O que significa o título no Trophy sub-20 da Espanha?

Francisco IsaacJulho 31, 20236min0

O que significa o título no Trophy sub-20 da Espanha?

Francisco IsaacJulho 31, 20236min0
Poderá o título do Trophy sub-20 da Espanha significar algo de importante para as Tier 2? Francisco Isaac olha para o tema neste artigo

Pela 2ª vez na história do rugby espanhol, uma selecção sub-20 dos Leones vai estar no Campeonato do Mundo desta faixa etária, depois destes terem derrotado o Uruguai na final do World Rugby Trophy U20, realizado no Kénia. Esta vitória da Espanha marca outro momento de crescimento para as selecções consideradas “Tier 2”, que depois da Geórgia ter derrotado o País de Gales e Itália nos séniores e novamente a Itália e Argentina nos sub-20, agora vêem a Espanha e Uruguai (derrotaram a Escócia na fase-de-grupos) a bater à porta e a demonstrar que as novas gerações merecem um lugar entre os maiores.

Mas do que serve este “barulho” todo se as portas continuam praticamente semicerradas e a impossibilitar um crescimento auspicioso às selecções que têm realizado um investimento na formação, desenvolvido estruturas internas e à procura de um caminho sério e coerente? Os bloqueios de crescimento começam imediatamente nos escalões de formação e o exemplo perfeito disso mesmo é o facto do Campeonato do Mundo de sub-20 só permitir 12 selecções marcarem presença, enquanto as restantes têm de passar por fases regionais de apuramento e o tal Trophy que dita a promoção do vencedor.

Nas duas primeiras edições do Campeonato do Mundo de sub-20, a competição recebia cerca de 16 selecções, permitindo a uma gama de atletas ter contacto com jogadores de craveira mundial, mesmo que isso implicasse algum desnível em certos jogos. Mas a experiência adquirida, a possibilidade de jogar ao mais alto nível eram duas componentes que no futuro podiam fazer a diferença, especialmente em conjuntos que já sofriam de escassez de contacto com quem estava no topo.

A passagem de 16 para 12 foi um retrocesso, e o facto de continuar a competição “fechada” em copas demonstra que há pouca vontade de deixar os mais pequenos tocar numa exposição mediática maior. Já o Mundial de séniores masculino (o feminino vai ganhando embalo e sem metade dos vícios do seu homologo contrário) passou de 16 equipas para 20 em 1999, mantendo esse mesmo número desde então.

Ao contrário do que acontece no futebol, andebol, basquetebol ou voleibol, a World Rugby, a empresa que detém as Seis Nações e a SANZAAR, optaram por bloquear todos os caminhos, só abrindo a porta à Itália no início dos 2000 e à Argentina já na segunda década do século XXI, duas selecções com uma história extremamente rica na modalidade, mas algo desprezada durante bastante tempo. A elite que domina a modalidade é aversa a mudanças e permissão de que os mais novos possam aceder ao topo, porque isso poderá agitar o status quo ou forçar uma divisão de investimento que tiraria fundos a certos directores e SEO’s, algo aceite como impossível de acontecer.

A falta de planeamento e visão é um problema crasso, porque uma abertura a todos os outros, especialmente às selecções de federações onde se está realmente a produzir um franco bom trabalho, traria mais investimento, fundos e condições a médio e longo-prazo, aproveitando desta forma para crescer a esfera de influência do rugby em sociedades e culturas onde está encostado a um “canto” ou à margem das modalidades mais praticadas.

O facto de manter estas federações quase num estado isolado e sem 1/10 dos recursos do que as outras de topo têm, forçou a uma estagnação e declínio em vários casos, e que tem sido um claro problema para esses países aumentarem o seu número de atletas. Se uma modalidade X não tem exposição mediática, impacto internacional e audiovisual e carece de uma estrutura competente, é normal que comece a perder atletas com o passar do tempo, especialmente para actividades colectivas que não sofram das mesmas vicissitudes. Em Portugal ou Espanha, o rugby está atrás de futebol, basquetebol, voleibol, andebol, com o fosso a aumentar de ano para ano. Como? Porque em todas essas há objectivos de topo conquistados, seja com títulos mundiais, qualificações para fases-finais, atletas ao mais alto nível ou a estrutura altamente desenvolvida, tornando-se um aperitivo demasiado apetecível para não ser provado.

Sim, a World Rugby e as federações de topo não são as únicas culpadas no meio deste caos todo, já que as federações e clubes locais também se deixaram levar por certos comportamentos errados e que acabaram por ser nocivos para o crescimento e desenvolvimento da modalidade. Olhando para Espanha, é espectacular o que têm conseguido até aqui, aproveitando não só os atletas que nasceram fora do seu espaço territorial, como desenvolveram excelentes academias e estruturas, foram sendo capazes de enviar atletas para clubes franceses/ingleses de topo e reforçar a sua estrutura técnica com excelentes activos. O sucesso dos sub-20 da Espanha entram na linha daquilo que Portugal já tinha conseguido com os seus sub-20 tendo, na altura, faltado uma ponta de sorte para atingir o Mundial de Rugby sub-20.

Num ano em que as selecções ditas “Tier 2” podem vir a causar problemas no Campeonato do Mundo, é inacreditável como a World Rugby não conseguiu fazer frente às Seis Nações e SANZAAR com a fundação da World League, para além de ter afirmado que o Campeonato do Mundo 2027 continuará a ter só 20 selecções, sendo não só uma estagnação como um retrocesso problemático num momento delicado para a modalidade.


Entre na discussão


Quem somos

É com Fair Play que pretendemos trazer uma diversificada panóplia de assuntos e temas. A análise ao detalhe que definiu o jogo; a perspectiva histórica que faz sentido enquadrar; a equipa que tacticamente tem subjugado os seus concorrentes; a individualidade que teima em não deixar de brilhar – é tudo disso que é feito o Fair Play. Que o leitor poderá e deverá não só ler e acompanhar, mas dele participar, através do comentário, fomentando, assim, ainda mais o debate e a partilha.


CONTACTE-NOS