Clube de Tomar teve actividade até á época de 1980 e há a destacar a conquista na época de 1979 do Campeonato Nacional para equipas não Federadas no escalão de Juniores. Nessa altura o Rugby Clube de Tomar por algumas vezes teve jogadores nos trabalhos das Selecções Regionais e Nacionais de Juniores, Juvenis e Iniciados.

Passados 14 anos, em 1994, por motivos profissionais vim viver para Tomar. Fruto da minha vontade de poder continuar ligado ao Rugby, pois tinha jogado sempre no Clube de Rugby de São Miguel, e da grande vontade do meu primo, Francisco Madureira, e dos seus amigos de quererem jogar, surge a solução da criação de uma secção de Rugby no União de Tomar. Esta secção disputou o Campeonato Nacional da 2ª Divisão e Taça de Portugal na época de 1994/1995 com as cores deste clube.

No final dessa época dá-se a mudança do Rugby para o Instituto Politécnico de Tomar, sob esta égide foram disputados o Campeonato Nacional da 2ª Divisão e a Taça de Portugal nas épocas de 1995/1996 e 1996/1997. Por motivos vários, não se concretiza a inscrição para a época 1997/1998 e ocorre nova paragem em termos de participação em competições oficiais. No entanto, nunca se deixou de praticar a modalidade em Tomar, tendo havido várias participações nos Torneios da FADU.

Em 2007, devido ao entusiasmo provocado pela participação da Selecção Nacional no Mundial e à vontade de antigos jogadores de quererem voltar à prática da modalidade, o Rugby em Tomar é retomado em termos de participação em competições oficiais, com o apoio do Instituto Politécnico de Tomar. Até hoje, mantem-se a actividade de forma ininterrupta, disputando-se o Campeonato Nacional da Segunda Divisão, agora Terceira, a Taça de Portugal e o Circuito Nacional de Equipas Emergentes.

Em 2016, com o objectivo de promover os escalões de formação foi criada a IP THOMAR – RUGBY Associação, cujo presidente é, actualmente, Francisco Madureira. Foi fundada por 25 sócios fundadores, todos eles de Tomar e que de alguma forma já deram, e dão, o seu contributo à modalidade. Neste grupo estão elementos do extinto Rugby Clube de Tomar, ex-jogadores e jogadores ligados ao Rugby em Tomar e representantes do Instituto Politécnico de Tomar, nomeadamente, o Ex. Presidente do Instituto, António Pires da Silva, o atual Presidente, Eugénio Pina de Almeida, e o Administrador dos Serviços de Acção Social, José Júlio Filipe.

Jogaram rugby e, se sim, quando e aonde começaram? Quem vos motivou a “brincar” com a oval?

NMM – A mim, quem me motivou a “brincar” foram alguns amigos do meu pai que estavam ligados ao Técnico, o Pedro Sousa e Silva e o Rui Silva Neves. Ainda a “brincar”, através de amigos do Liceu Pedro Nunes estive numa equipa que se chamava Cangurus. Mas quem me levou para uma prática a sério foi o “Doutor” Américo Caetano Nunes que me desafiou a ir para o Clube de Rugby São Miguel, onde joguei desde os infantis até aos seniores.

FM – Em miúdo assistia entusiasmado aos jogos do Rugby Clube de Tomar, mas não tinha idade para jogar. Quando já tinha, este já estava extinto. Na altura em que o meu primo veio viver para Tomar, senti que era a oportunidade de finalmente poder jogar. Falei com ele, falámos com o José Andrade, com o Francisco Ferreira da Silva e com o Artur Matos que tinham pertencido ao extinto Rugby Clube de Tomar, desafiei alguns amigos e resolvemos criar uma equipa, a tal que funcionou como secção de rugby do União de Tomar.

Ligados há modalidade há mais de 20 anos, vocês acham que cresceu? E o que nos falta para ser um desporto mais “forte” em Portugal?

NMM – Cresceu, comparado com quando comecei a jogar cresceu imenso. Acompanho com muito entusiasmo as selecções mais jovens que espero que singrem a nível sénior. Nos Sevens, desde que haja organização ou se criem condições adequadas, somos um caso sério. Os torneios de Beach Rugby são um sucesso. A nível feminino também se tem trabalhado muito. E na arbitragem somos respeitados e considerados a nível internacional.

Para ser uma modalidade “forte” é preciso que seja trabalhada a sua implantação também fora de Lisboa. Delinear estratégias em conjunto com quem, estando fora de Lisboa, sente e sabe os obstáculos à implantação da modalidade. E perceber que há jogadores com potencial e que as Selecções regionais seriam motivadoras e talvez fonte de surpresas no despontar de valores.

 O IP Thomar – Rugby está neste momento na 3ª divisão, onde existe uma competitividade bem interessante… o apoio da Federação Portuguesa de Rugby é o adequado ou podia ser diferente?

FM – Obviamente que podia ser diferente.

A Federação existe e, como sabemos, tem as suas dificuldades, mas é fundamental uma melhor organização das competições e a garantia da existência de árbitros. Uma boa arbitragem ensina e fomenta o bem jogar, a par com os treinos, traz uma maior compreensão da modalidade e de como jogar melhor. Um calendário com menos paragens e com presença de arbitragem nomeada, faria subir o nível dos jogadores e do rugby praticado.

