Ricardo Vieira e a elegância da velha escola da Linha de Cascais
O Fair Play esteve à conversa com um dos membros “Old School” do surf da linha de Cascais, de seu nome Ricardo Vieira, ou como é mais conhecido nas ondas nacionais “Boi”! O porquê desta alcunha, a paixão pelas ondas, o relembrar de Dapin, e muito mais numa entrevista exclusiva.
Idade?
52.
Tempo de surf?
40 anos (se contar com os primeiros 2 em que fiz de esferovite)!
Quem são/eram os teus ídolos
Não sou muito de ídolos…aprecio certas pessoas de diferentes segmentos…mas vamos lá: No surf nacional, o Dapin. Único e incomparável. No longboard internacional, o Joel Tudor. Resgatou e refinou a linha mais clássica, mantendo-a viva e tornando-se um modelo para as gerações seguintes. Na literatura, o António Lobo Antunes. Na música, David Gilmour, Mark Knofler e o Zé Pedro, dos Xutos.
Tinhas um estilo bastante clássico nos anos 90, como nasceu a tua aptidão para o surf clássico?
O melhor elogio que me podem fazer é referirem-me como surfista de linha clássica. Acho que o truque é simples e chocante…ahahaha…vi muitos poucos filmes de surf na vida! Fujo dos filmes de longboard modernos, só vejo gravações antigas, ou seja, admiro muito o longboard moderno, mas prefiro o clássico e acho que quando só tens acesso a um, os comandos que a tua cabeça depois dá ao corpo são nesse sentido. Essa foi uma escolha consciente desde o início. Mas não sou grande fã do meu estilo; há muitas coisas que gostava de fazer diferente, há muitos motivos para continuar a ir à água… (Risos)
Que filmes de surf te mais marcaram até hoje?
O Big Wednesday é «o» filme. Está lá tudo; amizade, amor, o envelhecer e a passagem de testemunho a surfistas mais novos, as desilusões, as mortes, enfim, a vida a acontecer. Os Endless Summer também são uma referência, mas menor. E acho que não vi mais nenhum, só pequenas partes aqui e ali! Chocante, eu sei…
Qual a melhor surfada até hoje?
…já foram algumas…olha, uma que me marcou foi ainda de shortboard, no Guincho, num dia em que gostei especialmente da forma como estava a surfar, isto em 92/93. De longboard, tive alguns dias memoráveis em Ribeira D´Ilhas, ao raiar do dia. Continua a ser a minha onda preferida.
Foste competidor do Circuito Nacional de Longboard durante alguns anos, achas que o Longboard nacional segue no rumo certo?
Infelizmente, não tenho acompanhado o circuito. Ouço alguns nomes de vez em quando, mas estou mesmo por fora. Eu sempre gostei tanto de competição como de free surf e talvez um dia ainda volte a correr alguma etapa ou meeting, dependendo do formato.
Tens vontade de voltar a competir um destes dias?
Como disse, não descarto essa hipótese, dependendo do formato da prova. Acho giro vinte anos depois continuar a encontrar os velhos amigos em competição, mas com o feeling amadurecido, todos mais relaxados…acho que merecemos essa ´suavidade´, essa curtição.
Uma história de uma viagem (SurfTrip) que mais te marcou?
Cabo Verde, Sal. 2006, acho. Estar a surfar e ver coisas a passarem-me debaixo dos pés – mar batido, pouca visibilidade – e dizerem-me que eram algas. Até que o fotógrafo e o cameraman começam a assobiar de terra. Eram tubarões a passarem por nós a caminho de uma baía para se irem alimentar. Do tamanho de um longboard. Remámos com a ponta dos dedinhos e com os pezinhos para cima até chegar a terra…ahahah
O que achas da evolução do surf, no mundo?
Acho tudo já muito saturado; de surfistas, de escolas, de marketing, de paizinhos a exigirem resultados aos filhos, muita coisa muito forçada, sem paciência para resultados consistentes, etc. E acho que falta muita educação e civismo. A maioria esquece o motivo pelo qual começou a surfar; a diversão.
Como achas que cresceu o Longboard nestes Últimos anos?
Não me sinto mesmo habilitado a responder. Surfo sempre muito cedo e quase sem ninguém, é raro ver longs ou shorts…ahahaha.
Single fin ou Thruster?
Grande pergunta! Yesss! Single all the way!!! E acho que talvez isso também ajude na linha mais ´tradicional´. Já nem compro pranchas com encaixes para as quilhas laterais.
De onde surge a tua alcunha de “BOI”, assim por curiosidade?
Ahahaha….a alcunha Boi…e que eu tanto gostava e fazia questão que aparecesse nas folhas de heats! Inscrevia-me com a alcunha no meio do nome! E nos artigos iniciais que escrevia para a Surf Portugal e Surf Magazine também! Essa alcunha veio do facto de, nos anos 80, entre surfadas, ir a casa a correr almoçar duas latas de dobrada e voltar para a praia, directamente para a água! Nunca fiz a digestão antes de surfar!!! 40 anos e nunca fiz a digestão antes!!! Não copiem, era só mesmo inconsciência e pica desmedida! Para terminar; surfem com o coração, surfem com educação. Afastem-se de ´nós´ de energia menos positiva, remem mais para o lado. Não promovam conflitos ou despiques. Sejam natureza e apreciem-na na totalidade. Sem gritos ou intimidações.
Sejam boas pessoas, honrem os vossos paizinhos e sejam modelos para os vossos filhos. Over and out!