Seis Nações 2018 Ronda 4: Habemus Champions
O PRAGMATISMO IRLANDÊS E A ESPERANÇA DO GRAND SLAM
A Irlanda sagrou-se campeã do Torneio das Seis Nações 2018, destronando a bicampeã Inglaterra naquilo que se provou ser um torneio disputado e de resultados imprevisíveis. A vitória da Irlanda em casa frente à Escócia não se consideraria propriamente uma surpresa, mas o facto de ter marcado 4 ensaios e conquistado o ponto de bónus talvez sim. Ao longo do jogo foram várias as penalidades que os irlandeses poderiam ter tentado converter mas foram quase sempre para o alinhamento. Isto mostrava duas coisas: 1- A confiança total da Irlanda na vitória, porque preferia tentar o ensaio de maul em detrimento de 3 pontos, 2- A incrível mensagem que Joe Schmidt deverá ter passado aos seus jogadores: “meus senhores: hoje ganhamos em casa, com ponto bónus, dê por onde der”. Dizemos incrível porque um treinador mais contido teria montado a estratégia para vencer o jogo, assegurando os 4 pontos e esperar pelo que a França e Inglaterra fizessem em Paris nesse sábado.
A verdade é que a Irlanda não entrou bem no jogo e apesar do domínio inicial escocês foram os homens da casa a marcar primeiro. A pressão defensiva escocesa fez com que, a certa altura do jogo, o pilar Cian Healy apresentasse metros negativos, isto é, não tivesse conquistado qualquer metro com a bola na mão. No entanto, o suspeito do costume, Jacob Stockdale conseguiu interceptar um passe longo e marcar o primeiro dos seus dois ensaios nessa tarde. Pois bem, Jacob Stockdale merece todo o crédito. Stockdale marcou seis ensaios em quatro jogos, igualando o recorde para o maior número de ensaios numa edição do torneio, quando ainda falta um jogo que poderá dar o Grand Slam à Irlanda de Sexton e companhia.
EDDIE: BREAKDOWN OR MELTDOWN?
A França trouxe a lição muito bem estudada. Jaques Brunel preparou a sua equipa para ganhar o jogo no chão, tal como a Escócia tinha feito uma semana antes em Murrayfield. A verdade é que os ingleses foram incapazes, quer no ataque quer na defesa, de dominar o “breakdown“. Quando a atacar, embatiam numa parede gaulesa que lhes dificultava a criação de bola rápida e quando a defender, conseguiam reorganizar-se mas a bola já tinha sido libertada por Machenaud. Ora, quando a este nível se perdem dois jogos seguidos, o que não acontecia desde o Mundial de 2015 ainda sob o comando de Stuart Lancaster, as dúvidas começam a surgir e o impacto extraordinário que Eddie Jones trouxe à selecção da Rosa poderá estar-se a diluir.
A verdade é que o último jogo da competição será tão importante para a Inglaterra como para a Irlanda. Naquilo que seria a final esperada do Torneio, a Inglaterra vai jogar em casa para não sofrer uma terceira derrota consecutiva, enquanto que a Irlanda vai tentar o Grand Slam. Será um teste de fogo à mentalidade dos ingleses pois seria de esperar que chegassem ao jogo mais difícil com a hipótese de ganhar o torneio e acabam por ter de evitar uma humilhação em Twickenham.
FRATELLI D’ITALIA
A Itália voltou a jogar e voltou a perder. E se isto não é noticia por si só, voltar a perder da mesma forma talvez o seja. Exceptuando talvez o jogo com a Inglaterra em que sofreram ensaios logo no início da partida, a equipa italiana tem conseguido aguentar a pressão e ficar dentro do jogo durante praticamente 50 minutos. Ora, o que seria encorajador para bastantes equipas, já não o é para os comandados de O’Shea. A renovação é iminente e evidente, apesar de Parrisse e Ghiraldini continuarem a ser peças fundamentais na avançada italiana. Andiamo raggazzi!
GATLAND OU (A INESPERADA VIRTUDE DA INEXPERIÊNCIA)
O País de Gales cumpriu a sua obrigação: vencer a Itália em casa conquistando o ponto bónus. Está contada a história deste fim de semana, ficando só por saudar o “regresso” de George North aos ensaios, logo com dois! Depois de um início de torneio que dá título a este parágrafo (vitória por 34-7 frente à Escócia), Gatland não conseguiu manter a senda vencedora, perdendo por 6 pontos em Twickenham e por 10 no Aviva. O que pode ser visto como desmotivador, duas derrotas consecutivas, terá que ter uma análise mais profunda. Gales foi até ao momento a única equipa a jogar em Twickenham, casa-forte do Rugby Inglês e apesar da Irlanda ter tido na teoria os jogos mais fáceis em casa (Itália e Escócia), Gales perdeu por 10 pontos, com um ensaio de intercepção irlandês na bola de jogo.
Ora, ao contrário da Itália, Gales conseguiu estar dentro do resultado durante 80 minutos. Mais interessante ainda foi a forma como Warren Gatland geriu a equipa que se apresentava francamente desfalcada (daqui também o título do parágrafo), mas nem por isso deu parte fraca, muito pelo contrário. Ainda assim, e Gatland sabe muito bem isso, a este nível são os resultados que contam e veremos o que acontecerá na próxima semana quando Gales receber a França, que poderá definir o segundo lugar na classificação final se a Inglaterra não evitar o Grand Slam Irlandês.
O SISTEMA
Não, não vamos revelar nenhum esquema de bastidores. Referimo-nos ao sistema de pontuação do torneio, que por diferir dos anos anteriores deve ser objecto de reflexão por ter um impacto directo no jogo. O sistema antigo (2 pontos por vitória, 1 por empate, 0 por derrota) tinha 3 limitações importantes: 1-Não premiava quem marcasse mais ensaios, só em caso de empate pontual na classificação final; 2- Só interessava ganhar, “nem que fosse por meio a zero”, limitando a espectacularidade que o Rugby tanto precisa; 3-Não ficavam tão visíveis, na classificação, as diferenças entre as equipas. Estas e outras limitações levaram à alteração para o sistema actual mais comum (4 pontos por vitória, 2 por empate, 0 por derrota, com a hipótese de conquistar dois pontos bónus, marcar mais de 4 ensaios e, no caso de derrota, esta ser por diferença igual ou inferior a 7 pontos). Foi este mesmo sistema que fez diferença no torneio deste ano. A Irlanda conquistou 3 pontos bónus ofensivos, enquanto Gales conquistou dois ofensivos e um defensivo. A diferença entre Gales e Escócia são esses mesmos pontos bónus, uma vez que ambas as equipas têm o mesmo número de vitórias.
O sistema veio para ficar, e para o Fairplay traz muitas vantagens a uma competição que se quer dinâmica e com a qualidade necessária para preparar as melhores selecções europeias para o Campeonato do Mundo do próximo ano no Japão.