No entanto, seriamos injustos se não referíssemos o excelente atendimento que os serviços administrativos da Federação prestam, pois estão sempre prontos a colaborar na resolução de diversas situações no decorrer da época. Não tem o IP Thomar – Rugby qualquer razão de queixa, bem como não tem a Federação de nós pois fazemos questão de cumprir com tudo o que nos é solicitado.

Em Tomar respira-se rugby? É uma modalidade que tem raízes nas vossas escolas ou ainda está longe de o ser?

NMM – Em Tomar já se respira Rugby, muito fruto do trabalho e da divulgação realizados nos últimos dez anos. Já mais de duas centenas de jovens vestiram a camisola do IP Thomar – Rugby.

Temos uma boa estrutura, com um Treinador, Nuno Fernandes, dois Adjuntos Francis Gerard Mcbride e Christopher Pratt, um Fisioterapeuta em permanência, João Peixoto, quatro Directores de equipa, Dário Marreiros, Nuno Magalhães, Christopher Pratt e Francisco Madureira e um grupo de cerca de 45 atletas seniores, sub 18 e sub 16 com uma vontade enorme de jogar e divulgar o Rugby.

Este ano temos um protocolo com o Clube de Rugby do Técnico que possibilita que os atletas treinem em Lisboa, no passado já o tivemos igualmente com o CDUL, clubes estes que já fizeram em Tomar o estágio de pré época em estreita colaboração com o IP Thomar – Rugby e o Instituto Politécnico de Tomar.

De referir também que desde há dois anos que colaboramos com a Junta Urbana de Tomar na acção Junta Anima em que proporcionamos a dezenas de jovens de várias idades o contacto com o Rugby, bem como com alguns Atl´s do Concelho de Tomar que nos solicitam manhãs ou tardes de Rugby.

O que esperam concretizar nos próximos três anos? Quais são os objectivos reais do IP Thomar Rugby e que “sonhos” gostavam de concretizar?

FM – O nosso grande problema neste momento é a falta de horários de utilização de campo compatíveis para treinos. Treinamos no Estádio Municipal de Tomar das vinte e uma horas às vinte e três horas à terça e quinta-feira, sendo que só temos uma hora de relvado. Facilmente se percebe que fazemos um esforço muito grande para treinar, por isso é neste momento impossível pensar em ter escolas, pois nenhum Pai/Mãe/Filho se dispõe a ir para o Rugby com horários destes, no entanto, com outros horários mais adequados, existe em Tomar quem se desloque a Santarém com os seus filhos para praticar a modalidade.

O GRANDE OBJECTIVO no qual já se está a trabalhar com a Câmara Municipal de Tomar, o Instituto Politécnico de Tomar e os Serviços de Acção Social do Instituto é a colocação de um relvado no campo pelado do Campus do Instituto, sendo que este já é dotado de luz artificial e balneários. Este é sem dúvida o GRANDE SONHO do momento, depois disso ninguém duvide que se ganhará em Tomar um Clube de Rugby com todos os escalões. Temo-nos vindo a preparar para essa realidade.

Temos dentro do clube matéria humana para alicerçar este projecto, depois disso temos a verdadeira convicção que os resultados vão aparecer, pois todos sabemos que os escalões de formação são fundamentais para a evolução de qualquer clube.

Recuando ao passado… têm um momento ou episódio que vos ajude a definir o que é o rugby? E houve alguma digressão “lendária” que possam nos contar?

NMM – Em 1995, com um ano de Rugby, calhou-nos para a Taça o Benfica que era da 1ª Divisão e que tinha na sua equipa vários jogadores internacionais.
Apresentou-se para o nosso jogo com a sua equipa principal em preparação para o importante jogo que teriam na semana a seguir com o Direito e perdemos.

Mas, sobre nós escreveu o Jornal do Benfica: “Primeiro que tudo queremos louvar o magnífico espirito desportivo dos briosos rapazes de Tomar que não tiveram a atitude de não comparecer ao jogo, mau grado os resultados de encontros anteriores. São um exemplo para outras equipas que, depois de perderem, por larga margem, não se apresentam aos segundos jogos. Os briosos rapazes de Tomar perderam, é certo, mas por muito menor diferença e até marcaram três pontos. Com a continuação da prática poderão vir a obter muito melhores resultados.”

Nunca baixámos os braços e para nós esteve sempre zero a zero e deixámos tudo em campo…e estivemos no Estádio da Luz, o Francisco Madureira a nº2, eu a nº9 e o Nuno Fernandes a nº11.

E ainda cá estamos para contar!

O que é o rugby para vocês? Acham que a World Rugby continua a defender os mesmos valores e princípios ou houve uma ligeira alteração?

FM – O Rugby é uma escola de vida e uma forma de reunir amigos com um objectivo comum, numa cidade pequena como Tomar ouvir dizer “os do rugby” é um motivo de orgulho. Também é uma maneira de podermos contribuir para a divulgação da cidade e levar os nossos jogadores a conhecer o país e a fazerem amigos. Quanto à World Rugby penso que podia apoiar mais o Rugby português, em vez de andar “politicamente” preocupada em não se percebe bem a fazer o quê em prol da modalidade.

Onde é que estavam em 2007 durante o Mundial de Rugby em França? Acham que podemos voltar lá no futuro próximo?

NMM – Estava pregado em frente à televisão cheio de pena de não ter ido lá ver. Reunimo-nos sempre em tertúlia no Café Paraíso a ver os jogos. Foi um momento decisivo que provocou que voltássemos a ter Rugby federado em Tomar.

O novo campo do IP Thomar Rugby (Foto: IP Thomar Rugby)
Há possibilidades de um jogador formado no IP Thomar Rugby atingir o mais alto patamar do rugby português?

NMM – Obviamente um clube como o nosso terá muito mais dificuldades em que tal seja atingido, depende de muitos factores e alguma sorte. Tivemos em Tomar um caso, em 1995, em que num treino nos apareceu um rapaz a perguntar se podia treinar. Obviamente dissemos que sim, após pouco tempo (ainda nesse treino) todos percebemos que estávamos perante um Jogador. César Tavares de seu nome, oriundo de Tomar mas que tinha emigrado aos seis ou sete anos para a África do Sul. Fez todos os Escalões e desenvolveu-se como jogador até vir novamente para Portugal. Nessa época fomos jogar para a Taça de Portugal a Lisboa com o Técnico em que alguém reparou nele. Foi para nós um grande orgulho pois foi chamado nessa altura para a Selecção de Esperanças e na época seguinte foi jogar para o CDUL, onde não esteve muito tempo pois voltou a emigrar.

Existe um bom diálogo com o Instituto Politécnico de Tomar? O Rugby Universitário deveria ser explorado de outra forma?

FM – O diálogo e cooperação com o Instituto Politécnico de Tomar e Serviços de Acção Social dificilmente seria melhor, aliás se não fosse essa relação seria muito mais complicada ou mesmo impossível a prática da modalidade em Tomar. O Instituto não só proporciona a prática aos seus alunos como permite a prática da modalidade à comunidade de jovens Tomarenses e não só, pois temos atletas de Abrantes e Torres Novas neste momento, mas já tivemos atletas do Entroncamento, Golegã, Vila de Rei, Alvaiázere, Pombal entre outros.

Relativamente ao Rugby Universitário a experiencia que temos é que por norma Instituições nos grandes centros para onde vão muitos jovens estudar e onde existem clubes com boa inserção têm mais facilidade em criar equipas competitivas, pois é uma forma de os atletas já formados disputarem um campeonato diferente e em alguns casos aproveitarem as regalias que as instituições lhes proporcionam por representarem a sua Universidade ou Politécnico.

Que ideias ou soluções podem apresentar para os vários problemas do Rugby português?

NMM – O Rugby nunca cresceu de forma sustentada no que se refere a implantação como desporto “popular” em Portugal. Para ser um desporto “popular” seria preciso um maior envolvimento com as escolas, com os professores de educação física e com as associações de pais. Seria preciso mostrar o Rugby como uma modalidade com uma forte componente na construção da personalidade e da autoconfiança. Mostrar que é capaz de combater o bullying, pois é um desporto abrangente, englobando não só os mais dotados fisicamente ou os mais hábeis, como acontece noutros desportos, mas também todos os que querem fazer parte de um todo no qual há lugar para todas as estaturas, pesos ou morfologias, fazendo sentir aos praticantes que o seu contributo é válido e valorizado.

Em termos de treinadores e arbitragem, continuamos com o “recrutamento” a ser entre ex jogadores. Tal não funciona fora de Lisboa. Porém, vemos muitos professores de educação física a integrarem outras modalidades (como trampolins, judo, natação, etc), quer enquanto treinadores quer enquanto árbitros. Esta poderia ser uma solução para uma implantação sustentada do Rugby, fora de Lisboa, mas para tal seria necessário um contributo por parte da Federação nesse sentido.

Algumas perguntas mais “pessoais”: jogador favorito dos dois? E o melhor jogo que assistiram até hoje?

NMM – Gareth Edwards e Portugal-Nova Zelândia no Mundial.

FM – Dane Coles e Portugal-Nova Zelândia no Mundial, também.

Melhor treinador que tiveram? E um colega de equipa merecia ter levado uma placagem vossa?

NMM – José Cordovil e gostava de placar o Daniel Colaço.

FM – Robert Pratt e gostava de placar o Franqueira.

Melhor jogador português de todos os tempos? E melhor jogador do Thomar Rugby de sempre?

NMM – O melhor jogador de Rugby de todos os tempos foi aquele que não sabendo que era impossível jogar Rugby em Portugal jogou à mesma.

FM – O melhor jogador do Thomar rugby é o que vai a mais treinos. É uma competição em aberto.

Queres deixar uma mensagem à comunidade do rugby português?

NMM FM – Estar no Rugby é para a vida!

A equipa do Tomar (Foto: Arquivo do IP Thomar Rugby)

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